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- Decisão da Caixa de não pagar juros pode ser legal mas é imoral

António
Ribeiro
Especialista em produtos de poupança.
Analista financeiro independente registado na CMVM.
Licenciado em Economia pela Universidade de Coimbra.
Decisão da Caixa de não pagar juros pode ser legal mas é imoral
Há 3 anos - 28 de junho de 2019
António
Ribeiro
Especialista em produtos de poupança.
Analista financeiro independente registado na CMVM.
Licenciado em Economia pela Universidade de Coimbra.
A Caixa Geral de Depósitos comunicou aos seus clientes com depósitos poupança a taxa fixa que a partir de 1 de agosto irá atualizar em baixa as respetivas taxas de juro.
Na carta enviada aos clientes, com data de 21 de junho, o banco público apresenta uma tabela com as novas taxas de juro: a maior parte das contas poupança passa a remunerar a 0,015% brutos, refletindo um corte de 70% (anteriormente era 0,05%). E acrescenta ainda: "...também a partir de 01/08/2019 será alterada a regra de pagamento dos juros nos Depósitos a Prazo e Depósitos Poupança, pelo que não serão pagos juros sempre que o valor ilíquido dos juros calculados seja inferior a 1 euro."
A Caixa refere ainda que "nos termos da legislação vigente" o cliente "tem direito de denunciar o contrato, imediatamente e sem encargos, antes da data proposta para a aplicação das referidas alterações, caso contrário será considerado que aceitou as alterações indicadas".
Pequenos aforradores são os mais penalizados
Dentro dos limites da lei, a instituição financeira é livre de definir as características e condições dos depósitos que comercializa. Além disso, tanto as instituições, como os clientes, terão de estar de acordo quanto ao conteúdo do contrato que celebram, bem como quanto à própria decisão de contratar. Nada na lei prevê a possibilidade de a instituição optar por não pagar juros abaixo de determinado valor, mas também não existem obstáculos legais claros a essa prática.
Quaisquer alterações às condições contratuais aplicáveis aos depósitos automaticamente renováveis, devem ser comunicadas aos depositantes com a antecedência suficiente para que os mesmos se possam opor.
Assim, nada podemos fazer relativamente à legalidade da medida. Mas podemos dizer que se trata de uma medida imoral e um sinal contrário ao que deveria ser dado pelo banco do Estado. Deveria ser um exemplo na forma como trata os aforradores, zelando pelos seus interesses e incentivando a poupança, especialmente as poupanças dos mais desfavorecidos, com menos recursos financeiros, ainda que o contexto de baixas taxas de juro não permita remunerações muito elevadas.
Mas são precisamente os aforradores com menos recursos que vão ser os mais penalizados. Pois, para que tenha um euro de juros (à taxa bruta de 0,015%, que será aplicada a partir de 1 de agosto), necessita ter 6667 euros aplicados durante um ano. Se tiver menos do que esse montante não recebe juros.
Caixa Geral de Depósitos abriu a porta. E agora?
A banca anda ávida de novas formas de encaixar receitas. As comissões são as mais frequentes. Mas a Caixa foi “inovadora” com esta medida, arrecadando assim o juro que deveria ser pago ao cliente. É o banco do Estado a abrir caminho para um novo tipo de saque às poupanças dos aforradores. Será que a banca comercial privada lhe vai seguir os passos? Teremos mesmo que começar a guardar as poupanças em casa, a salvo dos bancos?
Para conhecer as melhores remunerações do mercado, consulte o nosso comparador de depósitos e contas poupança.
Onde estão os incentivos à poupança?
Segundo os dados divulgados recentemente pelo INE (Instituto Nacional de Estatística) , os portugueses estão novamente a encolher o montante dedicado à poupança: no final do primeiro trimestre deste ano, por cada 100 euros de rendimento disponível, os portugueses pouparam apenas 4,50 euros (era 4,6% no final de 2018).
A maioria dos portugueses opta pelos depósitos a prazo e estes rendem, em média, apenas 0,1% líquidos; além disso, a inflação estimada pelo Banco de Portugal para este ano é de 0,9%, ou seja, bastante superior ao rendimento da maioria dos depósitos.
Assim, se já não há grandes incentivos à poupança, o cenário ficará ainda pior. Alguns bancos avisaram que vão continuar a cortar nas já baixas remunerações, como a Caixa Geral de Depósitos, que deverá descer as taxas em agosto.
Alguns bancos já não pagam nenhuma taxa de juro aos seus clientes; bem pelo contrário, os clientes ainda pagam as comissões de manutenção da conta. Assim, a tendência é o cliente pagar para ter o dinheiro no banco, pois o rendimento é muito reduzido. Este comportamento é bastante penalizador para os aforradores, que vêm as suas poupanças encolher ano após ano.
Já alertámos as entidades reguladoras para a atual situação de baixos níveis de poupança em Portugal, muito distante dos 11% registados há uma década e muito abaixo dos 12% da Europa. É urgente inverter esta tendência e criar incentivos à poupança de modo a convergir no mesmo sentido do que a Europa. Criar novos produtos, reduzir a taxa de imposto ou mesmo isentar de tributação até determinado montante de juros são algumas soluções.
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