Como é determinada a perda total?
A lei estipula uma fórmula para determinar a perda total de um automóvel, após um sinistro, que é a seguinte:
Valor de reparação + Valor do salvado é igual ou superior ao valor venal do veículo antes do sinistro.
- Valor da Reparação: o custo estimado para a reparação de todos os danos no veículo. A seguradora solicita uma peritagem para determinar o montante necessário à reparação.
- Valor do Salvado: o valor que o veículo danificado ainda tem no mercado. Este valor pode ser apurado através de leilões especializados ou através de uma avaliação técnica.
- Valor Venal: o valor de mercado do veículo antes do sinistro, também conhecido como valor de substituição. Este é o preço que o segurado teria de pagar para comprar um veículo semelhante em idade, estado e características.
Se o custo de reparar o veículo, somado ao valor do salvado for igual ou superior ao valor do veículo antes do sinistro, então a seguradora declara a perda total. E opta por pagar uma indemnização em dinheiro ao segurado em vez de financiar uma reparação que considera economicamente desfavorável.
As seguradoras usam a regra estrita "igual ou superior", ou há alguma margem?
Sim, aplicam uma margem, que depende da idade do automóvel e segue as diretrizes da Autoridade de Supervisão de Seguros e Fundos de Pensões (ASF).
- Veículos com menos de 2 anos: a seguradora considera a perda total quando a soma do custo de reparação mais o valor do salvado ultrapassa 100% do valor venal do veículo antes do sinistro.
- Veículos com mais de 2 anos: a perda total é declarada quando a soma do custo de reparação mais o valor do salvado ultrapassa 120% do valor venal.
Veja os exemplos em baixo.
Como é calculada a indemnização a pagar ao segurado
A forma como a indemnização é apurada e paga depende da decisão do proprietário relativamente ao veículo danificado (o salvado). Há duas opções.
O segurado fica com o salvado
Neste cenário, o segurado opta por ficar com o veículo danificado. A indemnização a ser paga pela seguradora será o valor venal do veículo menos o valor do salvado. O veículo danificado continua a pertencer ao segurado, que pode vendê-lo, repará-lo ou dar-lhe outro destino.
A seguradora fica com o salvado
Neste caso, o segurado entrega o salvado à seguradora ou a uma entidade por ela indicada. Se a viatura for para abate, a seguradora procede ao cancelamento da matrícula junto do Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), e a indemnização a ser paga ao segurado é o valor total do valor venal do veículo.
EXEMPLOS PRÁTICOS DO CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO
| Salvado com baixo valor |
| Dados do veículo |
| Valor venal (valor de mercado antes do sinistro): 10 000€ |
| Valor do salvado: 1000€ |
| Custo de reparação: 12 500€ |
| Decisão da seguradora = Perda Total |
| Justificação: 12 500 € + 1000 € = 13 500 € >10 000 € |
| Opção 1 do segurado |
| O segurado fica com o salvado |
| Valor venal – Valor do salvado = 9000 € e o veículo danificado
permanece na posse do segurado |
| Opção 2 do segurado |
| A seguradora fica com o salvado |
| Valor venal total = 10 000 € |
| Salvado com valor elevado |
| Dados do veículo |
| Valor venal (valor de mercado antes do sinistro):15 000 € |
| Valor do salvado: 6000 € |
| Custo de reparação: 14 500 € |
| Decisão da seguradora = Perda Total |
| Justificação: 14 500€ + 6000€ = 20 500€ > 15 000€ |
| Opção 1 do segurado |
| O segurado fica com o salvado |
| Quanto recebe de indemnização? |
| Valor venal – Valor do salvado = 9000€ e o veículo danificado permanece na posse do segurado |
| Opção 2 do segurado |
| A seguradora fica com o salvado |
| Valor venal total = 15 000€ |
| Veículo com menos de 2 anos |
| Dados do veículo |
| Valor venal (valor de mercado antes do sinistro): 22 000 € |
| Valor do salvado: 5000 € |
| Custo de reparação: 21 800 € |
| Decisão da seguradora = Perda Total |
Justificação: 21 800 € + 5000 € = 26 800 € > 22 000 €
A seguradora considera que há perda total quando o custo da
reparação, somado ao valor do salvado, é superior ao valor venal
do veículo antes do sinistro. |
| Opção 1 do segurado |
| O segurado fica com o salvado |
| Valor venal – Valor do salvado = 17 000 € e o veículo danificado permanece na posse do segurado |
| Opção 2 do segurado |
| A seguradora fica com o salvado |
| Valor venal total = 22 000 € |
| Veículo com mais de 2 anos |
| Dados do veículo |
| Valor venal (valor de mercado antes do sinistro): 10 000 € |
| Valor do salvado: 2000 € |
| Custo de reparação: 9000 € |
| Decisão da seguradora = Não declara perda total |
Soma da reparação e salvado: 11 000 €
Limite para considerar perda total (120% do valor venal): 12 000 € |
Como 11 000 € é inferior a 12 000 €, a seguradora não declara perda
total, considerando a reparação economicamente viável. |
Salvado com pouco valor comercial ou de valor elevado: o que compensa mais?
A resposta depende sobretudo de três fatores principais: o estado real do veículo, o valor atribuído ao salvado e as intenções futuras do proprietário (reparar, vender, ou simplesmente encerrar o processo).
| O que compensa mais? |
Entregar o salvado à seguradora (o mais comum) |
Ficar com o salvado (pode valer a pena) |
| O valor do salvado é baixo, mas o veículo mantém um valor potencialmente interessante se for reparado ou vendido em peças. |
O carro tem danos reparáveis e o segurado dispõe de meios próprios para o reparar a baixo custo. |
| O carro tem valor sentimental ou
histórico (veículo clássico, por exemplo). |
O valor do salvado é baixo, mas o veículo mantém um valor potencialmente interessante se for reparado ou vendido em peças. |
| Quer revender o carro em segunda mão, após reparação, obtendo um valor superior ao deduzido pela seguradora. |
O carro tem valor sentimental ou histórico (veículo clássico, por exemplo). |
Em regra, especialmente quando os danos são severos ou o valor de reparação é elevado,
entregar o salvado à seguradora é a opção mais segura e prática.
Contudo, ficar com o salvado pode compensar em situações específicas, sobretudo,
se o proprietário conseguir reparar o veículo por sua conta ou considerar que o carro tem um valor comercial residual superior ao estimado pela seguradora.
O segredo está em avaliar bem o orçamento para a reparação do veículo antes de decidir.
Em alguns casos, essa informação permite negociar com a seguradora ou ajudar a comprovar que o carro ainda tem utilidade real.
E depois de declarada a perda total?
O segurado tem três opções.
- Aceitar a proposta da seguradora: concordando com a avaliação do valor venal e do salvado, o proprietário aceita a proposta de indemnização da seguradora, escolhendo entre as duas opções de cálculo mencionadas acima.
- Negociar os valores: o segurado pode discordar da avaliação da seguradora, tanto em relação ao valor venal como ao do salvado. Nestes casos, tem o direito de contestar os valores apresentados e apresentar provas do que considera ser o valor de mercado justo do veículo, tentando assim negociar uma indemnização mais justa. Ter guardado faturas e registos de manutenção do carro pode ajudar.
- Contestar a decisão: se o segurado não concordar com a decisão de perda total, pode argumentar que a reparação é viável e segura. Mas, novamente, terá de ter argumentos fundamentados e provas que atestem que a decisão da seguradora não é a mais correta. Pode, por exemplo, pedir uma segunda peritagem com um perito independente. Em baixo, nas Perguntas Frequentes, estão elencadas as possíveis formas de contestação da decisão da seguradora.
E se a culpa…?
E se a culpa do acidente que levou à perda total do veículo for do proprietário, mas este tiver seguro de danos próprios?
A seguradora ou indemniza pelo valor venal total (o capital seguro), e fica com o veículo sinistrado, ou o segurado fica com o salvado, recebendo de indemnização o valor venal menos o salvado.
E se o culpado do acidente não tiver seguro automóvel válido?
O responsável é sempre obrigado a indemnizar. No entanto, não havendo seguro válido, o Fundo de Garantia Automóvel (FGA) pode ser chamado a intervir em nome lesado. E pode acontecer uma de duas situações:
Responsável Conhecido (sem seguro válido)
Se o responsável pelo acidente for identificado, mas não tiver seguro válido, o FGA cobre os danos materiais causados, independentemente de haver ou não danos corporais. Em caso de perda total, pode haver lugar a indemnização pelo valor venal do veículo, mas o processo será demorado e exigente, e dependerá do que for apurado.
Responsável Desconhecido (e fuga)
Se o responsável pelo acidente for desconhecido (não identificado), o FGA só cobre os danos materiais, incluindo perda total, se o acidente também tiver causado danos corporais significativos.
E se a culpa do acidente que danificou seriamente o veículo não for do seu proprietário, este é obrigado a contactar a própria seguradora?
É altamente recomendável que o faça sempre. O primeiro dever é sempre participar o sinistro. Até por causa do sistema de Convenção de Indemnização Direta (CID), um mecanismo acordado entre seguradoras, em Portugal, que permite acelerar o processo de indemnização nos acidentes automóveis sem feridos graves e em que a responsabilidade está claramente atribuída. Mesmo quando a seguradora do culpado assume o processo, a seguradora do lesado pode:
- acompanhar o processo;
- acionar a cobertura de danos próprios para acelerar a resolução;
- exercer posteriormente o direito de regresso (acerto de contas entre seguradoras ou entre seguradoras e pessoas responsáveis por acidentes).