Lei do trabalho: o que pode mudar?
O Governo prepara-se para rever mais de 100 normas da legislação laboral. A duração dos contratos a termo, o pagamento dos subsídios em duodécimos, o luto gestacional ou o fim das restrições ao outsourcing são alguns dos temas em cima da mesa. Saiba o que pode mudar.

O Governo aprovou em Conselho de Ministros um anteprojeto de lei para uma reforma laboral que prevê alterações em mais de 100 artigos do Código do Trabalho. Esta proposta também atualiza diversos diplomas e transpõe duas diretivas europeias. De acordo com o Executivo, o objetivo é "flexibilizar os regimes laborais" e "aumentar a competitividade da economia".
A proposta já foi apresentada aos parceiros sociais, mas ainda vai ser discutida em Concertação Social, em setembro. Embora estejam em cima da mesa várias alterações, estas podem ainda vir a mudar após a discussão com as confederações empresariais e as centrais sindicais.
Conheça algumas das mudanças propostas pelo Governo.
Subsídios de férias e Natal pagos em duodécimos
Uma das alterações que pode avançar, e que já estava prevista no programa do Governo, é a possibilidade de pagamento dos subsídios de férias e de Natal em duodécimos, juntamente com a retribuição. Se a alteração avançar, os trabalhadores vão poder escolher se querem receber os subsídios de férias e de Natal (13.º e 14.º meses) diluídos com o salário mensal pelos 12 meses do ano, ou por inteiro, duas vezes por ano.
Compra de dias de férias adicionais
O anteprojeto prevê, ainda, a possibilidade de compra de até dois dias de férias adicionais por ano, com uma perda remuneratória associada. Tal como consta da proposta, esta compra de dias de férias adicionais significa a perda de remuneração, mas não a perda de outros benefícios, como o subsídio de refeição, ou a perda de dias para efeitos de cálculo de assiduidade e da carreira contributiva do trabalhador.
Atualmente, a lei permite o gozo de 22 dias úteis de férias para todos os trabalhadores. É possível que as empresas disponibilizem mais dias de descanso aos seus trabalhadores, dependendo de acordo com o empregador.
Teletrabalho mais flexível
O regime de teletrabalho também deverá sofrer alterações. O Governo pretende adaptar este regime ao trabalho híbrido, que combina o trabalho presencial com o trabalho remoto. Além disso, a comparticipação de despesas adicionais com teletrabalho pode passar a ser definida em contrato coletivo ou no acordo de teletrabalho assinado entre o trabalhador e o empregador. Contudo, ainda não se sabe exatamente o que poderá mudar.
Licença parental de 180 dias
A licença parental inicial, por nascimento de um filho, poderá vir a ter uma duração até seis meses (180 dias) consecutivos. No entanto, isto só se irá aplicar se, depois de gozados os 120 dias obrigatórios, os dois progenitores optarem por mais 60 dias em regime partilhado em períodos iguais ou por período adicional de gozo facultativo de 30 dias.
O Código do Trabalho atualmente em vigor já prevê que a licença parental inicial possa durar 120, 150 ou 180 dias.
Licença de amamentação com duração de 2 anos
Atualmente, as mães que amamentam os seus filhos têm direito a dispensa de trabalho para amamentar, durante o tempo que dure a amamentação, devendo apresentar um atestado médico a comprovar a situação de amamentação após o bebé completar 12 meses.
Com as propostas de alteração apresentadas pelo Governo, a dispensa de trabalho para amamentação durará até que a criança complete dois anos. Além disso, as trabalhadoras que necessitem de dispensa para amamentação, deverão passar a ter de apresentar ao seu empregador um atestado médico que comprove a amamentação de 6 em 6 meses.
Licença parental exclusiva do pai passa a 14 dias
Uma das alterações que pode estar em causa é a obrigatoriedade de os pais gozarem da licença parental exclusiva do pai nos 14 dias seguidos logo após o nascimento do bebé. De acordo com a lei atual, o pai goza de, pelo menos, sete dias de licença logo após o nascimento da criança.
Revogação da falta por luto gestacional
Outra das alterações propostas pelo Governo é o fim do regime de falta por luto gestacional, que, atualmente, dá três dias de faltas justificadas e pagas a 100% pela entidade patronal, em situações de perda gestacional. Hoje, este regime aplica-se à grávida, mas também ao outro progenitor. Para poderem tirar destes dias, o regime exige apenas uma declaração do hospital ou do centro de saúde.
O Governo justifica a revogação da falta por luto gestacional com a existência da licença por interrupção da gravidez. Nos termos atuais, esta licença permite à grávida ausentar-se entre 14 e 30 dias em todos os casos de interrupção de gravidez. O período desta licença é determinado pelo médico assistente da gestante, que deve passar um atestado médico com indicação da interrupção da gravidez. Além disso, é paga pela Segurança Social, como se fosse uma baixa por doença. No entanto, não se aplica ao outro progenitor que, com a revogação da falta por luto gestacional, poderá ter de recorrer ao regime de faltas por assistência à família. Este regime de faltas permite gozar de 15 dias por ano para assistência à família, mas, na maioria dos casos, não é remunerado.
Fim das restrições ao outsourcing
Atualmente, as empresas estão impedidas de recorrer ao outsourcing (trabalho temporário) para contratar caso tenham realizado despedimentos coletivos ou por extinção de posto de trabalho nos 12 meses anteriores. Contudo, com as alterações propostas ao Código do Trabalho, esta limitação pode vir a ser revogada, permitindo às empresas contratar serviços a entidades terceiras mesmo que tenham realizado despedimentos recentemente.
Alargamento dos contratos de trabalho a termo certo
O Governo quer, ainda, alargar a duração dos contratos de trabalho a termo certo, passando o período inicial de seis meses para um ano e a duração total, com renovações, para três anos. Atualmente, a duração máxima dos contratos a termo certo é, em regra, de dois anos, já incluindo um máximo de três renovações, que não podem, em conjunto, durar mais do que o período inicial.
Novas regras para independentes em situação de dependência económica
O Governo pretende também rever o conceito de “dependência económica” nos recibos verdes. Atualmente, são considerados economicamente dependentes (ou falsos recibos verdes) os trabalhadores independentes que tenham mais de 50% da sua faturação anual numa única entidade. A revisão à legislação laboral agora proposta, quer aumentar essa percentagem para 80 por cento.
Fim da criminalização do trabalho não declarado
O Executivo pretende ainda colocar um fim à criminalização do trabalho não declarado, nomeadamente ao trabalho doméstico. Recorde-se que esta norma entrou em vigor há pouco mais de dois anos e, de acordo com o regime atual, obriga a comunicação de contratos à Segurança Social e as respetivas contribuições. As entidades empregadoras que não o façam podem ser punidas com pena de prisão até três anos ou multa até 360 dias. Se a lei for efetivamente revogada, a não declaração de trabalho volta a ser punida apenas com contraordenação, sujeita ao pagamento de uma coima.
Despedimento por autodeclarações de doença falsas
Por outro lado, com as alterações à lei do trabalho, uma autodeclaração de doença fraudulenta pode vir a dar direito a um despedimento por justa causa.
As autodeclarações de doença são, na prática, baixas médicas até três dias que podem ser substituídas por justificações de falta emitidas pelo portal SNS 24. Com as regras atualmente em vigor, cada trabalhador pode apresentar, no máximo, duas justificações de falta emitidas pelo serviço SNS 24 por ano.
Serviços mínimos obrigatórios durante a greve
As propostas de alteração ao Código do Trabalho preveem também uma revisão à lei da greve, com a garantia de serviços mínimos em áreas como as escolas, as creches, os lares e o abastecimento alimentar.
Atualmente, a lei da greve já impõe a garantia de serviços mínimos por setores de grande importância social, mas as alterações agora propostas podem vir a definir percentagens mínimas para garantir o funcionamento de serviços em dias de greve.
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