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Obras em casa arrendada: o que tem de saber

Inquilinos e senhorios devem contribuir para manter a casa em bom estado de conservação, mas têm diferentes níveis de responsabilidade. Saiba a quem cabe pagar o quê e quais os direitos e os deveres que lhes assistem.

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10 janeiro 2025
Homem a fazer obras

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Todos os edifícios devem ser alvo de obras de conservação, pelo menos, uma vez em cada oito anos. Independentemente deste prazo, cabe ao proprietário manter o imóvel em bom estado e fazer as obras que assegurem as condições de segurança, saúde, higiene e arranjo estético. Quando isso não acontece, as câmaras municipais podem, por sua iniciativa ou a pedido de um interessado (por exemplo, o inquilino), determinar as intervenções necessárias ou ordenar a demolição total ou parcial de construções que ameacem ruir ou que ofereçam perigo para a saúde pública e a segurança das pessoas.

Por regra, nas casas arrendadas, as obras de conservação são da responsabilidade do senhorio e efetuadas por sua iniciativa. O inquilino deve comunicar-lhe essa necessidade e só pode fazer obras se tal estiver previsto no contrato de arrendamento, se tiver autorização escrita do senhorio ou em caso de urgência, para prevenir danos iminentes ou maiores. Fora destas situações, poderá apenas efetuar pequenas deteriorações ou melhorias.

Pequenas deteriorações ou melhorias na casa arrendada

O inquilino pode efetuar pequenas deteriorações ou alterações na casa que assegurem o seu conforto. Um exemplo podem ser os furos para instalar um aparelho de ar condicionado ou uma pintura das paredes. Mas a questão nem sempre será pacífica: aquilo que o inquilino considera uma melhoria pode ser visto como uma deterioração pelo senhorio. Ainda assim, e a menos que tenham acordado algo diferente, deverá reparar essas deteriorações antes de restituir o imóvel.

Como, na maioria dos casos, é necessária autorização para avançar com as obras, sendo esta dada, será que o inquilino tem direito a ser compensado pela eventual beneficiação do imóvel no final do contrato? A resposta depende do tipo de obras:

  • as benfeitorias necessárias visam manter o imóvel em bom estado. As que são urgentes devem ser reembolsadas pelo senhorio, em dinheiro ou mediante redução temporária da renda. Outras obras de conservação não realizadas pelo senhorio também podem dar direito a indemnização;
  • as benfeitorias úteis não são necessárias à conservação do imóvel, mas aumentam-lhe o valor. O inquilino pode retirá-las no final do contrato, desde que não danifique a casa. Se as deixar ficar para o evitar, deve ser indemnizado tendo em conta o ganho do senhorio;
  • as benfeitorias voluptuárias destinam-se a satisfazer a vontade do inquilino, não visando a conservação nem valorizar o imóvel (por exemplo, uma banheira de hidromassagem). Se não puderem ser levantadas sem causar danos, em princípio são perdidas a favor do senhorio.

Obras decididas pelo inquilino

As reparações urgentes são uma exceção à regra de que as obras de conservação são feitas por iniciativa do senhorio. Se ocorrer uma inundação devido a ruturas na canalização, o inquilino pode ver-se obrigado a resolver o assunto. Terá direito ao reembolso das despesas, se avisar o senhorio quando iniciar a reparação. Para evitar problemas, além de um telefonema, envie uma carta registada, com aviso de receção (veja a minuta).

O inquilino também pode realizar obras em caso de recusa ou inércia do senhorio. Trata-se de reparações urgentes, embora não com a urgência da situação anterior. Se o senhorio nada fizer, apesar de contactado pelo inquilino, a solução pode passar por recorrer aos julgados de paz ou aos tribunais. Mas a natureza do problema nem sempre é compatível com tais delongas. Neste caso, deve enviar ao senhorio uma carta registada, com aviso de receção, dando um prazo razoável para que realize as obras (por exemplo, 15 dias, se for viável que sejam concluídas nesse prazo). Se o senhorio nada fizer, o inquilino pode fazê-las e tem direito a ser reembolsado.

Obras de remodelação e restauro profundo

E quando a execução das obras, por iniciativa do senhorio, obriga à desocupação do imóvel? A saída do inquilino é inevitável, mas, para que ocorra, tratando-se de um contrato de duração indeterminada, o senhorio tem de cumprir algumas formalidades. Primeiro, comunicar a intenção de denunciar o contrato, pelo menos, seis meses antes da data pretendida para a desocupação. Da comunicação deve também constar a razão para pôr termo ao contrato de arrendamento. Para que a denúncia seja eficaz, terá de ser acompanhada de vários documentos, incluindo um termo de responsabilidade do autor do projeto, a declarar que a obra obriga à desocupação do imóvel, além de um comprovativo de que foi iniciado o processo relativo às obras junto da câmara municipal. O inquilino tem um prazo de 60 dias, depois de receber a comunicação, para abandonar o local. Denunciado o contrato nestes termos, o inquilino pode exercer o direito de preferência quando o senhorio celebrar novo arrendamento.

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Realojamento ou indemnização para o inquilino

Denunciar um contrato de duração indeterminada, para fazer obras que obriguem a desocupar o imóvel, implica chegar a acordo quanto à compensação que o senhorio irá dar ao inquilino. Existem duas possibilidades: realojamento do inquilino por período não inferior a três anos ou pagamento de uma indemnização, que nunca será inferior a dois anos de renda nem ao dobro do equivalente a 1/15 do valor patrimonial do imóvel que consta na caderneta predial. Se as partes não chegarem a acordo, até 60 dias depois de recebida a comunicação, aplica-se a primeira.

As condições de realojamento terão de ser idênticas às que o inquilino já tinha, quanto ao local, ao valor da renda e aos encargos. Ou seja, entre outros aspetos, o senhorio tem de proporcionar ao inquilino uma habitação em estado de conservação igual ou superior àquela onde vivia, adequada às necessidades do agregado familiar e na mesma freguesia ou limítrofe.

Demolição do prédio

Com algumas exceções, terminar o contrato de arrendamento para demolir o edifício segue as mesmas regras que para as obras de remodelação e de restauro profundos. O senhorio pode denunciar o contrato para demolição, quando tal seja ordenado pela câmara municipal ou por outra entidade gestora, devido a risco de ruína ou perigo para a saúde pública, e para a segurança das pessoas. A demolição também pode dever-se à degradação do prédio, o que terá de ser comprovado pelo município, ou decorrer, por exemplo, de um plano de pormenor de reabilitação urbana. Quando a ordem ou a necessidade de demolição resultarem de ação ou omissão culposa do proprietário ou de terceiros, o inquilino tem direito a ser indemnizado pelo responsável. Se as obras decorrerem de um plano de pormenor de reabilitação urbana, o senhorio pode pedir à entidade responsável pela execução do plano o reembolso dos custos suportados com o realojamento ou a indemnização do inquilino.

Proteger os inquilinos mais vulneráveis

Nos contratos antigos, anteriores a 15 de novembro de 1990, a desocupação do imóvel para demolição ou obras profundas tem regras próprias. Quando os inquilinos têm 65 anos ou mais, ou um grau de incapacidade igual ou superior a 60%, o senhorio tem de os indemnizar e realojar. 

Se não chegarem a acordo quanto ao montante, a indemnização corresponde a dois anos de renda, mas não pode ser inferior ao dobro de 1/15 do valor patrimonial do imóvel indicado na caderneta predial. O senhorio terá ainda de garantir o realojamento do inquilino, pelo menos, durante três anos, em condições idênticas (local, valor da renda e encargos). Com o realojamento, celebra-se novo contrato de duração indeterminada, e a renda pode ser atualizada.

Obras coercivas: o que são?

Quando o senhorio não faz as obras de conservação a que está obrigado, a câmara municipal pode, por sua iniciativa ou a pedido dos interessados, fiscalizar o edifício e determinar a realização das obras necessárias para repor as condições de utilização do imóvel autorizadas na respetiva licença. Da mesma forma, pode ordenar a demolição total ou parcial das construções que ameacem ruína ou ponham em risco a saúde pública e a segurança das pessoas. Se o proprietário não iniciar as obras a que está obrigado, ou não as concluir nos prazos fixados, a câmara municipal pode impor a sua realização ou tomar posse administrativa do imóvel, para lhes dar execução imediata. São as chamadas obras coercivas.

Cabem ao infrator todas as despesas inerentes à posse administrativa, incluindo eventuais custos de realojamento dos inquilinos (que continuam a pagar a renda) e indemnizações ou sanções suportadas pela administração. Se essas quantias não forem pagas voluntariamente, serão cobradas em processo de execução fiscal, no tribunal. Ou seja, haverá uma penhora dos bens do devedor. Em alternativa ao processo de execução fiscal, a câmara municipal pode optar pelo arrendamento forçado, notificando o proprietário e indicando o local, o dia e a hora do ato de transmissão da posse.

Quem paga as obras: o inquilino ou o senhorio?

Algumas situações concretas podem ajudar a clarificar as regras e a resolver dúvidas sobre a quem cabe pagar as despesas. Veja os exemplos.

Infiltrações no telhado

Arrendo a casa da porteira num prédio. Chove-me em casa, por problemas no telhado, que causam danos no imóvel e nos meus bens. Já falei com a administração do condomínio, mas nada foi feito, nem há sinais de que venha a sê-lo.

A casa da porteira é uma parte comum, pelo que cabe ao condomínio manter as suas condições de habitabilidade. O inquilino pode pôr fim ao contrato de arrendamento e exigir uma indemnização pelos danos sofridos, exceto se já tiver decorrido um ano desde que teve conhecimento dos problemas. Outra possibilidade é denunciar o caso à câmara municipal, para que fiscalize o imóvel e inicie um processo de obras coercivas.

Baratas em casa

Mudei-me há poucos meses para uma casa arrendada, já com alguns anos, e estou a braços com uma infestação de baratas. Tentei resolver o problema com produtos de uso comum, mas vai ser necessário recorrer a uma empresa especializada. O senhorio diz que isso é comigo. É mesmo assim?

Se vive num condomínio, tente saber se há mais vizinhos com o mesmo problema. É, aliás, o mais provável, e caberá à administração contratar e pagar o serviço. Não sendo o caso, é mais difícil atribuir responsabilidades. Se as baratas tiverem chegado com os caixotes da mudança, terá mesmo de pagar a desinfestação. Mas, se houver sinais de que já habitavam o imóvel, será uma responsabilidade do senhorio. Tudo depende da origem da infestação.

Inspeção ao gás

A quem cabe pagar a inspeção da instalação de gás: ao senhorio ou ao inquilino?

Se o contrato de arrendamento nada disser em contrário, a responsabilidade pelas inspeções periódicas ao gás é do proprietário. Na hipótese de ser o inquilino a efetuar o pagamento no momento da inspeção, esse montante deve ser reembolsado pelo senhorio. Nas partes comuns de um prédio constituído em propriedade horizontal, a responsabilidade é do condomínio. Neste caso, cabe ao administrador tentar que, no dia da vistoria, haja alguém em todas as frações para que a inspeção se realize. Nas instalações com mais de dez anos e que ainda não tenham sido objeto de remodelação, a inspeção é obrigatória a cada cinco anos.

Portas e fechaduras

Os meus inquilinos arrombaram a porta de um dos quartos, que se teria fechado devido à corrente de ar, com a filha lá dentro. Dizem que a fechadura já estava com problemas e que desta vez não conseguiram abri-la. Porta e fechadura estão irrecuperáveis. A quem cabe pagar a substituição?

A manutenção das fechaduras é responsabilidade do senhorio, que deve garantir o seu bom funcionamento. Se for necessária a substituição por causa acidental (uma chave partida na fechadura ou urgência em abrir uma porta bloqueada, por exemplo), e não por falta de cuidado do inquilino, cabe ao proprietário assumir o encargo. Abrangidas estão também as fechaduras de caixas do correio ou arrecadações, e, na prática, todas as estruturas da casa.

 

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