Opinião

Defesa do consumidor é defesa do futuro

08 maio 2020
Rita Rodrigues, responsável pelas relações institucionais da DECO PROTESTE

08 maio 2020
Vimos nos artigos anteriores sobre os efeitos da pandemia do novo coronavírus que, enfrentando nós há muito, sem soluções nem genuína vontade política à escala global de as encontrar, uma crise climática tão grave como a emergência sanitária que vivemos atualmente, a verdade é que as obrigatórias e profundas alterações nos comportamentos e hábitos de todos são afinal possíveis. 

Mais: são já, ainda que apenas momentaneamente, observáveis, num vislumbre do que pode e deve ser o nosso futuro sustentável.

Nos primeiros meses de 2020, as emissões de CO2 e de outros gases com efeito de estufa caíram fortemente, em resultado da paragem das indústrias e das deslocações aéreas e terrestres. O desafio que agora se coloca é: como defender esta evolução positiva e ao mesmo tempo promover a prosperidade e o bem-estar das sociedades?

As respostas a esta questão, que é existencial para a espécie humana, são muitas e transversais a várias áreas do conhecimento e a múltiplos setores da economia, com a política e os governantes a terem um papel não menos decisivo. Mas acredito que podemos ajudar a consegui-lo, desde logo, consumindo melhor, com mais responsabilidade e exigência.

A maneira mais simples e fundamental de definir sustentabilidade é "a capacidade de sustentar". Ou, por outras palavras, "a capacidade de suportar".

Nos dias de hoje, não é seguro, longe disso, que o planeta tenha capacidade para suportar a atividade humana. Neste momento, é uma fantasia imaginarmos que os nove mil milhões de habitantes da Terra estimados para 2050 poderão ter uma qualidade de vida básica. Os ecossistemas continuam a deteriorar-se e o clima a mudar, cada vez mais velozmente. Consumimos tanto e tão depressa que, tudo o indica, vivemos já para lá do limite da Terra para nos apoiar.

Ao mesmo tempo que isto acontece, diariamente quase um sexto da população global vai dormir com fome - uma tragédia desnecessária, assim como uma fonte de agitação social e política. Paralelamente, o nosso mundo globalizado está mais interligado e mais volátil do que nunca, tornando-nos a todos mais vulneráveis.

Para sustentar a mudança de que, enquanto espécie humana, precisamos, nós, enquanto sociedade globalizada, temos de transformar os nossos mercados. Isto é, temos de alterar como produzimos e como consumimos. No fundo, temos de modificar as formas pelas quais definimos e medimos valor e progresso.

Convém recordar que sustentabilidade significa não apenas ecoeficiência, mas também ecoeficácia. Sustentabilidade é identificar as necessidades dos mercados olhando para a prosperidade a longo prazo e procurando criar tribos de consumidores sustentáveis. A sustentabilidade tem sempre de ser "ecológica" - porque as empresas, como as comunidades, dependem de ecossistemas saudáveis e produtivos.

Sustentabilidade quer dizer que respondemos às necessidades do presente sem comprometermos a capacidade de as gerações futuras responderem às suas próprias necessidades. Os três pilares do conceito de sustentabilidade - ambiental, económico, social - são igualmente importantes e são interdependentes.

Este é, atualmente, o desafio supremo. Requer um apelo veemente à transição social, política, tecnológica, cultural e comportamental à escala mundial. Exige que os governos criem incentivos, metas e regras para a igualdade de condições. Força os atores da sociedade civil a responsabilizarem quem fornece produtos e serviços, recompensando em simultâneo novas estratégias de geração de impacto social.

Estratégias que permitam projetar e fornecer produtos e serviços que atendam às necessidades sociais e ambientais, incorporando os verdadeiros custos desses mesmos recursos ambientais e sociais. Estratégias que encarem também a transparência e a colaboração como vantagens competitivas.

Do lado dos cidadãos e consumidores, este desafio impõe ainda agirmos nas nossas próprias vidas com o objetivo permanente de promover e premiar iniciativas e modelos de negócio sustentáveis. Mais prosaicamente, obriga-nos a comer, trabalhar, comprar, viajar e divertir-nos de maneira mais sustentável do que o fazemos hoje.

Dito assim, isto parece-nos óbvio. Por que razão apoiaremos financeiramente um produto, uma marca, um serviço, um comportamento no mercado se não concordamos com seus valores sociais e ambientais - se ele põe em causa o futuro de todos, e portanto o nosso também?

Foi por isso, porque acreditamos que a transição para um planeta mais sustentável tem como principais agentes os consumidores, que apresentámos já o pedido à Assembleia da República para que crie o Dia Nacional da Sustentabilidade.

Data da celebração: 25 de setembro, dia em que, em 2015, a ONU revelou os 17 objetivos de desenvolvimento sustentável que devem ser implementados por todos os países do mundo até 2030.

Sem um futuro sustentável, nada teremos, e seremos nós, consumidores, consumidos pelos nossos erros. Para nós, agora e sempre, defesa do consumidor é, também e acima de tudo, defesa do futuro.

Junte-se ao movimento pelo Dia Nacional da Sustentabilidade a 25 de setembro.

Rita Rodrigues - Responsável pelas Relações Institucionais da DECO PROTESTE

Artigo originalmente publicado a 08/05/20 na edição online do DN.