Combater o plástico descartável
Todos os anos, são produzidos cerca de 58 milhões de toneladas de plástico na Europa, 40% dos quais para embalar produtos. Deixamos algumas sugestões para diminuir a quantidade de produtos descartáveis que usa no dia-a-dia.
- Especialista
- Fábio Aparício e Elsa Agante
- Editor
- Ana Rita Costa , Ricardo Nabais e Alda Mota

Quinhentos e treze quilos foi a quantidade de lixo que cada português produziu no ano de 2019, de acordo com dados da Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Um valor cem quilos acima da meta definida para 2020 pela União Europeia.
Destes resíduos, apenas 13% são devidamente separados e encaminhados para reciclagem e menos de 20% são usados para valorização energética. A maioria acaba por ser colocada no contentor dos resíduos indiferenciados (lixo comum) e tem como destino o tratamento mecânico biológico ou o aterro.
No que diz respeito ao plástico, na Europa, produzem-se cerca de 58 milhões de toneladas de plástico por ano, 40% dos quais destinados a embalar produtos. Só em Portugal, cada pessoa gera 31 quilos de resíduos plásticos por ano, de acordo com a Comissão Europeia.
Mas nem tudo são más notícias. Segundo a Sociedade Ponto Verde (SPV), entidade gestora de resíduos de embalagem, os portugueses estão cada vez mais comprometidos com a sustentabilidade ambiental, e, em 2020, a taxa de reciclagem no País aumentou em média 13% face a 2019.
Com melhores escolhas e atitudes, podemos contribuir para que a Humanidade tenha um futuro neste planeta. Acompanhe a informação, os conselhos e as ferramentas que preparámos para o guiar no processo no Portal Mais Sustentabilidade.
Lutar contra o excesso de embalagem
Preocupação global com plásticos descartáveis
Em 2018, a Comissão Europeia decidiu focar-se no problema dos plásticos descartáveis, apresentando um plano robusto para reduzir a sua utilização até 2025. A ideia é banir o plástico de diversos objetos de uso quotidiano, com destaque para objetos como cotonetes, talheres, pratos, palhinhas, agitadores de bebidas e paus para balões de plástico, dado que podem já ser produzidos exclusivamente a partir de matérias-primas de fontes renováveis. Além destes produtos, também os recipientes descartáveis para alimentos e bebidas estão na mira da Comissão Europeia.
Os Estados-membros tiveram, assim, de fixar objetivos nacionais de redução, tornando disponíveis produtos alternativos nos pontos de venda e proibindo o fornecimento gratuito de plásticos descartáveis, tal como aconteceu com os sacos de plástico distribuídos nas caixas dos supermercados. Assim, a comercialização destes produtos, como pratos e talheres, em plástico descartável é proibida em toda a União Europeia desde 3 de julho de 2021.
A União Europeia pretende ainda aumentar a reciclagem das garrafas de plástico descartável para bebidas, esperando que para tal exista um aumento na recolha seletiva destas embalagens, atingindo 77% em 2025 e 90% em 2029. Para alcançar esta meta, pode-se recorrer à restituição de depósitos, como taras recuperáveis, como acontecia na generalidade das garrafas de vidro noutros tempos. Esta prática é, aliás, comum em vários países europeus, nos quais se conseguem elevadas taxas de recuperação de embalagens de vidro, metal e mesmo plástico.
Em Portugal, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática lançou um projeto-piloto que incentiva a devolução de garrafas de plástico (em PET), permitindo aos consumidores depositá-las em 23 máquinas automáticas disponíveis em supermercados. Como contrapartida, os consumidores recebiam talões de desconto para as suas compras ou para entregar a instituições de solidariedade social.
Implementado em março do ano passado em apenas algumas superfícies comerciais do País, o sistema de incentivo à devolução de garrafas de plástico já recebeu 12 milhões de garrafas para reciclar, originando 500 mil euros de desconto em compras. Noutra fase deste projeto-piloto, as garrafas de plástico (PET) entregues irão ser trocadas por donativos a 23 instituições de solidariedade social, previamente selecionadas online pelos consumidores.
Embalagens de uso único também são necessárias
É inegável que as embalagens de uso único, independentemente do material em que sejam feitas, são indispensáveis para proteger os alimentos ou outros produtos, facilitar o transporte do produto, fornecer informações úteis ao consumidor através do rótulo e diferenciar os produtos através de estratégias de comunicação das marcas. No entanto, existem contrapartidas: os impactos ambientais associados à produção e transporte de embalagens que assim que cheguem à casa do consumidor irão ser depositadas no ecoponto ou, no caso de más práticas ambientais, no lixo comum. Caso estas embalagens não sejam corretamente separadas e colocadas no ecoponto, podem demorar séculos até desaparecerem totalmente.
No vídeo, veja alguns exemplos de embalagens desnecessárias usadas para acondicionar alimentos frescos.
A situação nos oceanos, em particular, preocupa, sobretudo no Pacífico e no Índico. Os países asiáticos têm muita dificuldade em gerir os seus resíduos – muitos não fazem, sequer, a respetiva recolha e o tratamento – , e o destino, na maior parte dos casos, é o mar. Para piorar a situação, existem também alguns países do Ocidente que exportam resíduos para países asiáticos, aumentando a pressão na correta gestão de resíduos. Cerca de metade dos resíduos de plástico que acabam nos oceanos são gerados em cinco países: China, Indonésia, Filipinas, Tailândia e Vietname. Mas os oceanos não têm fronteiras, e o plástico, que pode demorar centenas de anos a desaparecer do fundo dos mares, vai-se degradando em partículas cada vez mais finas – os chamados microplásticos – e afetar espécies marinhas.
Como reduzir a produção de resíduos?
Pode parecer uma missão impossível, sobretudo quando chegamos de uma visita ao hipermercado e enchemos os contentores com embalagens. Mas há pequenos passos que pode dar todos os dias para contribuir para uma redução na quantidade de resíduos gerados.
Evite usar sacos para pesar fruta e legumes no supermercado
Quando for comprar fruta ou legumes, certifique-se de que o produto necessita mesmo de ser acondicionado num saco ou então dê preferência a frescos que não se encontrem previamente embalados. Os sacos têm apenas a função de agrupar várias unidades, mas se o produto já estiver agrupado, como um cacho de bananas, não necessita de utilizar nenhum saco. Pode também reutilizar sacos antigos para guardar os seus frescos durante as compras. A reutilização é sempre preferível à compra de novos sacos.
Voltar à venda a granel
Antes do boom do plástico, era comum comprar a granel. Hoje, volta a ser possível fazê-lo em algumas lojas. Esta prática está em crescimento, e há várias cadeias de distribuição no nosso país que já contam com zonas dedicadas à venda a granel, assim como pequenos comerciantes dedicados a este conceito que permitem que leve os seus recipientes vazios para acondicionar os produtos. No site A Granel pode consultar quais as lojas que já aderiram à venda a granel, onde se localizam e quais os produtos disponibilizados.
No que diz respeito a produtos de limpeza, as alternativas ainda são um pouco limitadas. Alguns contêm substâncias perigosas, como a lixívia, por exemplo, e apenas devem ser vendidos em embalagens específicas e munidas com tampas de segurança. Contudo, os detergentes que não apresentam a mesma classificação de perigo são já comercializados a granel em muitas cadeias de supermercados de vários países, como é o caso de Espanha, França e Itália.
Opte por produtos sem embalagem ou com embalagens mais sustentáveis
Procure produtos cujas embalagens se encontram adequadas ao tamanho e às características do produto. Procure alternativas às embalagens que misturam vários materiais e que possam ser mais difíceis de reciclar.
No que diz respeito aos sabonetes líquidos, géis de banho e champôs, opte por embalagens maiores e sem dispensador, e, quando tiver de reabastecer, sempre que possível, pondere a compra de recargas. Desta forma, estará a reduzir a quantidade de plástico de uso único que traz para casa.
Outros passos para reduzir o uso de embalagens
- Evite a utilização de produtos descartáveis, optando por produtos que se possam reutilizar.
- Evite comprar água engarrafada. A água da torneira é mais barata e de elevada qualidade.
- Qualquer que seja o material de embalagem, há sempre um contentor – amarelo, verde ou azul – pronto para transformar as embalagens em novos produtos.
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Sabia que há plásticos que podem ser feitos a partir de matéria orgânica e serem biodegradáveis? São os bioplásticos, e podem ter duas origens: ou são derivados de biomassa, ou seja, produzidos com matérias-primas como óleos e gorduras vegetais, provenientes de culturas de milho, cereais ou cana de açúcar, ou derivam do petróleo. Neste último caso, são considerados bioplásticos desde que sejam biodegradáveis.
Mas, apesar de, idealmente, se poderem degradar mais depressa mediante condições especiais, continuam a ter impactos ambientais.
Os bioplásticos têm sido bastante bem aceites tanto pelos utilizadores como pelo mercado, sendo associados a menores impactos ambientais. De acordo com um estudo da Comissão Europeia de 2020, 90% dos consumidores querem comprar produtos com o menor impacto ambiental possível. Mas serão estes plásticos parte da solução?
A questão, como vivemos num mundo complexo, não pode ser simples. A solução também não. Por exemplo: por um lado, as plantas utilizadas para formar plásticos de origem vegetal absorvem dióxido de carbono durante a sua existência, mas, por outro, esse carbono absorvido será libertado assim que o bioplástico chegar ao fim da vida (a não ser que seja reciclado), fazendo com que o saldo de carbono seja neutro.
Ora, é uma boa notícia, mas isto só pode ser alcançado se não forem contabilizadas as emissões associadas à colheita e ao processamento da matéria-prima em fábricas e transporte. Se considerarmos estas fases, os bioplásticos podem ter uma pegada de carbono maior do que os plásticos convencionais, dependendo do tipo de material e de utilização.
Matéria-prima com impacto ambiental
Mas há mais: a matéria-prima utilizada. A produção de bioplásticos pode ser feita a partir de alimentos, e estes poderiam ser utilizados para ajudar na eliminação da fome de mais de 690 milhões de pessoas. Ou seja, entramos em complexas questões éticas.
A produção de bioplásticos também pode significar, com a monocultura e o consumo de água que exige, a destruição de habitats e de paisagens naturais e o risco de desertificação de algumas zonas. Estudos recentes compararam os impactos ambientais de fazer uma garrafa de bebida em plástico convencional e em bioplástico. Os resultados podem não ser os esperados: devido à utilização de fertilizantes, ao transporte e à colheita, os impactos ambientais dos bioplásticos acabam por ser superiores.
Tratamento e reciclagem de bioplásticos suscitam dúvidas
As próprias entidades nacionais que gerem os resíduos dizem que ainda é cedo para dizer se estamos preparados para tratar e reciclar bioplásticos. “Ainda não houve tempo para testes e ensaios”, afirmam os responsáveis da recicladora Extruplás, em resposta a um conjunto de perguntas que enviámos por e-mail. Não é possível saber ainda qual a origem dos plásticos que chegam às unidades de reciclagem. “A experiência ainda não nos permite tirar grandes conclusões. Sabemos que já nos chegam alguns bioplásticos nas misturas que recebemos, mas a percentagem não é expressiva.” Daí que seja também impossível saber se começarem a chegar em maior quantidade, cenário em que poderão inviabilizar o próprio processo de reciclagem: “Nesse caso, teremos de testar e fazer vários ensaios de reciclabilidade.”
Perguntámos à Associação para a Gestão de Resíduos (ESGRA) se os sistemas municipais e as respetivas estações de triagem estão preparados para separar e encaminhar corretamente novos tipos de plástico. A associação respondeu, também por e-mail, que a “criação de novos fluxos de materiais exige necessariamente a adaptação de processos e equipamentos, de modo a assegurar o seu encaminhamento adequado”. Ou seja, poderemos não estar ainda prontos para a reciclagem de novos materiais...
O mesmo problema foi identificado pela EGF (Environment Global Facilities), empresa que reúne sistemas de gestão de resíduos urbanos responsáveis pela recolha, tratamento e valorização de materiais e que abrange 6,2 milhões de portugueses. Apesar de se estar à procura de soluções, elas ainda esbarram em “desafios” importantes. Segundo a EGF, “irão coexistir plásticos tradicionais e biodegradáveis nas mais diversas tipologias de embalagem e será difícil para o consumidor (a quem diariamente já pedimos uma série de comportamentos de separação de resíduos) distinguir o tipo de plástico e onde o separar. Haverá uma importante barreira de comunicação e de mudança de comportamento que irá requerer enormes investimentos em sensibilização e formação para que famílias e negócios percebam como devem separar os plásticos (os tradicionais e os biodegradáveis)”.
Outro problema identificado é a possibilidade de os bioplásticos desvirtuarem o sistema de reciclagem, por contaminá-lo com “intrusos”. Os responsáveis da ESGRA sublinham este perigo: “As estações de triagem atuais não são vocacionadas para separar resíduos biodegradáveis ou compostáveis. Estes fluxos são contaminantes nas estações de triagem, podendo mesmo colocar em causa a qualidade de outros fluxos de plásticos.” Por outras palavras, não só não podem ser reciclados, como acabam por atrapalhar aqueles que poderiam sê-lo.
A EGF sublinha também esta dificuldade: “Os plásticos biodegradáveis vão começar a aparecer nos centros de triagem para plásticos tradicionais e será difícil gerir estes materiais que não são recicláveis pelas indústrias de reciclagem do plástico. Se isso acontecer, o destino inevitável será a incineração ou o aterro o que representa um retrocesso face à reciclagem dos plásticos tradicionais.” E reforça a preocupação técnica: “Se, por outro lado, as pessoas os colocarem nos contentores para biorresíduos, boa parte deles será triada como contaminante (separação mecânica) ao início do processo de valorização orgânica e, mais uma vez, irão parar a incineração ou aterro. No início do processo de tratamento é indispensável a separação por meios mecânicos de materiais contaminantes (como plásticos, latas, vidros, etc.). É um processo de separação mecânico, logo, a maioria das embalagens biodegradáveis será separada e enviada para a aterro ou incineração nesta fase. Não o fazer implica problemas mecânicos ao longo de toda a instalação, não chegando assim estas embalagens sequer às fases de digestão anaeróbia e posterior compostagem.” Mas há mais: “Importa realçar que por uma determinada embalagem referir ser biodegradável, não é garantido que o seja nas condições de operação específicas de uma determinada instalação industrial.”
Biodegradável e compostável: as diferenças
Os produtos biodegradáveis são distintos dos compostáveis. Um plástico compostável decompõe-se num material idêntico ao solo e pode ser utilizado na agricultura como fertilizante. Enquanto os plásticos compostáveis se degradam apenas em água, biomassa, sais minerais e dióxido de carbono, os biodegradáveis podem converter-se em metano e libertar microplásticos, metais e produtos tóxicos no ambiente. Para um material ser considerado biodegradável, apenas tem de garantir que se degrada naturalmente a 90 por cento. Nos restantes 10%, podem estar presentes microplásticos, metais e produtos tóxicos, que vão acabar por se libertar.
Outra diferença: os materiais biodegradáveis precisam de condições especiais para se degradarem a uma velocidade superior à dos materiais não-biodegradáveis, ao passo que os compostáveis o fazem com maior facilidade. Sem essas condições, se os deitarmos simplesmente no ambiente, acabam por durar o mesmo tempo que um plástico convencional. E vão-se degradando lentamente em partes mais pequenas, podendo formar microplásticos.
Um estudo recente simulou o descarte de sacos de plástico biodegradáveis, compostáveis e convencionais em ambiente marinho e terrestre. Os resultados mostraram que o plástico biodegradável e o convencional se mantinham completamente funcionais ao fim de três anos. Apenas o saco de plástico compostável se degradava no meio marinho em cerca de três meses.
Por outro lado, se os sacos forem deixados em contacto direto com o sol, partem-se em pedaços cada vez mais pequenos até formarem microplásticos. Na prática, não existe diferença significativa entre os plásticos regulares e os biodegradáveis, se estes forem largados onde não se deve... Daí a ESGRA afirmar que “a utilização de plásticos compostáveis poderá ser uma boa alternativa", “desde que as condições de compostabilidade sejam compatíveis com as características de compostagem dos biorresíduos”. A EGF tem ainda dúvidas sobre a solução a encontrar: “Se esta for uma pergunta dirigida a um futuro breve, ainda é de difícil resposta, dependerá da solução técnica mais eficaz para a triagem e valorização dos plásticos biodegradáveis. Para o cidadão, que apenas tem de saber onde colocar este tipo de embalagem e não adivinha o processo industrial complexo que implica tratá-las, será apenas necessário que exista um consenso nacional e internacional sobre o tema para que a comunicação seja direta e eficaz. Para a EGF, que acompanhamos de perto todas estas matérias, à data de hoje a indicação é para colocar no lixo comum porque ainda não existe outra solução. Num futuro que se adivinha breve, acreditamos que será um tema a resolver a nível nacional pela APA.”
O que pode o consumidor fazer?
Para já, o melhor é seguir à risca as indicações que o município der para os locais adequados onde depositar cada resíduo. Mas não se esqueça: os bioplásticos, apesar do “bio”, continuam a ser plásticos. Só porque alguns são feitos de plantas ou têm potencial para se biodegradar sob condições específicas não estão livres de impactos ambientais.
Ao usar um bioplástico, procure evidências de que essa alternativa é a melhor para o ambiente. Como? Por exemplo, se exibir a indicação de ser biodegradável, leia toda a informação no rótulo, um cuidado crucial para perceber se se trata de uma boa opção. Tenha sempre em mente que não existem soluções milagrosas para o ambiente... mas isso não significa que tenha de abandonar esta causa.