João Goulão: “Mais vale tratar do que punir”

Publicado a 20 maio 2025

Drogas, álcool, jogo, ecrãs... são muitas as formas de dependência tratadas no Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD). À sua frente está João Goulão, referência no conhecimento e no tratamento destes consumos.

Fernando Piçarra/4See João Goulão

O álcool é a maior dependência em Portugal

“[O álcool é a substância] em relação à qual existe uma enorme complacência social. Não nos esqueçamos de que no passado tivemos, inclusive, um suporte político ativo ao uso do álcool, a velha máxima de que beber vinho era 'dar de comer a um milhão de portugueses'.”
João Goulão
“Existem no mercado novos opioides sintéticos, desde logo o Fentanil, que tem provocado mortandade, em particular nos Estados Unidos e no Canadá.”

Qual é a adição em Portugal que representa a maior prevalência? Qual é a dependência maior?

O álcool. Penso que é, de longe, a substância que provoca mais problemas, mais consumos problemáticos, seja usado isoladamente, seja no contexto de policonsumos, porque, muitas vezes, há consumos associados de outras substâncias.

Será pelo facto de ser uma substância legal?

Sim, e também em relação à qual existe uma enorme complacência social. Não nos esqueçamos de que no passado tivemos, inclusive, um suporte político ativo ao uso do álcool, a velha máxima de que beber vinho era “dar de comer a um milhão de portugueses”... Basta ver que é frequente, por exemplo, um adolescente chegar a casa e se vai de olhinho vermelho porque esteve a fumar uma ganza, há uma reprimenda enérgica por parte dos pais e familiares. Mas se chegar embriagado, o filho já é um homenzinho, já se embebeda... Apesar de, de acordo com a lei, e não foi uma batalha fácil de travar, a venda de bebidas alcoólicas estar proibida a menores de 18 anos. O que é facto é que constatamos a olho nu como é facílimo, por parte dos jovens menores de idade, aceder a bebidas alcoólicas. Há, de facto, uma complacência social tremenda que é difícil de contrariar. Isto acontece no seio das famílias e acontece em vários contextos, nomeadamente no contexto recreativo.

Quais são as idades com maior prevalência desse consumo?

O início do consumo de álcool retardou, de acordo com o último estudo que publicámos, que é o estudo em meio escolar, o inquérito aos consumos em meio escolar, que cobre desde os 13 aos 18 anos. Contudo, e este é um fenómeno muito curioso, há um equilíbrio de género que se tem acentuado nos últimos estudos. Cada vez mais as raparigas bebem de forma equivalente à dos rapazes, quando não suplantam mesmo os consumos dos rapazes.

Que zonas do País têm as dependências mais dominantes?

Temos, por exemplo, situações ou regiões bastante problemáticas, como o Alentejo, onde há uma prevalência muito grande do álcool. Em relação às outras substâncias, e em particular às ilícitas, as coisas variam bastante, sendo certo que a grande cidade é, por norma, a sede dos problemas. O que temos assistido nos últimos tempos, em particular nas grandes cidades, é uma grande visibilidade dos consumidores problemáticos, muito expostos na via pública. E isto tem criado algum alarme social. Mas, insisto, não temos a evidência dos números, de que haja um disparo. Agora, costuma falar-se muito, por exemplo, das novas substâncias psicoativas, que são inúmeras, que estão presentes no mercado, que são consumidas, na maior parte dos casos, em associações completamente disparatadas e com efeitos imprevisíveis.

Como por exemplo?

Desde canabinoides sintéticos, a catinonas, enfim, uma série de grupos de novas substâncias, que vão sendo lançadas no mercado sucessivamente. Todos os dias são identificadas no espaço europeu novas substâncias em circulação. Nós integramos o chamado sistema de alerta rápido, que é um dispositivo montado pelo Observatório Europeu, agora Agência Europeia das Drogas, e pela Europol. E, quando em algum país europeu é identificada uma nova substância, é dado um alerta geral para que toda a gente, em todos os países, fique habilitada também a identificar e a reportar a existência de casos de consumo e, tanto quanto possível, situações de urgência relacionadas com esse uso e os efeitos identificados atribuíveis àquela nova substância. Vivendo num mundo global como aquele que temos atualmente, cedo ou tarde as substâncias acabam por aparecer nos diversos países. Em alguns com maior incidência, outros menor, mas o que é facto é que esta partilha de informação é extremamente útil.

Quem é João Goulão?

Presidente do Instituto para os Comportamentos Aditivos e as Dependências (ICAD), exerceu diferentes cargos, em diversas instituições vocacionadas para o tratamento da toxicodependência.

Novas substâncias difíceis de controlar

“Quando uma nova substância é classificada e é incluída na lista de substâncias proibidas, passa a haver mecanismos legais de repressão ao tráfico e à produção. Mas rapidamente são lançadas no mercado novas substâncias que, com pequenas alterações da sua estrutura química, passam a ser uma outra substância, que não está incluída naquela legislação.”

Quantas substâncias novas aparecem, anualmente, no mercado europeu?

No início da década, havia qualquer coisa como 200 novas substâncias identificadas. Algumas sobrevivem, outras não. O que acontece é que quando uma destas novas substâncias é classificada e é incluída na lista de substâncias proibidas, passa a haver mecanismos legais de repressão ao tráfico e à produção. Mas rapidamente são lançadas no mercado novas substâncias que, com pequenas alterações da sua estrutura química, passam a ser uma outra substância, que não está incluída naquela legislação. Então, durante algum tempo, normalmente cerca de um ano, há ali uma janela de oportunidade para que essa nova substância seja comercializada sem ser objeto de repressão e quando lá chega a repressão, é um jogo de gato e rato verdadeiramente difícil.

Quais são os efeitos dessas substâncias?

São muito variados. Depende de diversos fatores. Por exemplo, existem no mercado novos opioides sintéticos, desde logo o Fentanil, que tem provocado mortandade, em particular nos Estados Unidos e no Canadá, e vai chegando já também a alguns países europeus. Mas agora há uma nova geração, que são os nitazenos, ainda mais potentes, com uma margem de segurança mínima. Temos muita experiência em lidar com um opiáceo que tradicionalmente provocou mais problemas na nossa sociedade e nas sociedades europeias, que é a heroína. Mas agora estes são cem vezes mais potentes do que a heroína. E o diferencial entre a dose que proporciona o efeito procurado pelo utilizador e a dose letal, em muitos casos, é mínima.

E, por serem mais potentes, causam a dependência ou a habituação mais depressa do que as substâncias tradicionais?

Sim, podem causar. Muito diz respeito aos opiáceos. Há mecanismos que rapidamente implicam uma tolerância, a necessidade de aumentar a dose para obter o mesmo efeito. Portanto, a margem de segurança, se é que podemos falar de segurança nestas questões, é mínima. Os mecanismos que levam à dependência física são semelhantes aos da produção dos opiáceos endógenos. Nós produzimos opiáceos quando tomamos um opiáceo exógeno. Deprimimos a produção interna. Se, imediatamente, decidirmos parar de consumir esse opiáceo, demora algum tempo até que os nossos próprios opiáceos voltem a funcionar. Isto implica que as pessoas são compelidas a continuar a usá-los, porque, se não o fizerem, sofrem. Normalmente, a continuidade dos consumos tem que ver com o alívio desse sofrimento, mais do que com a busca do prazer.

São drogas baratas?

São, em geral, mais baratas, e de difícil controlo, até pelas autoridades aduaneiras. É possível, e há um mercado florescente de entrega ao domicílio deste tipo de substâncias, aquilo a que nós chamamos a uberização das drogas. E, por outro lado, é possível encomendar na dark net e receber em casa pequenos pacotinhos perfeitamente descaracterizados. Chegam ao consumidor com muita facilidade e implicam necessariamente enormes dificuldades para as autoridades policiais.

Qual é a substância aditiva ou dependência mais grave nas consequências físicas, psicológicas e sociais?

Cada uma tem as suas... Há pouco falávamos do álcool. Diria que essa é a substância com maior impacto ao nível da saúde da nossa população. Em termos de efeitos gravosos para a saúde, vivemos, nas décadas de 80 e 90, uma epidemia brutal relacionada com o uso de heroína, que, por um lado, dizimou toda uma geração por via das overdoses e, por outro lado, coincidiu com o emergir da epidemia da sida, que se difundiu enormemente na população. E que também vitimou muitas pessoas, até que finalmente houvesse respostas terapêuticas e pudéssemos considerar a seropositividade para o VIH hoje como uma condição que evoluiu para a cronicidade. Chegámos a ter 1% da população portuguesa dependente de heroína. São 100 mil pessoas. Foi brutal. Foi das maiores − fazendo a escala relativamente à população portuguesa − prevalências no espaço europeu. Começámos tarde na utilização de drogas. Por condições históricas, pela existência de um regime autoritário, de uma sociedade muito controlada, uma polícia política, censura, limitação da mobilidade dos cidadãos, ficámos relativamente imunes ao fenómeno, que, entretanto, estava já a crescer noutros países europeus. Mas, ao mesmo tempo, é importante também o facto de toda uma geração de jovens, do sexo masculino, ter sido enviada para a guerra maioritariamente a contragosto. As pessoas iam porque tinha de ser. E, nas antigas colónias, durante o período da Guerra Colonial, o uso de substâncias psicoativas, nomeadamente álcool, que era, em muitos casos, mais barato do que a água.

Que tipo de bebida?

Whisky, por exemplo. E, por outro lado, a canábis estava completamente difundida, facilmente acessível. Muitos destes jovens desenvolveram hábitos de consumo de substâncias psicoativas e isto era tolerado pela hierarquia militar, um pouco à semelhança do que aconteceu no Vietname. Subitamente, tudo isto muda, temos o 25 de Abril, a explosão de liberdade, alterações da sociedade portuguesa, e pouco depois o processo de descolonização, com o regresso de todos estes jovens, e dos colonos que lá viviam, também muitos deles com hábitos de uso, e que, quando regressaram, trouxeram literalmente toneladas de canábis. De repente, há uma explosão de experimentação quase generalizada. O Estado estava ocupado com outras coisas, naturalmente. Isto passou mais ou menos silenciosamente, não fez tocar campainhas de alarme. Elas só vêm a tocar, com alguma intensidade, quando algumas organizações criminosas introduzem no nosso mercado todas as outras substâncias: heroína, cocaína, LSD, tudo.

Nos anos 80?

Final dos anos 70 e início dos anos 80. Ao contrário da população de outros países, éramos completamente naïfs a propósito de drogas. Não sabíamos nada. E esse desconhecimento, de alguma forma, favoreceu o saltar de umas para as outras. O Estado demorou um bocado a reagir. Num dado momento, era impossível encontrar uma família portuguesa que não fosse afetada.

Descriminalizar e tratar

“O que fizemos foi propor que, quando falamos de uso e porte para uso pessoal, esse consumo saísse da esfera criminal e passasse a ser uma contraordenação. Podemos comparar isto ao uso do cinto de segurança quando conduzimos.”
João Goulão
“Fui particularmente fustigado pelos fenómenos relacionados com drogas. Não sabia nada do assunto, mas tinha uma arma que se revelou fundamental, a disponibilidade e a vontade de ajudar.”

É dessa altura a resposta do Estado?

No final dos anos 70, o ministro da Justiça, Almeida Santos, perdeu uma filha por uma situação relacionada com consumos. Tinha uma sensibilidade particular para o problema. E foi o ator da construção das primeiras respostas estatais dirigidas a este fenómeno. Foram os Centros de Estudos e Profilaxia da Droga, no Ministério da Justiça, mas com vocação de saúde, prevenção, tratamento, etc. As primeiras respostas do Estado foram essas. Depois, houve um hiato. E foi o tempo do florescimento das respostas privadas, as chamadas comunidades terapêuticas. Muitas tinham muito pouco de terapêutico. Eram verdadeiros depósitos, sem técnicos, na maioria dos casos com uma organização hierárquica, em que os mais antigos tomavam conta dos mais novos. E, na maior parte das vezes, também eram grandes negócios. Algumas clínicas eram altamente lucrativas e com práticas problemáticas, até do ponto de vista do respeito dos direitos humanos. Só no final dos anos 80 é criada a primeira resposta consistente, o Projeto Vida. Houve também a criação de um grande centro para tratamento de toxicodependentes, o Centro das Taipas, que hoje funciona no Parque de Saúde de Lisboa. Mas, sendo o único, rapidamente ficou submerso pelos utentes vindos de todo o País. Então, a equipa pôs-se em campo para tentar identificar, nas cidades periféricas, profissionais que pudessem ser envolvidos nesta dinâmica e criar localmente respostas que pudessem, pelo menos, amortecer a pressão exercida sobre o Centro das Taipas.

É quando o integra?

É nesta altura que eu entro. Era médico de família, trabalhava no Algarve. Fui particularmente fustigado pelos fenómenos relacionados com drogas. Não sabia nada do assunto, mas tinha uma arma que se revelou fundamental, a disponibilidade e a vontade de ajudar. Muitas vezes na base do senso comum, mas sem nenhum saber técnico. Mas comecei a ser procurado cada vez mais por famílias com este tipo de problemas. Ia fazendo o que podia, orientando para onde podia. Os dirigentes do Centro das Taipas localizaram-me e convidaram-me para fazer um estágio nas Taipas. Voltei depois para o Algarve com a capacidade de criar uma equipa e um pequeno centro. Em poucos anos, foi possível fazer uma pequena rede de centros inspirados no modelo das Taipas.

Até chegarmos a um ponto em que somos apresentados como um caso de estudo internacional, num célebre artigo do Guardian. Podemos continuar a considerar-nos um caso de sucesso?

Antes disso, é importante dizer que, entretanto, tivemos também uma condição particular. Tivemos um primeiro-ministro muito interessado nesta matéria, António Guterres, até porque uma irmã dele trabalhava connosco nas Taipas. E José Sócrates, que era ministro adjunto, com responsabilidade nas políticas de juventude. Decidiram a constituição de um grupo de trabalho para dirimir algumas destas questões: é legítimo ter programas de reinserção e de promoção do emprego com uma discriminação positiva para as pessoas que têm tido problemas, ou não? É legítimo ter um conjunto de políticas que visam contribuir para uma melhor qualidade de vida e esperança de vida, mesmo que as pessoas continuem a consumir? Então, esse grupo de trabalho, no qual eu tive a felicidade de ser incluído, foi presidido por Alexandre Quintanilha e tinha pessoas como Júlio Machado Vaz ou Daniel Sampaio. Produzimos um documento, que é a primeira estratégia nacional de luta contra a droga, apresentada em 1998 e aprovada pelo Governo em 1999. Incluía uma série de recomendações sobre questões relacionadas com a oferta, forças policiais e aduaneiras, mas sobretudo no que diz respeito à procura, prevenção, tratamento, redução de danos e reinserção social. Tudo baseado na ideia de que estávamos a lidar, sobretudo quando falamos de uso e de dependência, com um problema de saúde, muito mais do que com um problema legal ou de justiça.

É então que surge a descriminalização?

Propusemos a descriminalização do uso de drogas. O que fizemos foi propor que, quando falamos de uso e porte para uso pessoal, esse consumo saísse da esfera criminal e passasse a ser uma contraordenação. Podemos comparar isto ao uso do cinto de segurança quando conduzimos. Se eu não usar o cinto de segurança, a polícia ainda me para, pode aplicar-me uma multa, mas não vou para a cadeia e muito menos fico com um registo criminal que me vai estigmatizar para o resto da vida.

Isso abre caminho a uma integração?

Se um cidadão for apanhado com droga, ou no ato de consumir, se tiver uma quantidade superior à considerada adequada para o uso pessoal durante dez dias, é enviado para o sistema criminal como anteriormente, na presunção de que haverá tráfico. Depois, compete ao tribunal produzir a evidência de que há, de facto, tráfico. Se tiver menos, é intimado apenas a apresentar-se numa comissão de dissuasão da toxicodependência da sua área de residência. Esta comissão é constituída por profissionais de saúde. Têm a capacidade de aplicar contraordenações, mas o seu principal objetivo é identificar as necessidades daquela pessoa. Se for um dependente, é convidado a tratar-se. Mas também tem o direito de dizer não, que não está interessado. A resposta será: "Então, não volte cá nos próximos seis meses pelo mesmo motivo, porque aí haverá uma penalidade." Felizmente, apenas uns 10% das pessoas que são presentes a estas comissões é que são dependentes.

As respostas são clínicas?

Há situações que podem gerar um conflito e uma dificuldade interna. Então, a comissão pode discutir isso com um psicólogo e encaminhar as pessoas não para centros de tratamento independentes mas para outras respostas existentes na sociedade e que podem ajudar a lidar com a sua dificuldade, como a Segurança Social, com uma assistência social que ajuda a família, um psicólogo, um instituto da juventude...

Para evitar mesmo que haja uma escalada no consumo?

Exatamente. Uma escalada e um aumento da importância e da centralidade dos consumos na vida daquela pessoa. Portanto, isto é aquilo que chamamos de uma medida de prevenção indicada, ou seja, dirigida a quem já tem um determinado comportamento e que se tem revelado, ao longo dos anos, extremamente eficaz. E esta é a grande originalidade do modelo português. Houve outros países que descriminalizaram o consumo, mas este modelo das comissões, tanto quanto julgo saber, não foi replicado por nenhum país. Foi relativamente recente, por exemplo, a decisão de descriminalização no estado do Oregon, nos Estados Unidos. As pessoas deixaram de ir para a cadeia, mas, em vez de terem a oportunidade de interagir pessoalmente com profissionais de saúde, aquilo que acontecia é que as forças policiais lhes davam um papelinho com números de telefone. Elas não iam.

Serviços pagos, já que lá não existe um Serviço Nacional de Saúde...

Exatamente, nós temos a felicidade de ter aqui todo este sistema praticamente gratuito. Ainda por cima, é um sistema complementar entre as respostas do Estado, que são razoavelmente sólidas. E complementado por respostas privadas ou de organizações não-governamentais, que têm acordo connosco. E mesmo em comunidades terapêuticas privadas, o tratamento acaba por ser quase gratuito, nós pagamos 80%, restam 20% que ficam a cargo das famílias ou, quando as famílias não podem, a cargo da Segurança Social. Ninguém fica de fora por dificuldade financeira.

Há um mercado florescente de entrega ao domicílio deste tipo de substâncias, aquilo a que nós chamamos a uberização das drogas.

Linha de ajuda mais antiga do País

“A base [do tratamento] é o acompanhamento psicológico e trabalhar a mudança e os objetivos que aquele cidadão tem para a sua vida.”
João Goulão
O ICAD dispõe de uma linha telefónica de ajuda, o 1414, e admite inscrição para tratamento através do site www.icad.pt.

Qual é a abordagem terapêutica para quem já é toxicodependente?

O que está assumido, já há muitos anos, é uma abordagem holística. Mas a base é o acompanhamento psicológico e trabalhar a mudança e os objetivos que aquele cidadão tem para a sua vida. O sistema da dissuasão é complementar, é uma porta suplementar. Mas a pessoa pode ir diretamente, sem referenciação, espontaneamente, bate à porta, ou referenciada pelo seu médico de família, por exemplo, por um serviço hospitalar qualquer. Temos, inclusive, no nosso site (www.icad.pt) um sistema de autoinscrição...

E há um telefone fixo?

Há uma linha telefónica de ajuda, que é o 1414, a Linha Vidas, que é das linhas mais antigas do País, creio que mesmo a mais antiga.

Mais antiga que o SNS24?

Sim. O movimento dessa linha é bastante reduzido neste momento. Estamos a trabalhar no sentido de integrar esta resposta também no SNS24.

E se alguém telefonar para o SNS24?

Também será orientado, porventura, para a nossa. Vamos imaginar um utilizador de heroína. Pode aceder com alguma facilidade e rapidez a um patamar intermédio de equilíbrio, que seria a utilização de uma terapêutica de substituição opiácea, como a metadona. Entretanto, vai trabalhando com o seu terapeuta e vão procurando o melhor caminho. Pode passar por um internamento de curta duração para desabituação física, quando se trata de um opiáceo, porventura seguido de um internamento numa comunidade terapêutica, durante um ano, por exemplo. Ou o retorno à vida normal... Depende da existência de um tutor, de haver alguém na família que possa ajudar a cumprir determinadas regras. Isto é um fato talhado à medida das circunstâncias de cada pessoa.

Quais são as abordagens terapêuticas mais adequadas para os vários tipos de dependências? Há um denominador comum para todas?

São os circuitos do prazer, são os circuitos de mediadores químicos do nosso sistema nervoso, que estão implicados da mesma forma. Portanto, a forma de intervir tem algumas especificidades, de acordo com o comportamento ou a substância envolvida, mas o trabalho psicológico é comum. Muito mais do que algumas abordagens que são muito centradas, por exemplo, em fatores genéticos. Uma das máximas que norteiam a nossa atividade é, por um lado, nunca desistir das pessoas e, por outro lado, mais vale prevenir do que tratar e mais vale tratar do que punir.

Qual é a taxa de sucesso dos tratamentos? Como se mede esse sucesso? Se a pessoa ficar livre completamente da substância do vício?

Tem um milhão de dólares para me dar? Essa é a pergunta de um milhão de dólares (risos).

 

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