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Greve: regras, serviços mínimos, faltas e remuneração

O direito à greve é garantido pela Constituição, mas muitos trabalhadores não sabem exatamente como funciona: pré-aviso, serviços mínimos, faltas justificadas e perda de remuneração. Confirme o que pode (e não pode) fazer quando há paralisações.

Especialista:
26 novembro 2025
greve

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O direito à greve suspende o contrato de trabalho e o dever de assiduidade para defender interesses laborais. Em Portugal, o direito à greve é garantido pela Constituição da República, sejam quais forem os motivos.

No entanto, está sujeito a regras formais, serviços mínimos em setores essenciais e perda de retribuição durante os dias de paralisação. As faltas são justificadas, mas não obrigam o empregador a pagar.

Saiba o que pode acontecer numa greve e como agir em cada situação.

Regras e formalidades da greve

Quem pode convocar

Para ser considerada legal, a greve tem de ser convocada por um sindicato. Este representa os trabalhadores durante a greve. 

Excecionalmente, em empresas em que a maior parte dos funcionários não esteja sindicalizada, a realização da greve poderá ser decidida por uma assembleia que tenha sido convocada expressamente com essa intenção por um mínimo de 20% dos trabalhadores ou, numa empresa de grandes dimensões, duzentos.

Têm de participar na assembleia mais de metade dos trabalhadores, e a greve tem de ser aprovada, por voto secreto, pela maioria dos votantes. Nestes casos, os trabalhadores em greve são representados por uma comissão escolhida por estes.

Pré-aviso de greve

A greve tem de ser comunicada ao empregador (ou à associação de empregadores do setor) e ao Ministério do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, seja diretamente por escrito ou através dos meios de comunicação social.

Regras do pré-aviso de greve:

  • aviso feito com uma antecedência mínima de cinco dias úteis, no geral;
  • incluir uma proposta para os serviços necessários à segurança e manutenção dos equipamentos e das instalações.
  • no caso das empresas que satisfazem necessidades sociais de grande importância, como o abastecimento de água, as telecomunicações, os transportes ou os serviços de saúde, o aviso tem de ser feito com uma antecedência mínima de dez dias úteis, e precisa de conter também uma proposta de serviços mínimos.

Direitos e deveres durante a greve

Trabalhadores

O que podem fazer:

  • aderir ou não aderir livremente à greve;
  • organizar piquetes de greve que tentem convencer os trabalhadores a aderir.

O que é proibido:

  • qualquer forma de coação, dano ou discriminação;
  • impedir colegas de trabalhar;
  • danificar instalações.

Empregadores

O que podem fazer:

  • organizar os serviços de modo a atenuar os efeitos da greve;
  • exigir o cumprimento dos serviços mínimos estabelecidos.

O que é proibido:

  • qualquer forma de coação, dano ou discriminação;
  • substituir funcionários em greve por pessoas que não trabalhassem na empresa no momento em que receberam o pré-aviso;
  • admitir novos trabalhadores entre o pré-aviso e o fim da greve;
  • contratar empresas externas para substituir trabalhadores em greve, exceto para assegurar serviços necessários à segurança e à manutenção de equipamentos e instalações, ou à satisfação das necessidades sociais mais importantes.

Quem faz greve recebe salário?

Não, durante a greve, o trabalhador não recebe retribuição relativa aos dias de paralisação. Contudo, desde que a greve obedeça a todas as formalidades necessárias, as faltas têm de ser consideradas justificadas.

Apesar de ficar dispensado de comparecer ao trabalho e de obedecer às instruções do empregador, o trabalhador mantém a maioria dos respetivos direitos e obrigações.

Outros aspetos importantes:

  • os dias de greve também contam para efeitos de antiguidade na empresa;
  • se o trabalhador estiver a receber uma prestação da Segurança Social ou devido a acidente de trabalho ou a doença profissional, o pagamento mantém-se.

Serviços mínimos: quando se aplicam?

Em algumas atividades, pela sua importância, pode ser imposta a realização de serviços mínimos durante uma greve, para que não se corra o risco de essas atividades pararem integralmente.

São considerados setores de grande importância social:

  • correios e telecomunicações;
  • serviços de saúde e de fornecimento de medicamentos;
  • salubridade pública, incluindo funerais;
  • energia e minas, incluindo o abastecimento de combustíveis;
  • abastecimento de água;
  • bombeiros;
  • certos serviços de atendimento ao público do Estado (por exemplo, assistência domiciliária a pessoas doentes);
  • transportes de pessoas e bens;
  • transporte e segurança de dinheiro.

Como são fixados os serviços mínimos

  1. Preferencialmente, devem estar definidos num instrumento de regulamentação coletiva (como o contrato coletivo) ou resultar de acordo entre os empregadores e os representantes dos trabalhadores.
  2. Quando tal não é possível, o Ministério do Trabalho, em conjunto com o ministério que tutela o ramo de atividade em questão (por exemplo, Saúde, em caso de greve de enfermeiros, médicos e outros profissionais de saúde), deve tentar um acordo.
  3. Se tal não acontecer até três dias depois do aviso prévio, os serviços mínimos são definidos por um despacho dos dois ministérios.

Quem presta os serviços mínimos

  1. Cabe aos representantes dos trabalhadores designar quem presta os serviços mínimos.
  2. Caso não o façam, a empresa pode fazê-lo.
  3. Em circunstâncias raras e particularmente graves, o Governo pode recorrer a requisição civil, convocando trabalhadores para determinadas funções, sendo que a recusa pode ter consequências disciplinares e penais.

Os trabalhadores que prestam serviços mínimos têm direito a receber salário.

Faltas ao trabalho devido a greve: o que conta como justificação?

Greve que afeta os transportes

Para justificar a falta ou um atraso devido a greve de transportes (comboio, metro, autocarro ou barco, por exemplo), peça ao operador uma declaração que confirme a existência de supressões ou atrasos.

As faltas, mesmo que justificadas, implicam perda de retribuição, a não ser que a entidade patronal entenda pagar o correspondente ao dia de trabalho.

No passado, greves que afetaram os postos de abastecimento de combustível deixaram também alguns portugueses sem soluções de transporte. Quando não existem transportes públicos adequados, do ponto de vista legal, a empresa tem de aceitar a falta como justificada? Não.

Um empregador menos sensível aos argumentos pode exigir provas de que o automóvel ficou sem combustível, o trabalhador fez tudo o que estava ao seu alcance para evitar tal situação e não poderia chegar ao local de trabalho por outros meios.

Greve nas escolas

Aos olhos da lei, as únicas faltas relacionadas com os filhos obrigatoriamente consideradas como justificadas são as que se prendem com assistência inadiável e imprescindível em caso de doença ou acidente.

Normalmente, a confirmação de uma greve nas escolas só chega no próprio dia de manhã, e os pais ficam com pouca margem de manobra. Nestes casos, a justificação da falta dependerá da boa vontade da entidade patronal.

Perante esta situação, peça na escola um documento que comprove que, naquele dia, o seu filho não teve aulas e que não poderia permanecer no estabelecimento. A entidade patronal poderá ainda exigir ao trabalhador que prove que não tinha onde deixar a criança naquele período, por exemplo, por não ter nenhum outro familiar disponível.

Como evitar conflitos com a entidade patronal

Sempre que souber antecipadamente de uma greve que possa atrasar ou impedir de comparecer no local de trabalho, avise a empresa, para esta não ser surpreendida.

Se, por exemplo, a greve abranger a escola dos seus filhos, procure informar a empresa onde trabalha ou as chefias de que há a possibilidade de vir a ter de ficar com o seu filho num determinado dia, podendo negociar, desde logo, uma forma de conciliar assistência e trabalho ou de compensar a sua ausência.

Além disso, reunir comprovativos de que faltou ao trabalho por motivo de greve pode ajudar a justificar a ausência, mas não obriga os empregadores a pagar o salário.

A solução é tentar chegar a acordo com a entidade patronal, sabendo de antemão que as dicas seguintes podem não ser viáveis em todas as profissões e/ou empresas.

  1. Utilize um dia de férias para compensar a falta devido a greve.
  2. Recorra ao teletrabalho, caso seja uma solução compatível com as suas funções.
  3. Compense as horas desse dia noutras datas, se for possível.

Outros casos: greve na saúde ou nos tribunais

Nos serviços de saúde, as greves têm de ser anunciadas com uma antecedência mínima de dez dias úteis. Seria desejável que os estabelecimentos de saúde avisassem o doente quando soubessem de antemão que determinado cuidado (consulta, exame ou cirurgia) não será prestado, evitando o desperdício de dinheiro e de tempo com uma deslocação em vão. Mas a vida real confirma que esse procedimento não é a regra.

O mesmo acontece nos tribunais ou em repartições públicas, onde algumas diligências acabam por não ser realizadas por motivos de paralisação dos funcionários, e os cidadãos convocados não recebem atempadamente essa indicação.

Assim que tenha conhecimento da paralisação, contacte o estabelecimento onde teria de ir em dia de greve, para tentar saber se será afetado. 

No caso da saúde, há sempre serviços mínimos que têm de ser respeitados, como as situações de urgência.

Se tal não acontecer e daí resultarem consequências graves para os doentes, é possível responsabilizar os profissionais e/ou o estabelecimento. Isto em teoria, pois, na realidade, será complicado conseguir que um profissional seja responsabilizado por não ter cumprido os serviços mínimos em tempo de greve. Será necessário provar que houve uma falha e que resultou do incumprimento do profissional de saúde.

Tratando-se de um caso que envolva uma greve no setor da justiça, que atrase de forma flagrante o andamento de um processo, poderá apresentar queixa nos tribunais europeus pela demora do Estado português em resolver judicialmente o caso.

Questões frequentes

Respondemos às principais dúvidas sobre direitos e deveres dos trabalhadores em caso de greve.

Não estou sindicalizado. Posso fazer greve?

Sim, desde que abranja o setor de atividade (por exemplo, professores, enfermeiros, etc.) ou a empresa para a qual a greve foi convocada. Caso tenha dúvidas, informe-se junto da entidade (sindicato ou assembleia de trabalhadores) que convocou a greve.

Posso ser despedido por fazer greve?

A lei proíbe qualquer retaliação por adesão à greve, pelo que esse motivo não pode ser invocado para um despedimento.

Trabalho no setor privado. Posso fazer greve?

Sim. O direito à greve aplica-se a todos os trabalhadores, sejam funcionários públicos ou do setor privado. Também não faz diferença a natureza do seu vínculo à entidade profissional (contrato a termo, sem termo, etc.), nem o regime de trabalho. Por exemplo, se estiver em teletrabalho pode fazer greve.

Se aderir parcialmente à greve também perco salário?

Sim. Mesmo que não faça greve durante todo o dia de trabalho, a perda de remuneração corresponde às horas que estiver ausente.

Tenho de comunicar à empresa que vou fazer greve?

Não. Mesmo que a entidade patronal lhe pergunte, não é obrigado a informar que irá fazer greve.

Como justificar a falta em dia de greve?

Em dia de greve, só tem de justificar a ausência ao serviço se tiver faltado por outras razões. Quem adere à greve não precisa de entregar nenhum comprovativo.

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