Dieta rica em lípidos não melhora o desempenho no treino de resistência
Aumentar a proporção de gorduras na dieta e reduzir o consumo de hidratos de carbono para melhorar o desempenho desportivo é uma estratégia nutricional que tem cada vez mais adeptos. No entanto, o impacto no organismo pode não ser o mais desejado.

Os lípidos, tal como os hidratos de carbono, são um nutriente que fornece energia. Por esse motivo, alguns praticantes de desporto têm optado por aumentar a proporção de gordura na dieta e por reduzir o aporte de hidratos de carbono para, assim, aumentar as reservas de triglicéridos intramusculares, melhorar o desempenho no exercício físico e manter as reservas de glicogénio. Será mesmo assim? Serão os lípidos mais eficazes do que os hidratos de carbono a fornecer energia e a promover um melhor desempenho durante o treino de resistência?
O que são lípidos?
Os lípidos, ou gorduras, provenientes da nossa alimentação são constituídos por cadeias longas de hidrocarbonetos, insolúveis em água. Estes são incorporados no tecido adiposo presente no nosso organismo sob a forma de triglicéridos, cabendo-lhes funções como o fornecimento de energia e o auxílio na manutenção da temperatura corporal. Fazem ainda parte da estrutura do colesterol, das vitaminas lipossolúveis (A, D, E e K), do tecido nervoso e das membranas das células.
Existem vários tipos de lípidos, dependendo do tipo de saturação: os ácidos gordos saturados; os ácidos gordos monoinsaturados; e os ácidos gordos polinsaturados. O seu papel no organismo também é diferente. Quando consumidos em excesso, os ácidos gordos saturados podem ter um impacto negativo na saúde cardiovascular (por exemplo, aumento do risco de enfarte do miocárdio). Os ácidos gordos mono e polinsaturados, por outro lado, promovem efeitos mais protetores na saúde cardiovascular.
Que alimentos são ricos em lípidos?
Os ácidos gordos saturados encontram-se, sobretudo, em alimentos como a manteiga, os queijos gordos e os produtos de charcutaria, como chouriços ou salsichas. Já os ácidos gordos monoinsaturados podem ser encontrados no azeite, no óleo de amendoim e no abacate. Nos ácidos gordos polinsaturados encontram-se os ómega-3 e ómega-6, considerados ácidos gordos essenciais, uma vez que o nosso organismo não consegue produzi-los e tem de os obter a partir da alimentação. Estes ácidos gordos são importantes pelo seu papel no processo anti-inflamatório do organismo, na regulação do sistema nervoso, na pressão sanguínea e, ainda, por aumentarem a fluidez das membranas celulares. Estes podem ser obtidos através de alimentos como óleos vegetais, oleaginosas (amêndoas, nozes ou cajus), sementes e peixes gordos (sardinha, cavala, salmão).
Qual o impacto dos lípidos no desempenho desportivo?
Alguns estudos têm tentado avaliar a eficácia de uma dieta rica em lípidos – em que estes representem cerca de 70% do valor calórico total – na melhoria do desempenho no treino de resistência, como a corrida ou a bicicleta. Os resultados revelaram um aumento da oxidação (destruição para obtenção de energia) dos lípidos, principalmente durante o esforço. Além disso, verificou-se que a utilização da gordura pelo organismo se mantinha mesmo após o consumo de hidratos de carbono e restabelecimento das reservas de glicogénio muscular. Outra das descobertas destes estudos é que é necessária uma adaptação do organismo a este tipo de dieta, tal como acontece com a ingestão de fontes de hidratos de carbono.
A descoberta mais importante, contudo, é que a ingestão elevada de lípidos na dieta parece não aumentar o desempenho desportivo em intensidades relevantes e pode, inclusive, levar a um aumento de complicações gastrointestinais, como esteatorreia (presença de gordura nas fezes). Estes estudos evidenciaram, ainda, uma diminuição da atividade da enzima piruvato desidrogenase, com uma consequente diminuição da oxidação de hidratos de carbono para a produção de energia, o que pode ser limitante em treinos mais intensos e que exijam maior fornecimento de energia ao organismo. Recomenda-se, por isso, que a ingestão de gordura para quem pratica exercício físico com alguma intensidade e resistência não ultrapasse os 30% do valor calórico total da dieta, valor que coincide com as recomendações para a população em geral.
Importa também lembrar que, de acordo com vários estudos, a diminuição da ingestão de hidratos de carbono em atletas que fazem treinos de elevada intensidade ou resistência parece provocar uma maior sensação de fadiga precoce, irritabilidade, dificuldade de concentração, falta de motivação para treinar e maior dificuldade em recuperar entre treinos. Por este motivo, os hidratos de carbono devem ser a principal fonte de combustível para a prática de exercício físico e devem ser repostos periodicamente para garantir um melhor desempenho desportivo.
O que comer antes, durante e após o treino?
A prática desportiva de alguma intensidade exige planeamento das refeições antes, durante e após o treino.
O que comer antes do treino
As refeições antes do treino devem reforçar as reservas energéticas, principalmente as reservas de glicogénio, e preparar o atleta para o esforço. O consumo de alimentos com algum teor de gordura é desaconselhado, uma vez que estes podem causar distúrbios gastrointestinais, nomeadamente atraso no processo de digestão, aumento da motilidade intestinal ou sensação de enfartamento, e reduzir a absorção de outros macronutrientes importantes como os hidratos de carbono.
O que comer durante o treino
Durante o treino, a alimentação deve ajudar a manter os níveis de glicémia estáveis e, como tal, são necessários alimentos que forneçam energia de absorção rápida, como os hidratos de carbono de absorção rápida: por exemplo, sob a forma de géis ou marmelada.
O que comer depois do treino
No período após o treino, a alimentação deve ajudar o organismo a repor a energia que foi consumida durante o treino e a reparar a massa muscular. Para isto contribuem, sobretudo, alimentos ricos em proteínas de alto valor biológico, tais como o leite, os ovos, a carne e o peixe, assim como alimentos ricos em hidratos de carbono, como a batata cozida. A ingestão de alimentos ricos em ácidos gordos essenciais (como o ómega-3) nesta fase de recuperação também pode contribuir para reduzir o processo inflamatório decorrente da prática de exercício físico. Consumir um peixe gordo, como o salmão, pode ser uma boa opção, uma vez que é uma fonte de proteína e de ómega-3. Pode, ainda, juntar umas amêndoas à refeição.
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