Não o deixam pagar com notas e moedas? Pagamento em dinheiro não pode ser recusado
Há festivais de música, zonas de restauração em locais de comércio e até padarias que já só aceitam pagamentos em multibanco ou MB Way. Mas, em Portugal, os pagamentos em dinheiro vivo podem ser recusados?
- Especialista
- Magda Canas
- Editor
- Ana Rita Costa e Ana Santos Gomes

A desmaterialização do dinheiro é uma tendência, sobretudo depois da pandemia, e são cada vez mais os espaços comerciais que avisam que não aceitam pagamentos em numerário. Mas é admissível recusar pagamentos em notas e moedas?
Num post numa rede social, a organização do MEO Marés Vivas, festival de música que se realizou em julho, anunciou que os bares dentro do recinto não aceitavam pagamentos com dinheiro vivo. Em alternativa, o festival disponibilizava opções de pagamento como o multibanco, o MB Way ou um cartão do próprio festival. Os consumidores podiam carregar este cartão com o numerário que quisessem,"num posto de carregamento devidamente identificado dentro do recinto".
Usar dinheiro no Time Out Market tem um custo de 1,50 euros
Mas a organização do MEO Marés Vivas não foi a única a decidir deixar de aceitar pagamentos em dinheiro. O Time Out Market, o espaço de restauração do Mercado da Ribeira, em Lisboa, também não aceita pagamentos em numerário. Para pagar, os consumidores têm de usar cartões de crédito ou de débito ou o MB Way. Já quem quiser pagar com dinheiro naquele espaço tem de o converter num cartão — TOM Card — que depois só pode ser usado nos espaços de restauração do Time Out Market. Este cartão custa 1,50 euros e pode ser comprado e carregado na Time Out Shop. Se o montante carregado não for gasto na totalidade, o consumidor tem um ano para o trocar por bens e serviços naquele espaço. Caso contrário, não pode voltar a trocá-lo por numerário.
Contactado pela DECO PROTESTE, o Time Out Market explica que tomou a decisão de não aceitar pagamentos em numerário durante a pandemia, por motivos de "segurança e higiene/saúde pública". Os responsáveis pelo espaço dizem que, após esse período, "não fazia sentido descontinuar uma política que protege a saúde". Além disso, afirmam que "o transporte do dinheiro para o banco no final dos turnos era uma operação sempre delicada" e que "a desmaterialização do dinheiro veio resolver este problema", acrescentando que "a fiscalidade" é outra das vantagens, porque "todas as operações ficam registadas através dos cartões".
Comerciantes têm de aceitar notas e moedas
Embora Portugal esteja entre os países da zona euro onde a utilização de dinheiro físico mais diminuiu entre 2019 e 2022 — de acordo com o estudo SPACE, do Banco Central Europeu (BCE) —, os comerciantes não podem recusar pagamentos em numerário.
As notas e moedas têm de ser aceites em todas as transações realizadas em território nacional, independentemente da sua natureza. Mesmo que o comerciante afixe ou divulgue avisos a indicar que os pagamentos em numerário não são aceites, em princípio, a recusa não é admissível, salvo se for invocada alguma razão legítima.
A DECO PROTESTE lembra que é importante acautelar os interesses de todos os consumidores, nomeadamente daqueles que não têm um cartão bancário ou um meio de pagamento eletrónico. Disponibilizar um cartão, que é pago, aos consumidores que queiram fazer pagamentos em numerário, é uma forma de tratamento desigual entre os consumidores que usam meios de pagamento eletrónicos e cartões de pagamento, e os outros, que preferem usar dinheiro físico. A organização de defesa dos consumidores sublinha que, por mais que seja importante acompanhar as novas tendências, há regras que têm de ser cumpridas.
Ainda assim, a lei não prevê qualquer sanção para os comerciantes que recusem os pagamentos com notas e moedas.
Dinheiro deve ser proporcional ao valor a pagar
Embora, regra geral, o pagamento em numerário tenha de ser aceite pelos comerciantes, a lei prevê algumas situações em que o pagamento com notas e moedas pode ser recusado, por exemplo:
- quando o valor da nota apresentada não é proporcional à despesa que está a ser paga;
- quando há acordo entre comerciante e consumidor em usar outro meio de pagamento;
- quando o valor a pagar ultrapassa os 3000 euros ou o seu equivalente em moeda estrangeira;
- em pagamentos superiores a 10 000 euros, feitos por cidadãos não residentes, desde que não atuem em representação de pessoa coletiva;
- em pagamentos de impostos de montantes superiores a 500 euros;
- em pagamentos únicos com mais de 50 moedas. Neste caso, só o Estado ou o Banco de Portugal são obrigado a aceitá-las.
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