Fiador: lei, direitos e cuidados a ter
Muito frequente nos contratos de empréstimo para compra de habitação e, cada vez mais, nos de arrendamento, a fiança é o contrato pelo qual o fiador se compromete a pagar a dívida do devedor “original”, no caso de este não o fazer.
Pondere bem antes de aceitar ser fiador, mesmo que o pedido provenha de familiares ou amigos próximos. Ao tornar-se fiador, está a colocar o seu património como garantia de uma dívida de terceiros, pois fica obrigado perante o credor a responder pelas dívidas em caso de incumprimento.
A lei impõe que, ao prestar a fiança, o fiador declare expressamente que é essa a sua vontade. Se aceitar ser fiador num empréstimo, essa responsabilidade vai passar a estar inscrita no seu mapa de responsabilidades de crédito.
Em caso de mora do arrendatário e de o mesmo não fazer cessar essa situação no prazo de oito dias a contar do seu começo, o senhorio deve informar o fiador sobre o atraso e os respetivos valores no prazo de 90 dias. Se não o fizer, o senhorio não pode exigir qualquer pagamento ao fiador.
Benefício da excussão prévia e benefício do prazo
Se é fiador num crédito à habitação, pode recusar-se a pagar a dívida enquanto o banco não executar primeiro todos os bens de quem pediu o empréstimo. Por exemplo, se houver uma hipoteca sobre a casa, tem o direito de não pagar enquanto o banco não penhorar o imóvel do devedor. Este direito, denominado benefício da excussão prévia, é uma forma de evitar a penhora do seu património ou de conseguir que a penhora seja levantada.
Assegure-se de que no documento que vai assinar consta que “não prescinde do benefício de excussão prévia”. Caso tenha essa indicação e, mesmo assim, a penhora ocorra de imediato sobre os seus bens, pode opor-se se não tiver ficado demonstrada a insuficiência do património do devedor. Ou seja, enquanto não estiverem executados todos os bens do devedor principal, para satisfazer a obrigação.
Se prescindir de tal benefício, o credor pode optar logo de início por indicar os seus bens (e não os do devedor) à penhora. A verdade é que é frequente os bancos obrigarem os fiadores a renunciarem a esse direito. Sempre que o fiador aparecer no contrato como “principal pagador”, não pode depois invocar o benefício da excussão.
Outro detalhe importante a ter em conta é o benefício do prazo, ao qual o fiador não deve renunciar. O benefício do prazo permite que o devedor pague uma dívida no prazo convencionado para o efeito, impedindo o credor de a exigir antecipadamente na íntegra. Se não houver renúncia e o devedor perder o benefício do prazo, por ter falhado uma das prestações, a perda do mesmo não é extensível ao fiador.
É extremamente importante analisar bem o contrato e respetivos anexos, quer seja de crédito à habitação, hipotecário ou mesmo crédito pessoal, quer seja de arrendamento, antes de aceitar ser fiador de alguém, seja quem for. Para sua própria proteção, preste especial atenção ao benefício da excussão prévia e ao benefício do prazo.
Renegociar a dívida
Tente convencer o devedor principal e o credor (banco) a negociar a dívida, alargando, por exemplo, o prazo de pagamento, amortizando antecipadamente (atenção à penalização), alterando a modalidade da taxa ou prestando outras garantias (pessoais ou reais), entre outras formas de renegociação. Estas são algumas das formas de reduzir o montante das prestações mensais do crédito à habitação. Contudo, podem significar que, no final, o empréstimo fica mais caro.
Peça uma reavaliação do crédito ao banco para reduzir a prestação mensal. Desde 2013, as instituições financeiras, em caso de dificuldade no cumprimento, devem apresentar aos clientes propostas para regularizarem a sua situação, o que inclui a renegociação do crédito.
Como fiador, pode sugerir uma troca do bem penhorado, para suspender a execução, mas tem de apresentar uma caução. Por exemplo, entregar um terreno, em vez do carro. Nesse caso, a hipoteca do terreno servirá de caução.
Prazo de reflexão
Com o objetivo de salvaguardar o devedor e o fiador, entrou em vigor, no início de 2018, o regime dos contratos de crédito relativos a imóveis. As instituições bancárias são agora obrigadas a avaliar a capacidade do devedor para reembolsar o crédito hipotecário e a garantir que este tem condições para tomar uma decisão racional e esclarecida sobre as características do crédito que vai celebrar.
Devem ainda prestar informação ao fiador sobre as principais características do crédito sobre imóveis (sejam ou não para habitação), disponibilizando-lhe a ficha de informação normalizada europeia (FINE). O fiador passa, assim, a ter o direito a receber cópia da FINE do empréstimo aprovado, bem como a minuta do contrato de crédito. Mas, mais importante, dispõe, como o devedor, de um prazo de reflexão de sete dias para ponderar todas as implicações antes da celebração do contrato de crédito.
Como fiador, a lei dá-lhe ainda o direito de recusar a dívida se provar que informou o credor de que deixou de ter dinheiro ou bens para a pagar. A obrigação deste é pedir ao devedor principal para reforçar a fiança. O difícil será provar que o credor sabia que não conseguiria cumprir e que, como tal, a responsabilidade pelo incumprimento não é sua. Mas prepare-se: é uma tarefa árdua e provavelmente inglória.
Um fiador não pode deixar de o ser, regra geral. Ser fiador implica assumir uma obrigação da qual só poderá desvincular-se se o credor e o devedor aceitarem. Mas é pouco provável que o credor aceite ficar com menos uma garantia, ou com uma garantia real em substituição da pessoal. A substituição deste tipo de garantia por outra garantia pessoal não é fácil de conseguir.
Quando o fiador paga a dívida, fica com o direito do credor sobre o devedor e pode exigir-lhe o cumprimento da obrigação. Este mecanismo designa-se por sub-rogação nos direitos do credor. Mas, na prática, se o devedor não conseguiu pagar a dívida ao credor, dificilmente terá condições de pagar ao fiador, a menos que a sua situação financeira sofra uma reviravolta positiva.
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