Angélica André: nadadora alerta para literacia financeira
Conta 29 anos e nada desde os três. Conquistou o bronze nos 10 quilómetros em águas abertas, no Campeonato do Mundo, e quer vingar-se de Tóquio nas Olimpíadas de agosto, em Paris. A DECO PROteste acompanhou uma tarde, na piscina de Campanhã, Porto.

Para Angélica André, 8 de agosto de 2024, pelas 07h00, é dia de ir à luta e nadar no rio Sena, em Paris, como se não houvesse amanhã. Sagrou-se campeã nacional de águas abertas, em maio, na Aldeia do Mato (Tomar), nos 10 quilómetros em águas abertas. Antes, em fevereiro, a medalha de bronze que conquistou no campeonato do mundo, em Doha, garantiu-lhe o apuramento para os Jogos Olímpicos, em 1h57m28s a nadar em condições muito duras. É o melhor resultado de sempre para Portugal na modalidade.
Talento, paixão, registos épicos, sorriso tímido, gargalhada única e muito trabalho, com uma enorme sede de vitórias, formam a sua imagem de marca. A nadadora está focada na competição, mas revela-se inquieta com o nível de literacia financeira dos consumidores de todas as idades.

Da piscina de Campanhã para Paris
A equipa de reportagem da DECO PROteste acompanhou o treino da tarde de Angélica na piscina principal de Campanhã, no Porto, com as medidas certas para o sonho olímpico. Já era o segundo treino do dia, com séries de rajada até perfazer 10 quilómetros em piscina, com intervalos cronometrados e múltiplos testes de resistência. Ver aquela ação cansou, e a melhor parte foi levar com os salpicos e as chapadas de água. É inspirador, sobretudo quando chegam os mais pequenos para beber do exemplo de Angélica, que não abandona a piscina sem se despedir do staff técnico, dos colegas do clube e das crianças.
Humilde, a campeã de Matosinhos nada 100 quilómetros por semana, faz treinos bidiários de piscina, aos quais alia a visita obrigatória ao ginásio. Começou muito cedo, sempre viveu no bairro e brincava na rua, com os dois irmãos e amigos do prédio. "E depois, ali aos três anos, no infantário, comecei na natação", lembra sem hesitar. Quando, mais tarde, no primeiro ano, os pais lhe perguntaram qual era o desporto que gostava de praticar, a resposta só poderia ter sido... natação.
Cada modalidade tem a sua especificidade, não é? "Mas um fator é comum a todas: é sempre a disciplina, entre amigos, com quem podemos partilhar vivências", desvenda Angélica, que encontra no compromisso a fonte principal do prazer da natação. E qual foi o momento mais alto da carreira? "A cada época, espero ser melhor do que na época passada. E a de 2024 está a ser melhor do que todas as outras, por me ter qualificado para os Jogos pela segunda vez e por ter alcançado aquilo que nunca tinha alcançado: um pódio mundial."
Angélica com sede de vitórias e medalhas
Não esconde de ninguém, nem evita a pressão. O principal objetivo que a motiva para continuar a nadar é vingar-se de Tóquio, em 2020, quando ficou desiludida com um 17.º lugar. "Teve um sabor agridoce, porque estava a trabalhar muito e fiquei por ali, a muitos minutos da primeira classificada", admite Angélica. Queria ter ficado mais perto, mas não teve sucesso. Espera que os Jogos Olímpicos de Paris sejam bem melhores neste aspeto.
Ainda não teve a oportunidade de nadar no cenário da prova, mas já visitou o local por três vezes, em férias com a família e em missão profissional para uma Taça do Mundo, que não se concretizou devido ao ineficiente tratamento da água. Angélica já sabe que a maratona aquática em agosto terá de ser feita muito cedo, pelas 7h00 ou 7h30, porque depois é preciso abrir logo o Sena para as embarcações.
Fã de água fria e com ondulação
No ambiente aquático, destemida, Angélica revela-nos uma atração especial: "Prefiro condições adversas, água fria e com ondulação. Um nadador de águas abertas tem de estar preparado para qualquer condição. E sinto-me à vontade em qualquer cenário."
E a fórmula secreta ou estratégia para vencer, pode revelar também? "Muito trabalho. Tento praticar e recriar todos os dias, no treino, a disputa e a chegada ao final, com forças para competir com as melhores. É isso que aplico no treino, com os colegas de equipa, porque não treino sozinha. Sozinhos podemos chegar longe, mas acompanhados ainda chegamos mais."
A nadadora explica desta forma o segredo para os seus picos de energia na parte final das provas. Envergar uma atitude competitiva é o resultado do trabalho diário. Angélica faz dez treinos semanais na água e cinco no ginásio. Normalmente, a sessão exige duas horas e meia na água e 45 minutos no ginásio. As cargas podem ter algumas variações, mas, por princípio, os 100 quilómetros por semana a nadar não podem falhar.
Ana Marcela é a maior referência
Angélica tem sempre preocupação com a alimentação, porque é um fator bastante importante para sentir energia, tanto a treinar como a competir. E, nalguns momentos, conta, é preciso ter cuidado para evitar muitas oscilações no peso. Por outro lado, em 29 anos, nunca enfrentou uma lesão muito séria que a obrigasse a parar.
Admira todos os desportistas, "porque todos têm algo em comum, uma história para contar". Mas, por exemplo, na natação de águas abertas, Ana Marcela, nadadora brasileira e campeã olímpica, é a maior referência. Em Portugal, todos os desportistas são admirados, com destaque para Fernando Pimenta e Telma Monteiro. Mas os atletas nacionais de renome, sem exceção, têm algo a acrescentar, diz Angélica.
A nadadora gostava muito de ser um modelo a seguir pelos mais novos, pela pessoa que é e também por aquilo que treina diariamente. E partilha dicas vitais para vencer no desporto. "Nunca desistam, sejam disciplinados. O desporto não é fácil, vai haver sempre momentos maus. Vai haver momentos bons. Dá para fazer sempre um bocadinho de tudo, com moderação. Mas têm de ser persistentes e resilientes."
Consumidora como nós
Fora de água, Angélica considera que não gasta muito dinheiro no capítulo do consumo. Os seus momentos seguem uma disciplina que exemplifica: "Até uma competição importante, não gasto muito. Mas, quando tenho um bom resultado, aí gasto um bocadinho. É uma forma de me recompensar por todo o trabalho." O consumo é sempre pontual. Mas confessa que os gadgets e o último grito da tecnologia a fazem hesitar e, por vezes, desperdiçar, sobrando no final a dúvida: "Mas porque é que fui gastar dinheiro, se o anterior modelo fazia a mesma coisa? Telemóvel... Sai o novo, compro e vendo o velho, e pronto."
Nunca pediu o livro de reclamações, mas já esteve muito perto desse momento glorioso a propósito de uma proposta de telecomunicações. A empresa cobrou durante sete meses um valor muito acima do contratado e do que realmente gastava. Ao terceiro mês, Angélica gritou: "Basta!" Mas nunca pediu o livro de reclamações, porque prometeram resolver o assunto. Tratava-se do Vodafone OneNumber, o serviço de conectividade que lhe permite partilhar o tarifário móvel, o número e os contactos com o smartwatch Apple Watch, ou seja, ter todas as comunicações no pulso, em qualquer lugar, mesmo sem o smartphone por perto. Anunciaram várias mensalidades gratuitas, só que se esqueceram da promessa... Cobravam sempre seis euros. A solução tardou, mas o assunto ficou resolvido.
Literacia financeira deve ser prioridade
Questionada sobre uma ideia para melhorar a defesa do consumidor, a nadadora propôs o investimento na informação. Não em termos da revista, mas, por exemplo, ao nível escolar, no sentido de alertar para as questões económicas a que devemos estar mais atentos. "Mais cautela com o dinheiro que devemos gastar. E, em termos financeiros, com aquilo que é mais importante", sugere.
A inteligência artificial é decisiva, mas ainda não chegou às rotinas de Angélica, que já veste um extenso kit tecnológico: o cronómetro, o cardiofrequencímetro e o relógio para controlar o sono, o pulso ao acordar, a variabilidade da frequência cardíaca, em suma, fatores importantes para o atleta saber se está em sobrecarga.
Planos para amanhã? "Iguais aos de hoje. Acordar, treinar às seis e meia da manhã, ir para a faculdade. Almoçar, voltar para o treino, para o ginásio e depois dormir." E sonhar com a medalha nos Jogos Olímpicos.
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