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Eletricidade: tarifa bi-horária só compensa com grande disciplina

Mudar para tarifa bi-horária é uma boa ideia? Não é garantido que a fatura fique muito mais leve. Pior: sem disciplina férrea que migre consumos para as horas de vazio, é até possível pagar mais do que com a tarifa simples.

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07 julho 2025
Relógio de ponteiros marcando 7h27, cujo mostrador tem o desenho de uma lâmpada

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O preço do kilowatt-hora, na aparência, não engana. Um simples exercício de comparação permite concluir que um ganho arredondado de 5,5 cêntimos por cada kilowatt-hora, no mercado regulado, premeia a escolha da tarifa bi-horária, em vez da simples. A partir daqui, o prémio soma e segue: será tanto mais expressivo, quantos mais eletrões escorrerem para o horário de vazio. O plano parece a bala de prata para reduzir a fatura de eletricidade. Mas será mesmo assim? É hora de puxar o travão de mão e interromper esta corrida mental à poupança.

Se pondera cair nos braços da tarifa bi-horária para aliviar a fatura, o que talvez não saiba é que a relação exige fidelidade canina. De contrário, os 5,5 cêntimos a menos passarão a 3,5 cêntimos a mais do que pagaria com a tarifa simples ao efetuar consumos em horários fora de vazio.

Para saber se pode prestar vassalagem à tarifa bi-horária, terá de esquadrinhar o perfil de consumo doméstico. Não basta a quantidade de kilowatts-hora, abreviados em kWh. Há que saber em que alturas do dia as máquinas de lavar arrancam ou o ferro de engomar desliza sobre a roupa, e para quantas empreitadas, a cada semana, são chamados a colaborar. Se houver um automóvel elétrico, anote também quando e quanto é ligado à tomada. Já os painéis de autoconsumo são um trunfo, pois fornecem energia nas horas de eletricidade mais cara.

Já percebeu que tudo isto exige consultar faturas e fazer cálculos à proporção de consumos efetuados em dias úteis ou ao fim de semana e em horários de vazio ou fora de vazio, que é como quem diz, nos momentos da semana ou do dia em que a eletricidade é mais barata ou mais cara. Se concluir que, pelo menos, 50% dos gastos ocorrem em horários de vazio, ou podem ser transferidos para estas janelas de oportunidade, a tarifa bi-horária começa a compensar.

Dito isto, pergunte a si mesmo se está disposto a passar fins de semana a pastorear máquinas, ou pode ligá-las à noite, correndo o risco de agastar a vizinhança, para obter um ganho marginal. Por outras palavras, tem vida para a bi-horária? Os deslizes, não se esqueça, são punidos à razão de 3,5 cêntimos por kilowatt-hora face à tarifa simples.

Como funciona a rede elétrica nacional

Atrás de um simples dedo, que carrega num botão para acender a luz em casa, está sempre um sistema elétrico complexo. Faça chuva, vento, sol, ou todos os elementos em conjugação, a produção elétrica tem de assegurar que, à mínima vontade daquele dedo, se faz luz dentro da lâmpada. Até chegarem ao bolbo de vidro, os eletrões são transportados pela rede elétrica nacional, como que uma canalização em tamanho mega, dimensionada para as solicitações a que previsivelmente é sujeita. Na base deste dimensionamento está um cálculo que leva em conta o chamado valor de pico, ou seja, o consumo máximo esperado.

O pico nada mais é do que um valor máximo de referência, estimado para um dia escuro de frio, em que todos os fatores climatéricos se conjugam para que se ligue em simultâneo a quase totalidade dos equipamentos elétricos no País – tipicamente, um dia de janeiro.

No restante calendário, não chegaremos a tanto. Não quer dizer que não haja esforços. Carreguemos agora no fast forward, aquele botão que nos permite avançar no filme. Aproxima-se a hora do jantar, muitos portugueses rumam a casa. Entram, acendem as luzes, talvez liguem o televisor em seguida, talvez prefiram o aparelho de som. Começam a preparar a refeição. Se a loiça do dia anterior tiver ficado em pausa, é provável que a máquina receba agora ordem de marcha. Pequenos gestos para uma família, grandes gestos para o sistema elétrico, que é feito de dez milhões de almas. A capacidade de produção, transporte e distribuição fica sob pressão e, se fraquejar, pode deixar-nos perante um apagão.

E se um tal cenário ocorrer num almoço domingueiro? Será pouco provável. A refeição familiar não concorre com a indústria, enquanto os serviços tendem para menores necessidades energéticas ao fim de semana. Pela madrugada, tão-pouco há pressão na procura, já que o consumo elétrico do País é bem menor. Transferir parte dos consumos para estes períodos com maior folga, concedendo uma redução no preço da energia, é a ideia que subjaz à tarifa bi-horária, que visa maior equilíbrio das exigências da rede. Os chamados horários de vazio são definidos pelo regulador e, assim, coincidentes em todos os comercializadores.

Tarifa bi-horária não compensa para todos os casos

A tarifa bi-horária tem boas intenções, mas a sua rigidez torna-a potencialmente incompatível com o estilo de vida de muitas famílias. Se concentra os consumos no início da manhã e no fim do dia, e mantém idêntico esquema ao fim de semana, a tarifa bi-horária pode não oferecer vantagem. O mesmo sucede, se trabalhar segundo um regime híbrido, que lhe permita ir à empresa apenas em alguns dias da semana, permanecendo em casa nos restantes. Entre e-mails e reuniões, sempre faz umas máquinas de roupa. Mas, em horário que não é de vazio, lá está. Se, pelo contrário, costuma andar por fora durante a maior parte do dia e lhe é possível deixar as máquinas a lavar à noite, pode ser que tenha sorte. Mas terá de consumir, pelo menos, os tais 50% de eletricidade nos períodos mortos.

Para saber se é o seu caso, reveja as faturas do último ano e some os consumos em cada uma das faixas horárias. Se o seu contador proporcionar duas leituras, junte os gastos em vazio com os registados fora de vazio. Fazendo três leituras, adicione os valores em ponta e cheio, para obter o fora de vazio, e some-lhe os referentes ao vazio.

Este exercício oferece-lhe um valor mais preciso e ajuda a ponderar a transferência de consumos para os momentos mais baratos. Saiba, porém, que, se tem um carro elétrico ou um sistema de autoconsumo, o mais provável é já cumprir a quota mínima de 50 por cento. Mas está avisado: tem de mudar comportamentos. Se começar por ser disciplinado e depois passar a lavar a roupa quando tem tempo livre, os ganhos podem perder-se.

Simule antes de mudar de comercializador

Os preços da energia já conheceram melhores dias. Ora, numa conjuntura de subida, a atitude proativa pode render frutos. Acompanhar a evolução do mercado, e optar pelas melhores soluções, é o que se impõe. Se temos este cuidado para os supermercados que vendem os alimentos mais baratos, idêntica atitude devemos reservar à energia. No caso de um lar que gaste 4000 kWh por ano e tenha uma instalação elétrica servida por uma potência de 6,9 kVA, para consumos em vazio de 40%, ainda existem entre as tarifas simples opções mais baratas do que as tarifas bi-horárias. Se passar mais 10%, ou seja, 50%, para os horários vantajosos, os benefícios começam a ver-se.

O simulador da DECO PROteste ajuda-o a fazer as contas e explica como mudar de tarifa de eletricidade, se for caso disso. Se não tiver contrato com fidelização, não há razão alguma para não mudar.

Comparar tarifas de eletricidade

 

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