Rastreio do cancro do pulmão: um projeto-piloto para salvar vidas
O projeto-piloto destina-se a detetar mais cedo um dos cancros que mais matam em Portugal. Saiba quem é elegível, onde irá decorrer e como serão os procedimentos.
O cancro do pulmão, além de ter uma elevada taxa de mortalidade, em muitos casos, só é detetado quando já está numa fase avançada. Segundo dados da Organização Mundial da Saúde, em Portugal, é o terceiro cancro com maior incidência, entre os homens, e o quarto, entre as mulheres. Mas, nos homens, é o cancro com maior mortalidade, tendo sido responsável por 3686 óbitos, em 2022.
Em julho de 2025, foi publicada uma orientação da Direção-Geral da Saúde (DGS) com informação sobre os projetos-piloto, e anunciados dois locais para o rastreio do cancro do pulmão. Com início previsto para o primeiro trimestre de 2026, aqueles serão implementados pela Unidade Local de Saúde de Santo António, no Porto, e pela Câmara Municipal de Cascais.
A quem se destina?
Segundo a orientação da DGS, o projeto-piloto de rastreio destina-se a quem apresenta risco elevado de desenvolver cancro do pulmão. Neste sentido, irá abranger pessoas entre os 55 e os 74 anos que sejam, ou tenham sido há menos de dez anos, grandes fumadores. Para tal, considerou-se o consumo médio anual de um maço de tabaco (20 cigarros) por dia. A DGS definiu ainda critérios de exclusão.
| Critério | Descrição |
|---|---|
| Faixa etária | 55 a 74 anos |
| Histórico de consumo de tabaco | Fumadores de, em média, 20 cigarros por dia, durante um ano; ex-fumadores há dez anos ou menos, com uma média diária de 20 cigarros |
| Exclusões | Definitiva: diagnóstico prévio de cancro do pulmão; Temporária: diagnóstico prévio de outro cancro maligno há, pelo menos, três anos; infeção respiratória há menos de três meses; realização de tomografia computorizada (TC) torácica nos 12 meses anteriores; gravidez; primeiro teste de rastreio positivo, mas desistiu ou não completou o plano de diagnóstico ou o tratamento; desistência, através de comunicação formal |
| Recomendações adicionais | O rastreio deve integrar programas de cessação tabágica e aconselhamento personalizado, sempre que possível |
O rastreio inicial consiste numa tomografia computorizada do tórax de baixa dose (TCBD), um exame rápido e não invasivo. O exame será realizado nas unidades de rastreio do cancro do pulmão, que, no Porto e segundo a ULS Santo António, irá funcionar no Hospital Magalhães Lemos. Já em Cascais, de acordo com a autarquia, pretende-se usar um camião com todos os equipamentos, que irá circular pelas localidades do concelho.
O que acontece após o exame?
O resultado da tomografia pode ser negativo, positivo ou inconclusivo:
- se negativo, o exame é repetido passado um ano;
- se positivo, a pessoa será referenciada para uma consulta, que deverá ocorrer no prazo de 30 dias, para que seja feito um diagnóstico;
- se inconclusivo, o exame deverá ser repetido assim que possível.
Os resultados do exame serão sempre comunicados à pessoa e ao médico de família, ou ao diretor clínico para os cuidados de saúde primários, no caso de utentes sem médico atribuído. Os projetos-piloto irão ainda promover a cessação tabágica, o que pode incluir consultas para o efeito. De facto, deixar de fumar é a forma mais eficaz de prevenir o cancro do pulmão.
O que esperar do rastreio?
Com o projeto-piloto, a DGS espera obter vários indicadores. Estes irão ajudar a testar, em contexto real, a viabilidade de um programa nacional, que permita detetar a doença numa fase precoce, ou seja, quando ainda é possível tratá-la com sucesso.
A relação custo-eficácia do rastreio é ainda muito influenciada pela disponibilização simultânea de serviços e medicamentos para a cessação tabágica. Apesar dos benefícios, o rastreio do cancro do pulmão não está isento de riscos e limitações.
O projeto-piloto de rastreio do cancro do pulmão é um passo importante para testar um modelo de saúde que pode salvar vidas, todos os anos. O sucesso dependerá da capacidade de envolver a população elegível e de conseguir diagnósticos precoces em articulação com outros serviços.
Opinião de duas associações ligadas ao cancro do pulmão
A Pulmonale, Associação Portuguesa de Luta Contra o Cancro do Pulmão, é uma associação sem fins lucrativos que presta aconselhamento e apoio a pessoas que sofrem de cancro do pulmão e aos respetivos familiares. Também promove a melhoria e o alargamento dos cuidados médicos e a difusão de informação sobre a doença junto do público, entre outras atividades.
Desde 2000, que o Grupo de Estudos do Cancro do Pulmão (GECP) procura promover e dignificar o exercício da oncologia pulmonar e a melhoria da qualidade dos serviços de saúde prestados aos doentes. Para tal, desenvolve, coordena e estimula a investigação clínica nesta área; aconselha e apoia os doentes com doença oncológica torácica; e realiza e coopera na formação de todos os que se dedicam ao estudo, diagnóstico e tratamento do doente com cancro do pulmão.
Pulmonale defende que o rastreio é fundamental
Isabel Magalhães, presidente da Pulmonale, defende que o rastreio do cancro do pulmão é fundamental para alterar o paradigma atual desta doença. De facto, permite diagnósticos numa fase inicial, reduzindo em cerca de 20% a mortalidade associada à patologia. Nos países onde ainda não existe um programa de rastreio nacional, como Portugal, recomenda-se começar com projetos-piloto e avançar, posteriormente, para o resto do País.
Quando implementados de modo correto, e desde que seja feito o seguimento e/ou o tratamento atempado dos resultados positivos detetados nos exames, os projetos-piloto apresentam resultados relevantes. E é o que se espera que aconteça em Portugal, apesar de Isabel Magalhães considerar que o projeto-piloto já deveria estar no terreno, pois a sua inexistência continua a acarretar custos, não só para quem tem a doença, como também para o SNS, com o tratamento de situações em fase avançada. Em 2022, a Pulmonale definiu, em conjunto com um painel multidisciplinar de especialistas, um projeto-piloto de rastreio que apresentou a sucessivos governos.
Por isso, espera que, apesar do atraso face a inúmeros países, o Executivo avance com o projeto anunciado, nos prazos divulgados, e assegurando todos os requisitos.
Para a GECP, o rastreio é essencial para combater o cancro
De facto, serão necessários recursos humanos qualificados, que envolvam equipas multidisciplinares. Do ponto de vista tecnológico, o programa requer equipamentos, sistemas de armazenamento e análise de imagem e infraestruturas informáticas seguras, que garantam a integração, a confidencialidade e a partilha de dados. Será ainda indispensável o recurso a ferramentas de inteligência artificial.
Relativamente aos achados positivos ou suspeitos de cancro do pulmão, estes requerem integração num circuito de diagnóstico de cancro de pulmão que garanta o cumprimento dos prazos adequados para a realização dos exames necessários, assegurando o início atempado do tratamento. A avaliação e o acompanhamento das implicações dos achados incidentais encontrados na TCBD, não relacionados com cancro do pulmão, exigem protocolos claros, para evitar ansiedade desnecessária ou carga extra para o sistema.
Outro aspeto essencial é uma comunicação eficaz com a população. A adesão dos cidadãos, o seu conhecimento dos riscos e benefícios do rastreio e a decisão partilhada com o profissional de saúde serão fatores críticos. Os centros selecionados para projetos-piloto deverão garantir todos estes recursos, bem como o acesso e a colaboração de todos os intervenientes necessários.
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