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Inibidores da bomba de protões: cuidados ao tomar estes medicamentos para o estômago

Ao contrário do que se pensa, os inibidores da bomba de protões não são protetores do estômago, mas, sim, medicamentos que reduzem a sua acidez. Mas muitas vezes são utilizados inadequadamente. Saiba mais sobre estes fármacos e conheça a opinião do gastrenterologista Pedro Narra Figueiredo.

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30 abril 2025
mulher a queixar-se com dores de estômago

iStock

Os inibidores da bomba de protões (IBP) são medicamentos usados para tratar condições médicas associadas ao excesso de ácido do estômago, como, por exemplo, para tratar, a curto prazo, os sintomas de refluxo em adultos. Incluídos neste grupo estão os medicamentos que contêm omeprazol, lansoprazol, pantoprazol, rabeprazol e esomeprazol. Os IBP estão entre os medicamentos mais prescritos e utilizados em todo o mundo, tendo vindo a assistir-se a um aumento gradual e preocupante do seu consumo nos últimos anos.

Em Portugal, segundos os dados mais recentes do Infarmed, entre janeiro e outubro de 2024, os medicamentos modificadores da secreção gástrica constituíram o sexto grupo terapêutico mais utilizado. Dentro deste grupo, o pantoprazol destacou-se como o inibidor da bomba de protões mais vendido, posicionando-se como a quinta substância ativa mais utilizada no período referido. 

No entanto, a utilização significativa destes medicamentos pode estar relacionada com fatores menos positivos como a prescrição inadequada e o uso prolongado dos mesmos.

Inibidores da  bomba de protões: como tomar?

Deve tomar o inibidor da bomba de protões como indicado pelo médico ou farmacêutico. A posologia (dosagem) e a duração do tratamento variam consoante a situação clínica a tratar. Geralmente, são bem tolerados e eficazes.

Porém, antes de iniciar a terapêutica com IBP, é importante que o médico responsável confirme algumas questões:

  • deve verificar se o paciente está a tomar outros medicamentos que possam causar sintomas dispépticos (desconforto ou dor na parte superior do abdómen);
  • deve excluir possíveis causas graves não gastrointestinais e, ainda, investigar sinais de alarme para cancro, estenose ou ulceração grave;
  • deve avaliar a possibilidade de infeção por Helicobacter pylori;
  • deve orientar o paciente para a adoção de algumas mudanças no estilo de vida. Assim, este deve evitar alimentos e bebidas que possam precipitar e/ou agravar o desconforto gástrico, como álcool, fritos, gorduras, mentol, chocolate, café, citrinos, bebidas gaseificadas e alimentos condimentados;
  • deve recomendar comportamentos saudáveis, tais como deixar de fumar, controlar o peso, evitar vestuário apertado no abdómen e evitar refeições pesadas.

Posologia

Se estiver a tomar um inibidor da bomba de protões sem indicação médica (automedicação), a dose pode variar consoante a substância ativa em causa, mas, regra geral, recomenda-se uma toma única por dia. Tome de manhã com, pelo menos, meio copo de água. Pode fazê-lo com alimentos ou em jejum. Leia sempre o folheto informativo do medicamento.

Duração do tratamento

A duração do tratamento depende da situação clínica a tratar. Pode ser necessário tomar inibidores da bomba de protões durante dois ou três dias consecutivos até à melhoria dos sintomas.

Nas situações em que não precisam de prescrição médica, a dose habitual é de uma vez, por dia, até 14 dias. Se não estiver livre de sintomas após este período, contacte o seu médico.

Porém, existem casos em que se justifica o uso destes medicamentos por tempo indeterminado. Contactado pela DECO PROteste, o presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia (SPG) e diretor do serviço de Gastrenterologia da Faculdade de Medicina, da Universidade de Coimbra, Pedro Narra Figueiredo, sublinha que, segundo as recomendações atuais, o tratamento prolongado poderá aplicar-se a condições como:

  • síndrome de Zollinger-Ellison;
  • esófago de Barret;
  • esofagite eosinofílica;
  • esofagite erosiva severa;
  • prevenção de úlceras gástricas, ou duodenais, relacionadas com a toma de anti-inflamatórios não esteroides (AINE) em doentes de risco (mais de 60 anos, histórico de úlceras gástricas e duodenais ou de hemorragia gastrointestinal superior).

Contudo, Pedro Narra Figueiredo alerta para a necessidade de o "regime terapêutico ser periodicamente reavaliado pelo médico para assegurar a sua necessidade contínua, bem como vigiar e minimizar potenciais riscos associados ao uso prolongado". Cada caso deve, assim, ser avaliado individualmente e acompanhado de forma regular.

Por norma, os inibidores da bomba de protões devem ser prescritos na dose mais baixa e pelo menor período necessário, adequado à condição a ser tratada. Para muitas pessoas, é apropriado o uso a curto prazo (quatro a oito semanas).

Para os sintomas dispépticos esporádicos (sensação de digestão lenta ou pesada e azia, por exemplo), a toma em SOS de inibidores da bomba de protões (IBP) deve ser evitada. Outros supressores ácidos, como os antiácidos e os antagonistas dos recetores H2 (famotidina), podem ser mais eficazes no alívio imediato desses sintomas. 

Saiba, ainda que, sobretudo em pacientes sob polimedicação, deve haver um cuidado redobrado na toma destes inibidores, pois podem ter interações com outros medicamentos.

O que está a falhar na utilização deste medicamento?

Quando um IBP é receitado, os benefícios superam bastante os supostos riscos, mas há uma crescente preocupação sobre os potenciais efeitos adversos associados à toma prolongada. Muitas pessoas tomam inibidores da bomba de protões para condições não indicadas e/ou além do tempo recomendado

Pedro Narra Figueiredo considera existirem vários problemas associados à toma de inibidores da bomba de protões. Destaca, por exemplo, o facto de "o médico que avalia o doente nem sempre ser "o primeiro prescritor da terapêutica, podendo, tal como frequentemente o próprio doente, desconhecer o motivo do início [do tratamento], o que pode gerar receio na sua suspensão", explica.

Deve fazer-se o desmame do medicamento?

Em pacientes que tiveram uma resposta adequada aos inibidores, nas doses esperadas e durante o tempo previsto, pode ser aconselhável descontinuar ou reduzir esta medicação, preservando, assim, o benefício alcançado e evitando os potenciais efeitos adversos da terapia a longo prazo e/ou com doses elevadas. A evidência clínica recente associa a utilização de IBP a várias situações, entre as quais se destacam:

  • aumento do risco de fraturas ósseas, devido à interferência com a absorção de cálcio;
  • má absorção de minerais e vitaminas, como magnésio, cálcio, ferro e vitamina B12;
  • maior suscetibilidade a infeções gastrointestinais, como as causadas por Clostridium difficile, Salmonella, Campylobacter, por exemplo;
  • risco aumentado de pólipos benignos no estômago;
  • lúpus eritematoso cutâneo subagudo.

Na opinião do presidente da Sociedade Portuguesa de Gastrenterologia, "a descontinuação da terapêutica deverá ser proposta a qualquer doente que não apresente uma indicação definitiva e apropriada para a sua manutenção". Porém, destaca que quer a suspensão gradual quer a paragem abrupta da terapêutica são aceitáveis clinicamente.

Contudo, segundo Pedro Narra Figueiredo, "o paciente deverá ser devidamente informado sobre a possibilidade de efeito rebound associado [à interrupção da terapêutica com IBP] e educado quanto às medidas do estilo de vida preventivas a adotar". Também devem ser "oferecidas outras terapêuticas de resgate para um adequado controlo sintomático (...)", tais como antagonistas dos recetores H2 (famotidina), antiácidos ou protetores da mucosa gástrica (alginato de sódio ou sucralfato).

O que é o efeito de rebound?

A hipersecreção ácida de rebound (HAR) referida pelo gastrenterologista ocorre, especialmente, quando o tratamento com IBP é descontinuado abruptamente, e está associado a um aumento temporário na secreção de ácido gástrico, acima dos níveis pré-tratamento, podendo ocorrer até duas semanas após a descontinuação do medicamento. Os sintomas são semelhantes à doença subjacente para a qual os inibidores da bomba de protões foram usados, podendo incluir azia, regurgitação ou dispepsia (desconforto na parte superior do abdómen).

Se esta situação não for explicada ao doente, nem vigiada por um médico, pode levar à "associação errada de que o IBP estaria a tratar estes sintomas, quando, na realidade, poderá agora ser o agente causal, motivando a retoma indevida da terapêutica", explicou Pedro Narra Figueiredo.

Quando contactar imediatamente o médico?

Se toma inibidores da bomba de protões, deve contactar de imediato um médico se:

  • perdeu muito peso sem motivo e tem dificuldade em engolir;
  • sente dores de estômago ou indigestão persistente;
  • vomitou alimentos ou sangue;
  • tem fezes negras ou diarreia grave e persistente;
  • já excedeu o período de tratamento indicado pelo seu médico ou farmacêutico.

Antes de iniciarem o tratamento, os pacientes devem estar informados sobre os possíveis riscos associados ao uso destes medicamentos. Apesar de, regra geral, os inibidores da bomba de protões serem seguros e bem tolerados, não estão livres de poderem causar efeitos indesejáveis, tais como náuseas, diarreia, dor de cabeça, dor abdominal, obstipação, flatulência, entre outras.

De realçar, ainda, que os inibidores da bomba de protões podem esconder os sintomas de outras doenças, dificultando o seu diagnóstico.

Como evitar a toma inadequada?

A DECO PROteste considera que a promoção do uso racional dos inibidores da bomba de protões (IBP) exige uma intervenção coordenada e ativa por parte das autoridades reguladoras, dos profissionais de saúde e dos utentes. Entidades como a Direção-Geral da Saúde (DGS) e o Infarmed devem continuar a reforçar campanhas de sensibilização dirigidas tanto à população como aos profissionais de saúde. A partilha de informação atualizada sobre o uso adequado dos IBP, incluindo as indicações clínicas, a duração recomendada do tratamento, as alternativas disponíveis e os cuidados a ter, é essencial para aumentar a literacia sobre os mesmos e apoiar decisões informadas. 

Do lado dos profissionais de saúde, e tal como refere o presidente da SPG, é crucial assegurar um conhecimento clínico sólido, permanentemente atualizado e sustentado na melhor evidência científica. A prescrição de inibidores da bomba de protões deve ser criteriosa, limitada ao período estritamente necessário e sujeita a reavaliações periódicas, de forma a monitorizar a eficácia e a necessidade do tratamento. Sempre que possível, deve ser considerada a suspensão da terapêutica, através de protocolos de descontinuação bem definidos. Nos doentes em que a suspensão do tratamento não é tolerada, "deverá ser mantida a dose mínima eficaz", como afirma o gastrenterologista.

Também os doentes têm um papel central neste processo, devendo evitar a automedicação imprudente, mesmo que algumas formulações de IBP estejam disponíveis sem receita médica. O uso de IBP de venda livre não deve ser prolongado por mais de 14 dias em situações agudas. Lembre-se de que estes medicamentos não são isentos de riscos, pois podem provocar efeitos adversos, interagir com outros fármacos e até mascarar sintomas de outras doenças. 

Já nos tratamentos prescritos, é crucial que os utentes conheçam o medicamento que estão a tomar e saibam as razões da sua prescrição. Este deve, assim, respeitar as indicações do médico e manter a toma apenas pelo tempo necessário. 

As medidas não farmacológicas e mudanças do estilo de vida são também essenciais. Segundo Pedro Narra Figueiredo, são mesmo o "pilar terapêutico de muitas das patologias, nas quais os IBP são utilizados, e às quais o doente deve aderir rigorosamente".

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