Automóvel elétrico, bateria e garantia: o que escondem as marcas?
As vendas de carros elétricos dispararam, e 2035, com o fim anunciado para carros a gasóleo e gasolina, é já amanhã. Mas o que acontece quando acaba a garantia da bateria? E se avariar, quanto custa reparar? Os consumidores continuam sem respostas. As marcas sabem pouco ou não revelam muito.

As baterias dos carros elétricos têm um número limitado de ciclos de carga e uma vida útil ainda reduzida. As marcas prometem oito anos ou 160 mil quilómetros sem sobressaltos com 70% como nível mínimo de capacidade da bateria. Esta é a garantia-padrão. Mas e depois? O que acontece quando a garantia acabar? O retrato piora quando comparado com as soluções que visa substituir, os automóveis a combustão interna, com vida útil de mais de 15 anos e uma desvalorização mais suave. Para guiar o consumidor na transição para uma mobilidade elétrica ao alcance de todos, a DECO PROteste questionou as marcas. Objetivo: caracterizar as condições que os fabricantes e vendedores disponibilizam e examinar as garantias.
O trabalho incidiu também nas condições de posse e utilização, como seguros, reparação, disponibilidade de peças de marca/concorrência e prestadores de serviço. Em suma, saber tudo sobre quem vende, quem assiste, quem assegura e quem incentiva. Entre janeiro e abril de 2024, a DECO PROteste identificou os principais atores no mercado e enviou questionários aos fabricantes. Foram entrevistados responsáveis das partes interessadas, entre marcas com maior relevância e outras que estão a dar cartas.
Conclusões da investigação: preço, autonomia e melhorias urgentes nos carros elétricos
O que escondem as marcas?
Tesla, BMW, Volvo, Dacia e Renault não responderam ao questionário da DECO PROteste. E quase todas as marcas evitaram a pergunta "Quanto custa trocar a bateria no pós-garantia?" ou chutaram para o lado. Exemplos: "A troca aplica-se em casos extremamente raros"; "A pergunta é enganadora para o consumidor" e "opção de reparação por módulos, cujo preço varia entre 1000 e 2000 euros". A DECO PROteste ouviu de tudo, até um brutal "Sem informação disponível", mas não ouviu aquilo que pediu. Faltou saber, rigor e transparência.
Mercedes-Benz, BMW e Tesla lideram corrida elétrica
O mercado regista aumentos significativos na venda de elétricos e híbridos. A tendência é acompanhada pela promessa de veículos elétricos e híbridos mais sustentáveis e apoiada pela orientação da Comissão Europeia, que definiu que, a partir de 2035, as vendas de automóveis novos devem ser exclusivamente deste tipo de veículos. Entretanto, no mundo real, na estrada, salta uma contradição entre a mensagem de sustentabilidade e o estado de maturidade tecnológica, sobretudo das baterias, com autonomia reduzida, preço elevado e dúvidas sobre a durabilidade.
O desafio da renovação do parque automóvel é enorme e os 10 anos que nos separam de 2035 são curtinhos. Números redondos, os portugueses compram 80 mil elétricos ao ano e 120 mil que não são.
O parque automóvel português aumenta desde 2010. Em 2022, os veículos ligeiros de passageiros correspondiam a 5 778 584 unidades. Quase todos movem-se a combustíveis fósseis. Os carros elétricos e híbridos plug-in ainda são uma pequena fatia.
Mas 2023 fez história ao anunciar uma inversão a curto prazo, em que os veículos a combustíveis fósseis deixarão de comandar as vendas. Foram vendidos 199 623 automóveis ligeiros de passageiros. E o conjunto da frota eletrificada teve uma grande expressão no mercado português (42%) com os elétricos na frente. Estes e os híbridos plug-in ultrapassaram os motores a gasóleo.
O carro elétrico já não ocupa um nicho. É uma tendência de mercado. Em 2023, destaca-se um primeiro grupo de marcas que venderam mais elétricos e híbridos: a Mercedes-Benz, seguida pela BMW, Tesla e Toyota, todas com mais de 5 mil elétricos vendidos. Entre os 100% elétricos, a Tesla arrecada mais vendas, seguida pela BMW e, em terceiro lugar, a Peugeot, a Mercedes-Benz e a Volkswagen.
Já em relação aos híbridos plug-in verifica-se a mesma tendência no domínio de marcas premium, com a Mercedes-Benz em primeiro lugar, BMW em segundo lugar e Volvo em terceiro. Nos híbridos, a Toyota é a líder do mercado na categoria, seguida pela Ford, Nissan e Fiat. Em suma, as 10 marcas mais relevantes foram Mercedes-Benz, BMW, Tesla, Toyota, Peugeot, Ford, Nissan, Volvo, Renault e Fiat.
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Analisou-se a relação entre o preço e a autonomia dos carros de uma forma geral e por segmentos. O carro de combustão interna é imbatível: apresenta autonomias mais elevadas (800 km) a preços mais baixos, abaixo da maioria dos preços de outros tipos de energia. Não é surpresa, nem choca ninguém, dado o elevado grau de maturidade de uma tecnologia com décadas de existência e disseminação em todas as gamas.
Mais caro e com menos autonomia
Regra geral, a autonomia dos elétricos é a mais baixa das diferentes soluções: aumenta com o preço até cerca de 100 mil euros, e estabiliza em valores sempre abaixo dos 800 quilómetros. Nos modelos 100% elétricos e híbridos plug-in, a maior autonomia concentra-se em carros com preço mais elevado. Espera-se que o grande diferencial possa diminuir nos próximos anos. Mas, na verdade, hoje, para muitos consumidores, apesar do custo superior de aquisição, a solução elétrica já compensa ao considerar o custo do carregamento.
Melhorias críticas e urgentes
A informação nos automóveis híbridos plug-in acusa várias limitações: dado que o veículo faz a gestão dos modos elétrico, térmico e híbrido, o utilizador sabe que, em modo híbrido, o carro está a consumir um certo valor de combustível (em l/100 km) até que a carga da bateria elétrica se esgote. Depois de ser consumida, entra em modo 100% a combustão. Ora, na maioria dos casos, os fabricantes não apresentam o consumo nesse modo. E muitos condutores não otimizam a tecnologia, evitando o carregamento da bateria. Para agravar o cenário, o consumo em modo térmico raramente é publicado.
A grande maioria das marcas permite a manutenção fora da sua rede de oficinas ou concessionários, desde que cumpra o plano do fabricante, sob pena da extinção de garantia. Os planos implicam intervenções com datas definidas ou quando o veículo apresente o aviso e restringe as peças e consumíveis a utilizar, bem como algumas boas práticas.
A maioria disponibiliza o serviço de reparação, substituição de módulos danificados e troca de baterias, mas não indicou o custo. Hesitação e omissão, tendo alguns representantes admitido desconhecimento regular ou devido à introdução recente dos veículos de mobilidade alternativa sem registos de avaria. Contudo, nos sites, a maioria apenas adianta efetuar a substituição dentro da garantia sem abordar o pós-garantia.
O estudo denuncia uma flagrante falta de informação das marcas sobre a substituição de baterias ou módulos. As oficinas afirmam efetuar serviços para veículos elétricos, mas, em muitos casos, não são bem caraterizados e não revelam preços.
Nos seguros, a DECO PROteste não detetou agravamento para carros elétricos, mas antes condições mais adequadas, como a cobertura de danos nos cabos de carregamento ou a opção de carregamento, em caso de assistência.
A rede atual não é suficiente
Vários comercializadores de energia propõem opções de tarifários e carregadores para instalação doméstica, específicos para a mobilidade elétrica. Carregar em casa é crítico para aproveitar o preço de energia mais barato.
A rede pública de postos de carregamento é extensa e a dimensão já se equipara à da rede de postos de combustível, mas o tempo de carregamento é sempre superior. Como tal, e sem contabilizar o carregamento doméstico, a rede pública teria de ser 11 vezes maior do que a atual para suportar um parque formado na íntegra por veículos elétricos. Se a frota de veículos ligeiros de passageiros fosse toda eletrificada, seriam necessárias cerca de 300 mil tomadas públicas. A expansão e a capacitação da rede implicam custos elevados, o que merece reflexão e transparência.
Estamos ao volante do futuro, mas enquanto nos carros a combustão a compra faz-se com um cenário seguro de previsibilidade em custos de manutenção, nos elétricos há uma longa estrada a percorrer, para garantir dados básicos ao consumidor. Só assim pode fazer uma escolha acertada e informada. Proteger o investimento exige contas bem feitas e uma noção real de custos. O azar bate sempre à porta e o carro elétrico não escapa. A DECO PROteste continuará em cima do dossiê e não vai tirar o pé do acelerador com a análise de custos e do impacto ambiental.