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Resistência a antibióticos: o que fazer para evitar

17 janeiro 2023
Resistência a antibióticos

Quando usados de forma incorreta, os antibióticos podem causar mais danos do que benefícios. O seu uso inadequado é um dos principais responsáveis pelo desenvolvimento de bactérias resistentes. Veja o que pode fazer.

 

Segundo o Centro Europeu de Prevenção e Controlo das Doenças (ECDC), Portugal é um dos países europeus com maior taxa de resistência das bactérias Staphylococcus aureus e Enterococcus faecalis e faecium. A primeira é normalmente responsável por pneumonias, infeções no coração e nos ossos. As segundas são comuns em infeções urinárias e meningites. O mau uso dos antibióticos é apontado como o principal responsável pela resistência bacteriana.

Dados da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) revelam que, em Portugal, até ao ano 2050, vão morrer, por ano, em média, 1100 pessoas devido a infeções bacterianas muito resistentes. Isto corresponde a mais de 40 mil mortes entre 2015 e 2050. A resistência a antibióticos mata 25 000 pacientes por ano na UE e até 700 000 pacientes por ano no mundo. Daí que a resistência bacteriana seja um grave problema de saúde pública, que ameaça o tratamento das pessoas e a prevenção de um número cada vez maior de infeções bacterianas.

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O que são bactérias resistentes?

Os antibióticos são medicamentos concebidos para matar ou impedir o crescimento das bactérias, ajudando a curar infeções bacterianas em pessoas, animais e, por vezes, plantas. Existem mais de 15 classes diferentes de antibióticos, com estrutura química e modo de ação distintos. Um antibiótico pode ser eficaz contra vários tipos de bactérias ou contra apenas um. Certo é que nem todos os antibióticos são eficazes contra todas as bactérias.

Considera-se que as bactérias apresentam resistência aos antibióticos quando determinados antibióticos específicos perdem a capacidade de as matar ou de impedir o seu desenvolvimento. As bactérias resistentes sobrevivem e multiplicam-se, resistindo à ação dos antibióticos de uso mais comum.

Há dois tipos de resistência bacteriana aos antibióticos:

  • resistência intrínseca – tem que ver com a resistência natural de determinadas bactérias;
  • resistência adquirida – quando bactérias normalmente suscetíveis aos antibióticos desenvolvem resistência em resultado de alterações genéticas causadas, por exemplo, quando os antibióticos são utilizados de forma incorreta.

A formulação dos antibióticos permite-lhes matar as bactérias suscetíveis a este tipo de terapêutica. Contudo, quando a doença é causada por bactérias resistentes, o tratamento das infeções é desafiante. Nestes casos, os médicos têm de prescrever antibióticos diferentes, o que pode atrasar o início do tratamento correto e resultar em complicações de saúde. O doente poderá também necessitar de mais cuidados, assim como de antibióticos alternativos mais dispendiosos e com efeitos secundários mais graves.


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O que causa a resistência aos antibióticos?

Não é o ser humano ou os animais que se tornam resistentes aos tratamentos com antibióticos. A resistência aos antibióticos é um fenómeno natural nas bactérias. Há maior resistência quando se insiste em tomar antibióticos desnecessariamente, como, por exemplo, perante uma dor de garganta sem sinais de infeção bacteriana.

Atualmente, a resistência aos antibióticos tem-se agravado com o aparecimento de novas estirpes de bactérias resistentes a vários antibióticos em simultâneo (bactérias multirresistentes). Estas bactérias chegam a sobreviver na presença de três ou mais antibióticos e representam uma séria ameaça para a saúde humana e animal. Se não se travar o seu desenvolvimento, num futuro próximo, a medicina terá grande dificuldade em tratar as doenças bacterianas, uma vez que os medicamentos poderão tornar-se ineficazes. Caso os antibióticos deixem de ser alternativa para tratar doenças infeciosas causadas por bactérias, as consequências podem ser desastrosas e, até, fatais.

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Causas e consequências da resistência a antibióticos

Os fatores responsáveis pelo aparecimento e propagação destas bactérias resistentes são:

  • o uso excessivo e desregrado de antibióticos pelo ser humano;
  • a utilização de antibióticos na veterinária, na agropecuária e na indústria;
  • a maior circulação de pessoas e de alimentos e matérias-primas para a produção alimentar nos diferentes países.

Impacto na saúde humana

A causa principal de resistência aos antibióticos por parte das bactérias de que os seres humanos são portadores resulta do uso inadequado de antibióticos na medicina. Isto ocorre, sobretudo, quando os antibióticos são tomados de forma incorreta, ou seja:

  • sem que haja necessidade desse tipo de terapêutica (por exemplo, no tratamento de gripes, constipações, bronquites, faringites e amigdalites, que na maioria dos casos são causadas por vírus e não por bactérias);
  • quando não são respeitados a duração do tratamento, as doses prescritas e o intervalo entre as tomas, que pode levar a que a quantidade necessária e adequada de antibiótico no organismo não seja atingida e as bactérias sobrevivam, podendo tornar-se resistentes.

Em contexto hospitalar, há outros fatores que concorrem para a maior resistência aos antibióticos:

  • prescrição desnecessária ou não adequada aos resultados das culturas microbiológicas;
  • tratamento demasiado curto ou demasiado prolongado.

Uma vez que as bactérias resistentes se espalham rapidamente em ambientes confinados, a sua propagação pode ocorrer facilmente em ambiente hospitalar. No nosso país, 11% dos internados são contaminados durante a permanência no hospital, quase o dobro da média da União Europeia. De acordo com a Direção-Geral da Saúde, o número de profissionais de saúde dedicados ao controlo destas infeções é inferior à média europeia.

A principal via de transmissão das infeções bacterianas é o contacto direto entre quem transporta a bactéria e quem está mais suscetível de contrair a infeção. Esta situação aumenta o risco de complicações médicas e até a duração dos internamentos. Para evitar a ocorrência infeções nos hospitais, é fundamental que os profissionais de saúde adotem boas práticas, tais como:

  • lavar sempre e bem as mãos;
  • usar luvas;
  • respeitar as rotinas de esterilização e de desinfeção de equipamentos e superfícies;
  • limitar o contacto entre doentes;
  • alertar as visitas sobre a importância de cobrir a boca e o nariz com o antebraço ou um lenço de papel quando tossem ou espirram.

Animais podem transmitir bactérias

Os antibióticos são também muitas vezes dados a animais de explorações agrícolas mesmo saudáveis, tendo em vista a prevenção de doenças que possam surgir pela sobrelotação dos espaços ou quando a higiene é insuficiente. Trata-se de um uso inadequado e excessivo que potencia resistências: as vacinas e as boas práticas de higiene são, na maioria dos casos, suficientes para prevenir doenças.

Ciente da necessidade de limitar o uso de antibióticos na produção animal e agrícola, vários países da União Europeia, Portugal incluído, já criaram sistemas de vigilância de resistência aos antibióticos. Campanhas informativas sobre a resistência aos antibióticos têm-se aliado aos apelos da Organização Mundial da Saúde (OMS) à lavagem das mãos e à vacinação (para limitar a transmissão de infeções) e a sensibilização para a prescrição e toma racional destes medicamentos. Também a DECO PROTESTE, através dos seus testes aos produtos alimentares, tem contribuído para melhorar a literacia das populações neste sentido.

Bactérias resistentes como a Campylobacter ou a Salmonella podem passar para as pessoas através de:

  • consumo de carne, peixe e ovos pouco cozinhados contaminados com bactérias resistentes;
  • contacto com animais de exploração agrícola vivos portadores das bactérias resistentes;
  • consumo de fruta e hortaliça cultivadas em terrenos fertilizados com estrume proveniente de animais infetados;
  • consumo de água contaminada com os excrementos dos animais infetados.

Para evitar uma intoxicação alimentar e não ingerir bactérias resistentes provenientes dos alimentos:

  • lave bem as mãos antes de mexer em alimentos;
  • lave bem fruta e legumes para eliminar grande parte dos microrganismos nocivos. Tenha particular cuidado quando os alimentos são consumidos crus;
  • a maioria dos microrganismos morre a 70ºC. Se cozinhar bem a carne, o peixe e os ovos, elimina o risco. Antes de consumir sobras, certifique-se de que todas as partes do alimento ficam quentes;
  • manipule os alimentos em separado para evitar a chamada contaminação cruzada. Por exemplo, ao arranjar o frango, lave bem as mãos, os instrumentos e as superfícies utilizados antes de manusear os legumes, o peixe ou outra carne.

Água contaminada com antibióticos?

Os antibióticos são descarregados nas águas residuais, tal como os restantes produtos farmacêuticos e substâncias hormonais. Como tal, contaminam rios e albufeiras, muitos dos quais são fontes da água para consumo humano. Estes poluentes prejudicam a estrutura e a função dos ecossistemas aquáticos, incluindo os biofilmes (algas, bactérias e fungos), que têm um papel essencial na degradação da matéria orgânica presente na água e no fundo dos rios.

Apesar de ser seguro beber água da torneira, a ingestão contínua de água com antibióticos pode potenciar a ocorrência de resistências bacterianas. Nesse sentido, defendemos que é preciso reduzir a carga de antibióticos libertados para o ambiente e alargar o leque das substâncias prioritárias a controlar com regularidade.

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10 conselhos para travar a resistência bacteriana

  1. Tome antibióticos apenas sob prescrição médica: a utilização em situações que não necessitam de antibiótico e o uso de um agente antibacteriano ineficaz contribuem para o aumento das resistências. Combata a gripe e a constipação com repouso, muitos líquidos e analgésicos para a febre e para as dores (paracetamol, por exemplo).
  2. Quando lhe for prescrito um antibiótico, respeite a dose indicada e os intervalos entre as tomas. Efetue sempre o tratamento completo, mesmo quando houver uma melhoria: a interrupção do tratamento com antibiótico pode levar a uma reinfeção numa forma mais grave.
  3. Quando as embalagens de antibiótico tiverem mais doses do que as prescritas para o tratamento, estas devem ser entregues na farmácia para serem eliminadas. Desta forma evita o seu uso indevido e ajuda a proteger o meio ambiente.
  4. Em caso de gravidez, os antibióticos podem passar para o feto e provocar danos. A menos que o antibiótico seja prescrito por um médico, não tome.
  5. Lave as mãos (principalmente depois de utilizar a casa de banho ou antes de uma refeição). Esta é a medida de higiene principal para prevenir uma infeção e evitar o aparecimento de resistências bacterianas.
  6. Tomar antibióticos altera sempre a flora bacteriana, o que pode dar origem a distúrbios como diarreia, dores de estômago, vómitos, náuseas e infeções vaginais, entre outros. Normalmente estes acontecimentos são ligeiros; se forem severos, deve consultar o médico de família. Menos comuns são as reações alérgicas aos antibióticos (particularmente às penicilinas e cefalosporinas) que podem manifestar-se como erupções cutâneas, urticária, tosse e alguma dificuldade em respirar (pieira). Se suspeita que é alérgico a determinado antibiótico, informe o profissional de saúde antes da sua administração. Uma reação alérgica mais severa (reação anafilática) pode requerer intervenção médica urgente.
  7. Os antibióticos podem interagir com inúmeros medicamentos ou suplementos à base de plantas. Informe o médico, antes da prescrição, de toda a medicação que esteja a fazer.
  8. Assegure-se de que recebe do médico instruções exatas sobre quando e como deve ser tomado o antibiótico (por exemplo, antes ou depois das refeições e com ou sem alimentos). É também importante ser alertado para a eventual necessidade de evitar certos alimentos ou bebidas durante o tratamento.
  9. Siga com rigor as instruções que lhe foram dadas pelo médico, e consulte o folheto informativo. Quando surgirem dúvidas, estas devem ser colocadas ao médico ou ao farmacêutico.
  10. Nas explorações pecuárias, agrícolas e de aquicultura, os antibióticos só devem ser utilizados para fins terapêuticos.
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