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Prática comercial desleal da Netflix viola legislação europeia

A nova forma de apresentação dos planos de subscrição da Netflix viola a legislação europeia. Na Alemanha, em Espanha, em França e em Itália, a plataforma de streaming esconde o plano mais barato isento de publicidade, para induzir a subscrição das opções mais caras. As organizações de consumidores já pediram mão pesada.

20 junho 2023
Netflix

iStock

A Netflix continua a dar notícias. Primeiro, foram meses a ameaçar com a deteção e a punição da partilha de conta. Agora, a plataforma de streaming recorre à estratégia de tornar menos visível, no seu site, o plano mais barato isento de publicidade, para forçar a subscrição dos mais caros por quem pretenda evitar anúncios. Trata-se de uma prática comercial desleal, que viola a legislação europeia e as disposições legais de alguns Estados-membros da União Europeia.

Por enquanto, a “novidade” chegou apenas, no espaço comunitário, aos utilizadores alemães, espanhóis, franceses e italianos. Mas nada garante que a Netflix não tente algo idêntico em Portugal. As organizações de consumidores associadas à Euroconsumers, de que a DECO PROTESTE faz parte, já reagiram, e pediram mão pesada às autoridades da concorrência nacionais, para que suspendam a prática e apliquem coimas dissuasoras, que, por exemplo, em Itália, podem ir até 4% da faturação anual.

Netflix esconde o plano mais barato que não tem publicidade

Para usufruir dos serviços de streaming da plataforma, o utilizador deve subscrever um plano cujo preço varia com as características: qualidade e resolução máxima dos vídeos, possibilidade de descarregar conteúdos para ver offline e número de aparelhos que podem ser usados em simultâneo.

Na página de subscrição dos países onde a nova prática foi aplicada, são destacados três planos: Base com Publicidade, Standard e Premium, do mais barato para o mais caro. A linguagem utilizada (Choose the plan that’s right for you ou “escolha o plano certo para si”) e a forma segundo a qual as opções são apresentadas tornam inequívoco que o acesso aos serviços da Netflix depende da subscrição de um destes três planos e que, para evitar publicidade, a alternativa mais económica é o Standard.

Mas não é bem o caso. Quem pretende uma opção sem inserções publicitárias pode aderir a um plano mais barato do que o Standard, que não está indicado de modo transparente, ao lado dos anteriores. Ao fazer scroll na página de subscrição, o consumidor descobre um pequeno botão, a cinzento, para não atrair demasiado a atenção face a outro, muito maior e de cor vermelha, com a palavra Next (“Seguinte”) e que destaca os planos mais caros. Ora, este pequeno botão cinzento dá acesso a See all plans (“veja todos os planos”).

O uso do plural (“planos”) faria supor a existência de muitas outras opções de subscrição, eventualmente não mostradas à partida para não sobrecarregar a página em termos visuais. Mas, ao clicar no botão cinzento, apenas o plano mais barato sem publicidade – Base – aparece a mais. No fundo, a Netflix tem quatro planos, e não apenas os três inicialmente destacados.

Manipulação do consumidor viola legislação europeia

Através de manipulação e omissão, a Netflix induz o consumidor a aderir aos planos mais caros, se não quiser ficar sujeito a publicidade. Esta prática comercial desleal surge em paralelo com a recente estratégia da plataforma de streaming para evitar a partilha de conta com utilizadores que não fazem parte do agregado familiar. Tal como declarado em carta enviada aos acionistas a 19 de abril deste ano, o objetivo é encontrar formas de monetizar os casos de partilhas com outros agregados familiares, forçando a subscrição de novos planos autónomos ou acrescentando utilizadores (extra members), mediante um custo suplementar.

Acontece que, na União Europeia, a legislação exige a total transparência de preços, a fim de evitar que o consumidor pague a mais apenas por desconhecer todas as opções disponíveis. De facto, segundo uma nota da Comissão Europeia emitida em 2021, destinada a clarificar a interpretação e a aplicação da legislação contra práticas comerciais desleais, qualquer manipulação que possa distorcer o comportamento de um consumidor médio ou vulnerável pode ferir as regras que se impõem aos comerciantes.

Neste sentido, os comerciantes devem garantir que o design das suas plataformas online não distorce as decisões de compra dos consumidores. Exemplos de práticas de manipulação são a pouca visibilidade de informação importante e a organização de forma a promover uma opção específica, como um botão demasiado visível e outro escondido, ou um caminho demasiado longo e outro curto.

Trata-se exatamente daquilo que a Netflix passou a fazer nos sites disponibilizados aos utilizadores na Alemanha, em Espanha, em França e em Itália, bem como noutros países extracomunitários. De momento, Portugal está de fora, mas nada garante que a Netflix não tente aqui idêntica prática comercial enganadora.

A organização de consumidores Euroconsumers, através dos seus membros, entre os quais a DECO PROTESTE, quer o fim desta prática e coimas exemplares. Por isso, os países que a integram e onde a Netflix introduziu a nova apresentação dos planos tarifários – Espanha e Itália – organizaram uma ação em que pedem às autoridades da concorrência locais que, tendo em conta a gravidade da situação, determinem as coimas máximas previstas: em Itália, por exemplo, corresponde a 4% da faturação anual no país.

Portugal ainda não foi atingido pelas novas medidas da Netflix, mas a DECO PROTESTE não quer dissociar-se desta ação, lembrando à plataforma de streaming que, também aqui, vão contra a legislação e que terão firme oposição, caso venham a ser implementadas.

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