Amphora Wine Day e Vila de Frades celebram o vinho de talha no Alentejo
"Entra uva, sai vinho" das talhas de barro. Em Vila de Frades, a arte da vinificação preserva técnicas com dois mil anos. Prove a autenticidade da terra ao som do cante alentejano. Teresa Caeiro, produtora das Gerações da Talha, e Pedro Ribeiro, enólogo da Herdade do Rocim, guiam-nos pelo território, a "capital do vinho de talha".

O cante alentejano fica na cabeça de quem visita, em novembro, Vila de Frades, concelho de Vidigueira, distrito de Beja. Ouvir uma moda alentejana com um copo de vinho, vinho que se bebe direto da talha, é uma prova imperdível. Pode sair e experimentar os sabores de outra adega. Vila de Frades tem adegas com provas dadas e garantia de autenticidade. Zé Galante, Justino Damas, Gerações da Talha, Luís Carapeto, Honrado, José Miguel Caeiro e Talha de Frades prometem experiências únicas.
Em todas as ruas e ruelas, cada portão esconde uma adega. No n.º 29 A da Rua de Lisboa, em Vila de Frades, são 50 as talhas da família de Teresa Caeiro, a produtora das Gerações da Talha. É a única mulher na terra que dá a cara por um projeto de vinho.

Amphora Wine Day no radar
Há quatro momentos de eleição para fazer a viagem a Vila de Frades, a pouco mais de duas horas de carro de Lisboa. No São Martinho, 11 de novembro; no sábado seguinte, 15 do mesmo mês, para o Amphora Wine Day, na Herdade do Rocim; no início de dezembro, para a feira Vitifrades; ou em qualquer altura do ano, fora da dita época alta aqui na terra.
Esta é a sugestão de Teresa, que quer dar a conhecer a tradição, engarrafando o vinho e levando-o além-fronteiras. A DECO PROteste experimentou todas as fórmulas. O frenesim começa a 11 de novembro, ao provar o vinho da vindima mais recente. Mas, no Amphora Wine Day, a vila é invadida por uma multidão de turistas e produtores.
Teresa Caeiro, guardiã de uma herança viva
Em Vila de Frades, o tempo marca-se pelo ciclo das vindimas e pelo barro das talhas que guardam séculos de saber. Teresa é uma das referências mais jovens e o ícone de uma nova vaga de produtores de vinho de talha.

Com raízes profundas em Vila de Frades, aposta na sustentabilidade e na exportação do vinho. Recorda a adega dos pais, construída há três décadas, como ponto de encontro à volta da lareira. O vinho acompanhava jantares de amigos, trabalhadores e família. "A primeira memória que tenho é o som do vinho a correr da talha e o crepitar da lareira."
O avô, Arlindo Ruivo, foi decisivo. Com ele, acompanhou vindimas e aprendeu práticas tradicionais. Nos primeiros anos, observou e absorveu, sem alterar nada.
O verão que mudou tudo
Numa fase de transição, insatisfeita com o curso de Engenharia de Minas, em Lisboa, Teresa regressou a Vila de Frades. Reencontrou-se com o vinho e percebeu que fora da região quase ninguém conhecia o vinho de talha.
Em 2018, ingressou no mestrado em Viticultura e Enologia. Um ano depois, nasceu o projeto Gerações da Talha, com nome e identidade própria. Só nos últimos dois anos conseguiu afirmar plenamente a sua visão.
Hoje, o objetivo é transformar as vinhas em produção biológica, com a meta de chegar ao biodinâmico. "O vinho de talha é natural por excelência: não leva leveduras adicionadas, estabilizantes ou filtragens artificiais, apenas uma pequena dose de sulfitos antes de engarrafar."
Barro molda a identidade
O vinho de talha perdeu protagonismo há seis décadas, com a industrialização e as adegas cooperativas. Vila de Frades resistiu graças ao autoconsumo: cada família mantinha duas ou três talhas "em segredo", garantindo a continuidade.
Hoje, "alguns produtores têm 30 a 40 anos, mas quase não há jovens de 20 a iniciarem-se". Ainda assim, o movimento de resgate da talha cresce. Para Teresa, o barro é determinante. A forma arredondada, "como a barriga de uma grávida", cria correntes internas que influenciam a fermentação e dão frescura. A talha mais antiga em uso, "a avozinha", data do século XVII.
Talhas renascem no São Martinho
O 11 de novembro é o momento mais aguardado. É vivido em festa, com música e cozido de grão, nas adegas. "O visitante não procura só provar vinho. Quer uma experiência cultural", alerta.
Teresa não aceita propostas para abrir grandes pavilhões, nem para receber grupos de autocarro. Prefere visitas pequenas, de contacto direto e genuíno. "O objetivo é combater a sazonalidade, criar emprego estável e valorizar os pequenos produtores."
O futuro passa por manter o enraizamento em Vila de Frades e levar o vinho de talha a novos mercados (Bélgica, Estados Unidos e Japão). Representa a nova geração do vinho de talha: jovens, determinados e conscientes de que a tradição só sobrevive se for comunicada e valorizada. "Este vinho é o nosso ourinho. Queremos que brilhe, cá dentro e lá fora. Temos de o proteger", remata.
O vinho de talha representa a herança de uma cultura que sobreviveu graças ao autoconsumo e ao amor pela terra. Cada garrafa conta uma história de resistência.
Pedro Ribeiro com revelação em Nova Iorque
A voz de Teresa junta-se à de Pedro Ribeiro, enólogo da Herdade do Rocim, "na defesa" do Alentejo. Explorador de territórios e provocador, ambiciona devolver o charme à região. Resgatou a tradição, transformou-a em motor de inovação e tornou o Alentejo referência mundial no vinho de talha. Aposta na sustentabilidade, no marketing transversal e na cultura de luxo que falta a Portugal.

A ligação ao vinho de talha nasceu em 2009. "Os enólogos tinham embaraço e vergonha deste vinho", recorda Pedro Ribeiro. No regresso de Nova Iorque, ao lado de sommeliers que procuravam vinhos com história, percebeu o potencial: "O vinho de talha tem uma densidade histórica incrível. Não precisamos de inventar nada. Está tudo cá. No fundo, foi desempoeirar e contar a história para o mundo." Pedro Ribeiro encontrou no vinho de talha um património cultural e sensorial único, capaz de posicionar o Alentejo no mapa do vinho mundial.
Vinho de talha como expressão do território
Na Herdade do Rocim, fundada em 2007, o vinho de talha é feito com castas tradicionais, como Mureta, Trincadeira ou Tinta Grossa, em contraste com a imagem de vinhos alentejanos concentrados e alcoólicos. "Isto é o vinho do Alentejo, feito com método ancestral e uvas da região", explica.
Com teores alcoólicos mais baixos, estes vinhos exigem educação do paladar. "São diferentes, mais selvagens. Precisam de exposição e contexto para serem apreciados." O enólogo reconhece que o paladar precisa de ser educado. Nos primeiros anos, pediu à equipa comercial que não oferecesse o vinho a toda a gente: "Só se pedirem para provar. É um vinho que precisa de contexto."
Sustentabilidade em toda a linha
Todos os vinhos da Herdade do Rocim são produzidos sob o Programa de Sustentabilidade dos Vinhos do Alentejo, certificação única em Portugal e rara no mundo. "É um selo de diferenciação. Abrange a cadeia da vinha à adega, e é reconhecido internacionalmente." Para o consumidor, significa qualidade, respeito ambiental e impacto positivo na região.
Marketing não é inimigo da tradição
Pedro Ribeiro recusa preconceitos. Comunicar bem é parte do processo criativo e produtivo. "E quando alguém o faz bem, dizem que é demasiado marketing. Mas o marketing é transversal. Faz parte da enologia, da viticultura, da logística." Na Herdade do Rocim, o marketing não é um departamento. A atitude começa na vinha e termina na mesa.
Em 2018, Pedro criou de raiz o Amphora Wine Day, um evento inteiramente dedicado aos vinhos de talha e de ânfora. "Tinha sempre dificuldade em trazer pessoas à herdade. Perguntei: o que posso fazer para atrair gente?"
O Amphora Wine Day nasceu dessa ambição. Em 2018, recebeu 700 visitantes na primeira edição. Em 2024, bateu o recorde com 1700 participantes. Símbolo de partilha e inovação, é um dos maiores eventos de vinho reunindo produtores, consumidores e amantes de vinho de todo o mundo. Além de promover o vinho, dinamizou a economia da região: hotéis, restaurantes e produtores locais beneficiam de um fim de semana de referência no calendário nacional do vinho.
Inovar dentro e fora da talha
Pedro Ribeiro distingue vinho de talha e vinho de ânfora. O primeiro está protegido como designação exclusiva do Alentejo, com regras rígidas que garantem a autenticidade. O segundo permite liberdade criativa, variando o tipo de barro, espessura, tamanho e tempos de fermentação. "No vinho de talha, o espaço para inovação é menor, e ainda bem. Mas no vinho de ânfora, o céu é o limite."
Há espaço para afinar frescura, elegância e mineralidade. O vinho de talha representa 50 mil garrafas no universo de 1,5 milhões produzidas pela Herdade do Rocim, mas tem enorme impacto comunicacional. Com 65% da produção destinada à exportação (Alemanha, Brasil, EUA, Suíça e Angola), o Rocim continua a ser irreverente e consolida-se como clássico incontornável do vinho.
Olá, Cuba, Vila Alva e Vidigueira
O São Martinho e a castanha não têm de acabar em novembro. A oferta de alojamento é escassa, mas boa, mesmo que fique a 20 minutos. Se visitar Vila de Frades, explore o calor e as adegas de Cuba, Vila Alva e Vidigueira.
Não volte para casa de mãos a abanar. Traga uma caixa e até uns garrafões, para preservar a frescura. Ao apoiar pequenos produtores, humaniza o Interior.
Informações úteis
Em Vila de Frades, as adegas abrem portas no São Martinho e no fim de semana que se segue. O custo mínimo da viagem a dois, de 11 a 16 de novembro, é de 275 euros. Inclui alojamento em casa de férias, para Vila de Frades e área envolvente (até 15 quilómetros).
A alojamento em turismo rural, com pequeno-almoço, custa um mínimo de 375 euros para o mesmo período. Os preços foram recolhidos online a 3 de outubro. A Vitifrades, de 5 a 7 de dezembro, é outra oportunidade para provar o vinho. Se gostar, marque já o quarto para 2026.
Amphora Wine Day, 8.ª edição, Herdade do Rocim
O bilhete online custa 24,50 euros. A 15 de novembro, no local, custa 29,50 euros. O programa inclui a prova de vinhos de 40 produtores de Portugal, Espanha, França, Itália, Chile e Geórgia, a abertura das talhas na Herdade do Rocim, cante alentejano e a Amphora Wine Talks sobre a promoção dos vinhos de ânfora.
Nuno de Oliveira Garcia, da revista Grandes Escolhas, será o moderador. Oradores confirmados: Jamie Goode, João Soares, Jenia Nikolaichuk e Agathe Plantade. No terraço, chefs convidados dão a provar as suas criações. Na loja, abundam ideias para presentes de Natal e para recordar.
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