Ansiedade: quais os sintomas? Como se pode tratar?
As perturbações de ansiedade são as doenças psiquiátricas mais comuns e podem afetar, ao longo da vida, até 30% da população mundial. O que é a ansiedade e como pode ser tratada?
- Especialista
- Susana Santos
- Editor
- Ricardo Nabais e Alda Mota

Sentir ansiedade perante uma situação perigosa é normal. É uma experiência essencial à sobrevivência do ser humano. Todos temos um mecanismo de alerta que nos ajuda a adaptar-nos a grandes mudanças ou a defender-nos de ameaças. É uma forma natural de nos protegermos de riscos.
Mas, quando ocorre uma desregulação desse mecanismo, por causas genéticas ou adquiridas, a experiência deixa de ser adaptativa. E a ansiedade pode tornar-se desproporcionalmente intensa, prolongada e desadequada face ao perigo real da situação. Surgem, assim, as perturbações de ansiedade.
São as doenças psiquiátricas mais comuns. Podem afetar, ao longo da vida, até 30% da população mundial. Estima-se que em 2019 cerca de 300 milhões de pessoas em todo o mundo viviam com este problema. As consequências podem ser extremamente incapacitantes e podem estar ligadas ao risco de outras doenças e perturbações mentais, como a depressão.
Ansiedade é mais comum entre as mulheres
As perturbações de ansiedade são mais comuns no sexo feminino do que no sexo masculino, numa proporção de cerca de dois para um.
Estudos apontam que ser do sexo feminino, ser viúvo(a), ter baixo nível de escolaridade e baixos rendimentos, e de saúde (com consumo de substâncias, sobretudo tabaco) são alguns dos fatores de risco. Outros fatores como viver certas experiências parecem aumentar o risco: exposição à violência ou crimes na comunidade, estar numa situação de sem-abrigo, ser migrante ou refugiado. Ou ainda desenvolver uma doença crónica ao longo da infância ou adolescência (diabetes, por exemplo) ou ter sobrevivido a uma doença crónica (cancro).
Mas há também aspetos psicológicos a considerar: fazer avaliações negativas de eventos de vida (de forma recorrente), o evitamento de situações (que perpetuam fobias), a baixa autoestima e o número de experiências traumáticas.
No trabalho, há que contar com outros fatores de risco. O baixo controlo sobre as tarefas a desempenhar, as exigências mentais, o bullying... Ou trabalhar mais de 40 horas semanais e a insegurança laboral contribuem para as perturbações de ansiedade.
Mas, dentro de casa, também podem existir fatores que aumentem a perturbação: o historial de perturbações mentais na família, os conflitos familiares, o abuso e a negligência (emocionais, sexuais e físicos), o abuso de substâncias da mãe durante a gravidez, os estilos parentais (autoritarismo, disciplina inconsistente) e a violência doméstica (entre parceiros).
Que fatores nos protegem das perturbações da ansiedade?
Ter autoestima e resiliência (capacidade individual para fazer face às adversidades e de adaptação) altas, e usar estratégias de coping (esforços conscientes para gerir estímulos internos ou externos) adequadas, parecem ter um papel protetor contra a ansiedade. Outro fator relevante é a prática de atividade física.
As relações positivas entre pais e filhos, o apoio e a coesão familiar, a existência de um ambiente familiar positivo e o envolvimento parental parecem contribuir também para o aumento da resiliência. Ter uma ampla rede social e relações de qualidade com outras pessoas, o que inclui ter suporte social dos pares, tem também um impacto positivo na experiência de ansiedade.
Ao nível escolar ou laboral, ter um ambiente social de qualidade, ter emprego e, mais concretamente, ter supervisão e suporte tem um efeito protetor.
Há que contar, ainda, com fatores culturais e comunitários, como o acesso a espaços verdes na área de residência, também está associado a menor ansiedade.
O que causa as perturbações de ansiedade?
As perturbações de ansiedade parecem resultar da interação complexa entre vários fatores, como a vulnerabilidade genética e aspetos psicológicos e ambientais que interagem com situações de stresse ou trauma.
Fatores psicológicos
Pensamentos desajustados – interpretar acontecimentos neutros como perigosos ou ameaçadores, ou reagir de forma exagerada a eventos potencialmente stressantes – contribuem para um nível de ansiedade geral elevado. A interpretação das experiências é feita de forma seletiva, e enquadrada negativamente. Um dos pensamentos negativos mais salientes na ansiedade está relacionado com a sensação de falta de controlo, um estado de impotência devido à incapacidade de prever, controlar, ou obter os resultados desejados.
Fatores ambientais ou sociais
Durante a infância:
- práticas parentais (ambiguidade, superproteção);
- conflitos familiares;
- exposição a personalidades severas e inflexíveis nas figuras de referência (professores, por exemplo) e as experiências em contexto escolar (padrões académicos exigentes, influência de pares).
Os adultos têm de gerir possíveis sequelas de experiências anteriores. Ao mesmo tempo, enfrentam fontes adicionais de ansiedade relacionadas com a sua carreira, família, segurança, entre outros.
Na população mais velha, a ansiedade está altamente relacionada com as preocupações sobre sintomas físicos, alterações de saúde, medo de envelhecer e de morrer.
Tipos de perturbações de ansiedade
Existem diferentes tipos de perturbações de ansiedade, que diferem entre si nos tipos de estímulos ou situações que induzem medo ou ansiedade.
- Perturbação de ansiedade de separação: medo excessivo ou ansiedade em relação à ideia de haver uma separação do lar ou das figuras de vinculação, sendo que este estado de ansiedade excede o que pode ser esperado para o nível de desenvolvimento do indivíduo. Esta perturbação é mais prevalente em crianças, embora os adultos também possam apresentar estes sintomas.
- Mutismo seletivo: mais frequente entre crianças, que não falam por iniciativa própria, nem respondem quando se deparam em interação social, quer estas sejam com crianças ou adultos. Esta perturbação é frequentemente marcada por uma elevada ansiedade social;
- Fobia específica: o medo e a ansiedade sentidos estão circunscritos à presença de uma determinada situação ou objeto, o chamado estímulo fóbico (por exemplo, o medo de andar de avião ou de elevador). A reação deve diferenciar-se de medos normais e transitórios que ocorrem habitualmente na vida das pessoas;
- Perturbação de ansiedade social: ansiedade acentuada e intensa em situações sociais em que o indivíduo pode ser alvo de escrutínio por outros;
- Perturbação de pânico: ataques de pânico inesperados e recorrentes.
- Agorafobia: ansiedade intensa e marcada, que é desencadeada pela exposição real ou antecipada a uma vasta gama de situações (exemplo, utilização de transportes públicos ou estar em espaços abertos);
- Perturbação de ansiedade generalizada: experiência de ansiedade e preocupação excessivas sobre uma série de atividades e eventos do quotidiano;
- Perturbação de ansiedade induzida por substâncias/medicação: os sintomas surgem como efeito de uma substância (por exemplo, droga, medicamentos).
Qual o tratamento da ansiedade?
O tratamento com medicamentos e a psicoterapia são as duas formas de tratar as perturbações de ansiedade. Podem ser utilizadas em simultâneo.
Tratamento farmacológico
A ansiedade e o medo sentidos neste tipo de perturbações estão intimamente relacionados com a atividade de uma estrutura cerebral, a amígdala, e os circuitos cerebrais adjacentes. Entre outras funções, esta estrutura regula as nossas respostas emocionais a estímulos exteriores relevantes. Por isso, todas as opções farmacológicas atuam, de alguma forma, a esse nível. Os medicamentos recomendados são os ansiolíticos e os antidepressivos.
Ansiolíticos
Vulgarmente conhecidos como calmantes. São as chamadas benzodiazepinas, que se dividem em três grupos: ação curta (menos de 12 horas), ação intermédia (12-24 horas), e ação longa (mais de 24 horas). As primeiras são geralmente prescritas para a insónia e as outras duas são utilizadas para as perturbações de ansiedade (o alprazolam e o diazepam, por exemplo). O período de tratamento deverá ser o mais curto possível, entre oito e 12 semanas, devido aos efeitos adversos, como cefaleias, e ao seu potencial para criar habituação e sintomas de abstinência.
Antidepressivos
Existe uma sobreposição de sintomas entre as perturbações de ansiedade e as perturbações depressivas. Por isso, alguns antidepressivos também são usados para a ansiedade. E atuam, tal como os ansiolíticos, na amígdala cerebral, inibindo a recaptação de uma molécula conhecida como serotonina. Os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (SSRIs), como a sertralina, por exemplo, diminuem os sintomas de ansiedade, medo e preocupação.
Estes antidepressivos têm alguns efeitos adversos associados, como irritabilidade, insónias, disfunção sexual, e podem causar habituação. Daí que seja importante que o processo de descontinuação deva ser gradual e acompanhado por um médico. As pessoas com perturbações de ansiedade são particularmente sensíveis aos efeitos adversos dos antidepressivos, sobretudo na fase inicial, e até pode ocorrer um agravamento dos sintomas. Recomenda-se, por isso, que a dose inicial seja metade da que se prescreve para as perturbações depressivas.
A noradrenalina é outro neurotransmissor importante na regulação dos circuitos do medo e da preocupação. A sua atividade excessiva está na base de alguns dos sintomas centrais das perturbações de ansiedade (estado de hipervigilância, por exemplo). Outro grupo de antidepressivos são os inibidores de recaptação de serotonina-noradrenalina e funcionam ao aumentar os níveis de serotonina e norepinefrina e inibir a sua reabsorção pelo cérebro. Tal como os SSRI, também podem agravar sintomas de ansiedade de forma transitória, durante o início do tratamento. E têm, também, efeitos adversos.
Psicoterapia
A terapia mais eficaz para combater a ansiedade a este nível é a cognitiva-comportamental e centra-se na identificação, compreensão e mudança dos padrões de pensamento e comportamento. O objetivo é, antes de tudo, levar o paciente a uma compreensão mais profunda do problema. Neste tipo de terapia, o paciente está ativamente envolvido na sua própria recuperação, com sentido de autonomia, adquirindo e desenvolvendo ferramentas que serão úteis mesmo após o processo terapêutico.
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