Notícias

Tiago Ramos: "O YouTube não é uma plataforma de vídeos, é uma plataforma de relações"

"Desfrutar da tecnologia, melhorar o dia-a-dia" é o lema de Tiago Ramos. Descubra como o YouTube mudou a sua vida e o que está na base do sucesso do seu canal de vídeos, com 215 mil subscritores.

18 novembro 2022
entrevista ao youtuber Tiago Ramos

4See/Ricardo Castelo

Tiago Ramos, de 31 anos, vive em Vila Nova de Gaia e tem um canal de YouTube com quase 215 mil subscritores. Falta-lhe apenas um ano de cada um dos três cursos que começou: Engenharia Eletrotécnica, Engenharia Mecânica e Engenharia Informática.

Apaixonado por tecnologia e por escrita, começou por criar um blogue, na sequência de uma conversa com um amigo sobre "o que era melhor: o Windows — software da Microsoft — ou o Mac — software da marca Apple?" Com o sucesso do blogue, começou a fazer crítica e análise a produtos tecnológicos específicos. Em 2013, experimentou fazer a sua análise habitual, mas em vídeo, e publicou no YouTube. "O vídeo teve três vezes mais tração", contou Tiago, confessando que se foi apercebendo de que as pessoas preferiam o vídeo ao texto. A partir daí, nunca mais parou e, desde 2017, gere o seu canal de YouTube a tempo inteiro: "Estive um ano a construir um excel de prós e contras, para ver se não me escapava nada, e então decidi que os prós superavam e arrisquei. Passei de um vídeo por semana para sete, quando saí da faculdade." Foi, assim, ganhando visibilidade.

 
"O meu objetivo é criar uma comunidade", garante Tiago Ramos.

Quais os critérios que utiliza para escolher os produtos que apresenta?

Leio muitas notícias de tecnologia. Também leio muitos comentários. Portanto, é através dos comentários, das notícias, do que acho interessante, e também assuntos que noto, pela minha sensibilidade, que daria jeito às pessoas saberem.

Como é que os seus vídeos ajudam os consumidores a fazerem escolhas conscientes?

Tento fazer vídeos que eu próprio gostaria de ver, e faço-o de uma forma simples, como se fosse uma conversa de café. E é por isso que os meus vídeos são mais longos. Tenho bullet points em todos os vídeos, para saber que tópicos é que quero abordar. Depois, o tópico vai surgindo. E acho que é com essa genuinidade, de eu falar como falaria com um amigo, que as pessoas se identificam. Há pessoas que gostam mais da minha forma de falar, há outras pessoas que gostam mais da de outros canais. E acho que é muito bom haver essa diversidade para que as pessoas possam escolher o canal com que se identificam mais. Nem é a questão de estar errado; é, simplesmente, se a minha forma de falar vai cativar, ou não, as pessoas. E acho que está tudo bem. O que tento é ser o mais sincero possível. Não é um personagem que faço. E acho que as pessoas apreciam essa naturalidade.

Algo que aprendi é que o YouTube não é uma plataforma de vídeos, mas uma plataforma de relações. As pessoas, quando vão ver um vídeo no YouTube, não o veem pelo YouTube. Há 30 mil canais! Porque é que veem aquele canal? Porque gostam daquela pessoa. Há canais que eu sigo, em que o tema não me interessa, mas em que gosto da pessoa, da forma como explica. E, se calhar, até fico a saber de um tema que, de outra forma, não iria procurar. E cria-se aqui uma relação parassocial, em que um lado conhece muito bem o outro, e o outro lado nem sabe que o outro existe. É a questão de estar aqui a fazer vídeos, as pessoas conhecem-me, eu não consigo conhecer toda a gente, mas tento estar sempre a ler os comentários e a responder a todas as dúvidas.

O segredo de um bom vídeo é essa relação que cria com as pessoas? 

Em primeiro lugar, é difícil acertar. Nunca consigo prever o que vai correr bem ou o que vai correr mal. Eu próprio sou, ainda hoje, surpreendido. Para mim, as pessoas têm todas o mesmo valor. Há temas que vão agradar mais a mais pessoas: quando trago um Xiaomi novo, por exemplo. Se, por outro lado, há um tema que não vai afetar tanta gente, mas, ainda assim, continuo a achar que é importante, vou fazer na mesma o vídeo. O meu objetivo é ajudar as pessoas, sejam muitas ou poucas, para mim não interessa o número. E acho que isto é mesmo importante, saber que estou a falar com uma pessoa. E, quando vejo comentários positivos, a dizerem “Obrigado, Tiago, isto ajudou”, é extraordinário. E é isto que adoro, este espírito de comunidade que se cria, um espírito positivo. O meu objetivo é criar uma comunidade. Há coisas que explico a quem não sabe, mas as que não sei, por favor, digam-me nos comentários. E essa comunidade é fantástica. Por acaso, sou eu que estou a dar a cara, mas a ideia é o canal ser de todos. Mas aí não há uma receita: é o tema e a pessoa identificar-se com o tema.

Porquê o YouTube? Quais as vantagens e desvantagens?

Na altura, também não havia mais nada. Em 2013, era o YouTube, e não tinha a dimensão que tem hoje. Não ganhei nada durante três ou quatro anos. A primeira vez que ganhei alguma coisa foram 20 euros, acumulados de vários meses. É um processo de crescimento. E ninguém vai para o YouTube para ganhar dinheiro. Se vai, então vai desanimar pelo caminho. Ou se está mesmo por gosto, ou então vai ver que aquilo não dá. Tem de ser ao fim de algum tempo e muito esforço. Na altura, era isso que havia; hoje em dia, mesmo assim, continuo a preferir o YouTube, por causa da forma como se comunica. Por exemplo, vejo o TikTok como uma coisa mais fast food. Não no sentido pejorativo, mas a pessoa que vai num instante ao TikTok, ver um vídeo de 10 ou 15 segundos, não vai ao YouTube ver um vídeo de 15 minutos. É por isso que prefiro estar no YouTube: porque a mensagem que quero transmitir só funciona neste formato de vídeos mais longos, em que a pessoa está mesmo com disposição para ouvir e ver aquilo.

Não faz só vídeos de tecnologia, mas também sobre investimentos. Porquê? E como escolhe o tema do vídeo?

É por gosto, porque não consigo falar de um tema forçado – as pessoas iriam perceber logo. Comecei com este tema numa conversa com um amigo, porque tinha uma ideia completamente errada dos investimentos. Comecei a investigar sobre o tema e comecei a ficar surpreendido. Como vou escolhendo o tema? Duas formas: vou vendo o que está a acontecer no panorama geral do mundo e que temas é importante abordar. Vou vendo nos comentários o que as pessoas vão pedindo e vou também falando com a marca. Mas é dizer as coisas sem aqueles termos complicados. Quero as coisas simples, transparentes. Combater a desinformação com a informação. E parece tudo muito complicado, mas as coisas não são complicadas; têm é de ser explicadas. Quero dar-vos as ferramentas que o Tiago de 18 anos não tinha. E as pessoas contam com essa transparência.

Ao longo dos anos, o feedback tem sido positivo?

Sim, mas tenho de melhorar, sempre. O próprio canal tem de evoluir, tem de ir mudando, de acordo com as circunstâncias. O feedback tem sido positivo. E também é ser-se verdadeiro: eu digo sempre a verdade, mesmo que as coisas não sejam o que as marcas querem. E já aconteceu: houve um vídeo que não foi para o ar, porque a marca disse: “Assim não vai dar.” E eu: “Tudo bem, mas o meu trabalho está feito, não vou dizer uma coisa em que não acredito.” Acho que a receita para estar aqui há nove anos, e continuar, mesmo assim, a crescer, é as pessoas perceberem que estou aqui para ajudar e não para enganar ninguém. Ou seja, tudo aquilo que digo na câmara é o que digo a um amigo fora da câmara. Trato as pessoas como amigos, apesar de não as conhecer. Mas é esse o meu objetivo: dar o meu pequeno contributo, deixar o mundo um bocadinho melhor.

Como faz o equilíbrio entre o que as marcas querem e a sua opinião sobre um produto?

Não acho assim tão difícil, porque há formas de dizer as coisas. Posso não gostar de um produto, ou não me identificar, e destruí-lo, dizendo: “Isto é uma porcaria!” Ou então, por outro lado, dizer: “Para quem valoriza o design e um smartphone leve, este é bom. Valorizas ter mais bateria, melhor câmara, melhor desempenho, há outros.” Este exemplo, que estou a dar agora, aconteceu mesmo. Houve uma marca que, de facto, me convidou para um evento e, quando fui fazer o vídeo, disse que, se quisessem um telefone com mais desempenho, melhor câmara e melhor bateria, havia outros e mais baratos. Não destruí o telefone, apenas disse o que ele tinha de bom, mas também fui verdadeiro com a minha audiência. A marca não se sentiu atacada; perceberam que fui honesto. Claro que há outras formas mais agressivas de trabalhar, que acabam por dar mais cliques, que acabam por ter um título mais agressivo, e isso gera mais interesse. Não é essa a minha posição, não acho que seja muito sustentável, porque cria atritos de um lado e do outro. Tento ser mais neutro, e acho que a forma como se diz é muito importante.

Já perdeu algum trabalho por causa dessa sinceridade?

Exclusivo Simpatizantes

Para ler, basta ter conta no site (disponível para subscritores e não-subscritores).

Entrar

Não tem acesso? Criar conta gratuita

 

O conteúdo deste artigo pode ser reproduzido para fins não-comerciais com o consentimento expresso da DECO PROTESTE, com indicação da fonte e ligação para esta página. Ver Termos e Condições.