Dificuldades económicas para mais de 70 por cento das famílias portuguesas
Pagar as contas do dia-a-dia é uma missão quase impossível para mais de 70% das famílias portuguesas. Esta é uma das conclusões principais do Barómetro DECO PROTESTE, que avalia a capacidade financeira para fazer face às despesas.
- Especialista
- Carlos Morgado
- Editor
- Deonilde Lourenço

As coordenadas de muitas vidas foram abanadas pela pandemia. Em 2021, o aperto das famílias portuguesas aumentou face ao ano anterior, situando-se em níveis idênticos aos do período pré-pandémico. Um testemunho recebido através das quase cinco mil respostas ao nosso inquérito sobre a capacidade de os agregados familiares enfrentarem as despesas de alimentação, educação, habitação, lazer, mobilidade e saúde. A grande maioria revela algumas dificuldades financeiras (65%) e uma parte encontra-se mesmo em situação crítica (6 por cento). Livres de constrangimentos económicos apenas 29 por cento. Face ao estudo de 2020, há um recuo no conforto e um sublinhar do esforço.
Ainda que 2020 tenha sido o momento zero do coronavírus, e do início e do pico da crise sanitária, o ano seguinte, com a retirada de alguns apoios estatais, ditou um certo retrocesso na situação financeira dos cidadãos. No barómetro de 2020, as dificuldades dos agregados familiares tinham diminuído em relação a 2019. Em grande medida, o alívio justificava-se com a atuação governamental, que desenvolveu instrumentos destinados a ajudar os cidadãos e os negócios em crise. Criaram-se apoios para as empresas que entraram em lay-off e, para os cidadãos com empréstimos bancários, aprovaram-se moratórias, ou seja, autorizações bancárias para suspender o pagamento das mensalidades por um determinado período. Do mesmo modo, a inatividade causada pela pandemia – serviços fechados e férias canceladas, por exemplo – reduziu as despesas. Contudo, em 2021, com o lento retomar da normalidade, as dificuldades voltaram a fazer-se sentir.
Agregados familiares mais vulneráveis
Tanto em 2020, como em 2021, a capacidade financeira das famílias esteve significativamente ligada ao impacto da pandemia nos seus rendimentos. Por essa razão, continuamos a ter um país a duas velocidades, dividido entre os agregados mais afetados pela crise e aqueles que não a sentiram tanto na pele. Embora a economia comece lentamente a erguer-se, com a abertura dos serviços e do turismo, o verdadeiro impacto da crise nas famílias só agora se começa a sentir, com o retomar das despesas de mobilidade e de saúde, e com o fim dos apoios do Estado (moratórias). A crise financeira estendeu-se um pouco por todo o País, mas a Região Autónoma da Madeira ressentiu-se de forma mais grave: 70% das famílias locais reportam uma perda significativa de rendimentos no último ano, uma percentagem bastante superior às registadas noutras regiões. A esta realidade não será alheio o facto de o turismo representar um modo de subsistência relevante no arquipélago. Não admira, pois, que o Algarve apareça em segundo lugar neste ranking, com 54% das famílias a sofrerem perdas.

A maior distância da Madeira regista-se em relação a Lisboa e Vale do Tejo, onde 40% dos lares sofreram a privação de uma parte do rendimento. Sem causar espanto, o maior impacto da crise pandémica na economia madeirense faz com que seja neste arquipélago que se concentra o maior número de famílias em pobreza extrema (9,5%), valor bem acima dos 6% da média nacional.
Cerca de uma em quatro famílias sofreu, em 2021, uma quebra de rendimentos na ordem dos 25% ou mais. Igual proporção de agregados perdeu dinheiro abaixo desta percentagem. A inatividade profissional temporária (devido a situações de lay-off, por exemplo), o decréscimo do salário ou a perda de emprego são as causas que mais pesam na diminuição do rendimento. Seguramente, estas famílias integram o patamar das que se encontram em situação crítica. O nosso índice situa a maioria das famílias na zona desconfortável das dificuldades financeiras. Tal como em 2020, Portugal obteve o índice mais baixo dos países analisados: 45,3. Na Bélgica, atingiu 53,7, em Espanha, 47,9, e em Itália, 46,2.
Automóvel pesa no orçamento familiar
Habitação, saúde e mobilidade são as despesas que mais pesam no orçamento dos portugueses. Em 2021, os custos com a educação decresceram, o que talvez se explique pelo investimento que muitas famílias já tinham feito em 2020, nomeadamente em equipamento informático, como consequência, por exemplo, das aulas à distância, através da telescola ou de plataformas online. Na área da mobilidade, o gasto com o automóvel ocupa a maior fatia, com os expectáveis protagonistas: combustível, manutenção e seguros.
Um terço dos inquiridos pouco otimistas quanto ao futuro
Quanto às perspetivas em relação a 2022, quase um terço dos inquiridos não se mostra otimista. Apenas 19% acreditam num ano melhor do que 2021. Os restantes consideram que tudo vai ficar na mesma. As previsões conservadoras dos consumidores não vêm ao acaso. O nosso estudo revela um grande esforço das famílias para pouparem: 33% consideram muito difícil e 39% um desígnio mesmo impossível. Os obstáculos já vinham de trás, mas o cenário dá sinais de um agravamento na vida das famílias.
O nosso estudo
O Barómetro DECO PROTESTE visa medir a capacidade de as famílias portuguesas pagarem as despesas do dia-a-dia em seis áreas: alimentação, educação, habitação, lazer, mobilidade e saúde. Em dezembro último, enviámos um questionário, por correio e online, para uma amostra da população adulta. No total, recebemos 4829 respostas. Ponderámos os resultados de acordo com a distribuição demográfica portuguesa, segundo as variáveis sexo, idade, região e habilitações literárias. Bélgica, Espanha e Itália levaram a cabo o mesmo estudo.
O índice varia entre 0 e 100 e, quanto mais elevado for o número, maior é a facilidade dos agregados familiares em pagarem as despesas. Com base no grau de dificuldade demonstrado, é metodologicamente viável criar três grupos de famílias: as que se encontram em “situação crítica” (que não conseguem ou têm dificuldade em pagar as seis categorias de despesas consideradas); as que apresentam “dificuldades financeiras” para pagar algumas despesas essenciais; e, por fim, as que ocupam uma zona de “conforto”, ou seja, que conseguem facilmente pagar todos os gastos.
Junte-se à maior organização de consumidores portuguesa
A independência da DECO PROTESTE é garantida pela sustentabilidade económica da sua atividade. Manter esta estrutura profissional a funcionar para levar até si um serviço de qualidade exige uma vasta equipa especializada.
Registe-se para conhecer todas as vantagens, sem compromisso. Subscreva a qualquer momento.
O conteúdo deste artigo pode ser reproduzido para fins não-comerciais com o consentimento expresso da DECO PROTESTE, com indicação da fonte e ligação para esta página. Ver Termos e Condições. |