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Publicidade a produtos e serviços bancários: regras mais apertadas

Em julho, entram em vigor novas normas que restringem o uso de expressões como "0% de juros" ou equivalentes. Obrigam também a dar destaque a comissões associadas a certos produtos. A DECO PROteste considera que o Banco de Portugal poderia ter ido mais longe. 

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21 abril 2025
Dois homens numa caixa multibanco

iStock

A crescente digitalização, a constante inovação financeira e novas práticas comerciais levaram o Banco de Portugal a fixar novas regras para a publicidade de produtos e serviços financeiros. Entre as entidades abrangidas encontram-se instituições de crédito, de pagamento, de moeda eletrónica, intermediários de crédito, entre outras.

As novidades têm impacto em toda a publicidade que estas entidades poderão fazer a partir de 1 de julho de 2025. Uma medida que peca por tardia. As regras atualmente em vigor aplicam-se desde 2009. Na perspetiva da DECO PROteste, a entidade reguladora poderia ter ido mais longe.

Por exemplo, a rádio é um dos meios de publicidade mais utilizados pelas entidades bancárias. A maioria dos anúncios é impercetível e dificulta a completa apreensão de toda a informação relevante. O aviso do Banco de Portugal não vem modificar substancialmente as regras no que à rádio diz respeito.

Bancos mais limitados nas expressões que usam

Uma novidade é a existência de expressões de uso restrito. Por exemplo, frases como “0% de juros” ou equivalentes só serão admissíveis quando, efetivamente, os consumidores não tiverem de pagar qualquer quantia adicional. Sem prejuízo disso, caso existam comissões não refletidas no custo total do crédito, devem ter o mesmo destaque no anúncio.

Outras expressões de uso restrito são: “sem custos”, “gratuito”, “oferta”, “devolvemos o seu dinheiro”, “pagamos nós”, “o mais baixo do mercado”, ou equivalentes. A sua utilização não está vedada, mas requer-se que sejam verídicas, isto é, que correspondam à verdade.

Na publicidade de produtos de crédito, as instituições devem dar o mesmo destaque à taxa anual de encargos efetiva global (TAEG) que o dado à designação do produto ou aos benefícios. Devem, ainda, indicar um exemplo representativo, para serem mais facilmente percetíveis os custos que um crédito à habitação, por exemplo, comporta. Recorde-se que a TAEG reflete, além dos juros dos empréstimos, todos os demais encargos que o cliente terá de pagar pelo crédito. É, por isso, essencial salvaguardar-se a transparência desta informação.

No caso de produtos de crédito, também deve ser dado destaque ao prazo de reembolso, ao montante de financiamento correspondente à prestação anunciada e ao prazo total do crédito.

Tratando-se de depósitos, a publicidade que anuncie uma taxa de juro ou um benefício associado deve indicar, com destaque similar, a TANB (única taxa de juro fixa) ou TANB média (taxas de juro diferenciadas), indexante e spread (taxas de juro variáveis). Da mesma forma, o eventual montante da comissão de manutenção deve ser destacado.

Além desta comissão, entre as informações obrigatórias, está também o prazo do depósito, a possibilidade de mobilização antecipada e eventual penalização. Os dois primeiros merecem o mesmo protagonismo que o benefício anunciado. Além disso, a designação de um depósito não pode conter uma taxa de juro que não seja garantida.

Nem mesmo as contas pacote escapam às novas regras. Não obstante a conta pacote não ser padronizada, a DECO PROteste considera que, por uma questão de transparência, os termos em que pode ser publicitada deveriam ser mais claros. O aviso do Banco de Portugal foi excessivamente modesto. 

Também a publicidade dos depósitos estruturados terá novas regras. Estas passam, por exemplo, pela indicação expressa da natureza de “depósitos estruturados” e pelo destaque que deve ser dado às suas principais características. Por exemplo, muitos consumidores confundem-nos com os tradicionais depósitos a prazo, desconhecendo que a remuneração do capital que aplicam pode ser nula. Isto é, pode ser zero.

Divulgação das campanhas publicitárias

As novas regras estabelecem que o Banco de Portugal deve ter conhecimento e cópia dos respetivos suportes, em formato eletrónico, na data em que são divulgadas as campanhas publicitárias. No entanto, o Artigo 21.º do aviso oferece dúvidas, pois excetua do dever de reporte a rádio, a televisão, a imprensa não digital, múpis e outros cartazes de exterior não digitais. Estão também excluídos os conteúdos disponíveis em sítios públicos na internet, bem como a publicidade institucional difundida nas redes sociais das entidades.

A DECO PROteste não compreende esta norma, que parece ser contraditória. Por um lado, está previsto o dever de reporte, “independentemente do canal e do meio utilizado para a sua difusão”; por outro lado, assinala a exceção para vários suportes. Para assegurar a eficácia objetiva da regulação, o reporte deveria ser feito com uma determinada antecedência, face à divulgação das campanhas publicitárias, sob pena de a fiscalização a posteriori comportar riscos.

Embora as alterações ao Aviso que entrou em vigor em 2009 sejam notórias, a estrutura de fundo mantém-se, assim como se mantêm os procedimentos e princípios. Sendo a publicidade dirigida aos consumidores, considera-se que também lhes deveria ser dado protagonismo. Se, por exemplo, um consumidor assistir a uma campanha publicitária através da rádio, mas não conseguir apreender todo o seu conteúdo ou até se sentir enganado, deveria dispor de algum mecanismo simples e acessível que lhe permitisse reagir.

Crédito à habitação com mais irregularidades nos canais digitais

De acordo com o mais recente Relatório de Supervisão Comportamental, o Banco de Portugal recebeu, no ano passado, 22 542 reclamações de clientes insatisfeitos com os serviços bancários. Os depósitos bancários, o crédito ao consumo e o crédito à habitação e hipotecário foram os produtos que motivaram o maior número de queixas.

No que respeita aos suportes publicitários utilizados pelas instituições financeiras, foi detetada informação inconsistente, desatualizada, dissimulada, sem rigor ou explicações pouco claras ou incompletas de produtos ou serviços bancários. Estas irregularidades foram mais frequentes em junho, novembro e dezembro, meses das habituais campanhas de férias, Black Friday e Natal.

Em comparação com os meios tradicionais, os canais digitais são os que apresentam mais incumprimentos. Em particular, o crédito à habitação (15,3% do total de suportes) e os depósitos bancários (8,9 por cento). Sem surpresa, os bancos dão maior destaque aos benefícios dos produtos e serviços bancários do que às condições de acesso e restrições, que têm, por regra, um tamanho de letra muito inferior. No caso dos cartões de crédito, a TAEG (taxa que representa o custo total de um crédito) também surge com uma dimensão reduzida ou num local nem sempre percetível pelo consumidor.  

No que respeita à intermediação de crédito, o Banco de Portugal assume que está em curso uma reflexão ampla sobre o respetivo regime jurídico, para aumentar a transparência. Dos 102 suportes analisados, encontrou anomalias em 71. Por exemplo, a utilização de expressões suscetíveis de criar confusão entre a prestação de serviços de intermediação de crédito e a atividade de concessão de crédito. Alguns estabelecimentos inspecionados não tinham sequer Livro de Reclamações.

Onde apresentar queixa contra um banco ou entidade financeira?

Cabe ao Banco de Portugal fiscalizar a conduta das instituições de crédito e outros intermediários financeiros. Além de analisar os preçários e verificar se foram cumpridos os deveres de informação na publicidade, avalia o cumprimento das taxas máximas nos novos contratos de crédito aos consumidores. Quando deteta situações irregulares ou de incumprimento das regras, esta entidade reguladora exige a sua correção. 

Os consumidores podem apresentar queixa através do livro de reclamações, seja em formato físico, disponível nos balcões das instituições, seja em formato eletrónico. Podem ainda enviar a reclamação diretamente ao Banco de Portugal, através do Portal do Cliente Bancário ou por carta. Em todos estes casos, as reclamações são remetidas a esta instituição reguladora.

De acordo com o Livro de Reclamações Eletrónico, o Banco de Portugal ocupa o quinto lugar entre as entidades reguladoras responsáveis pelo tratamento de reclamações. Os serviços financeiros estão no quarto lugar no ranking dos setores de atividade mais reclamados.

No primeiro semestre de 2024, o Banco de Portugal recebeu, em média, 1993 reclamações por mês. Os depósitos bancários, o crédito ao consumo e o crédito à habitação foram as áreas que suscitaram mais queixas dos consumidores. Ainda assim, face a 2023, as reclamações sobre créditos bancários baixaram. O mesmo não aconteceu com os depósitos, cujas queixas subiram 12 por cento. 

Com o objetivo de prevenir reincidências e privilegiar a resolução de queixas, o Banco de Portugal adotou, no ano passado, um novo modelo de tratamento das reclamações. De acordo com esta entidade, "o cliente bancário passa a ser notificado mais cedo do resultado da sua reclamação". Isto é, o cliente toma conhecimento quando o Banco de Portugal conclui a análise da queixa e não apenas quando adota medidas de supervisão, como acontecia anteriormente.

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