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André
Gouveia, CFA
Analista financeiro independente, certificado pelo CFA Institute e registado na CMVM.
Mestre em Finanças pelo ISEG.
NFT: como criar e onde comprar obras digitais
Há um ano - 18 de maio de 2022
André
Gouveia, CFA
Analista financeiro independente, certificado pelo CFA Institute e registado na CMVM.
Mestre em Finanças pelo ISEG.

Uma das primeiras transações de NFT ocorreu, em março, quando Jack Dorsey, CEO do Twitter, vendeu uma imagem do primeiro tweet por 2,9 milhões de dólares.
No mundo virtual os ativos não precisam de ser tangíveis para valerem dinheiro e terem interessados dispostos a pagar milhões por eles. As criptomoedas deram o pontapé de saída. Seguem-se os NFT, cuja sigla significa non-fungible token.
Podemos traduzir non-fungible token por “ficha não-fungível”, sendo que não-fungível é algo que não é substituível. Na base de um NFT está um ficheiro informático, sobretudo de imagem, mas que pode ser de praticamente qualquer tipo (música, uma receita, entre outros).
Este ficheiro é depois registado numa blockchain, tornando-se um ficheiro “único”, no sentido em que é possível ver quando foi criado, quem o possui e quem o deteve anteriormente. O registo do NFT na blockchain é como um certificado de autenticidade digital.
A maioria dos NFT são registados na blockchain da Ethereum, a segunda criptomoeda mais valiosa e que temos destacado como uma das mais sofisticadas e interessantes, pelas suas possibilidades.
Uma das primeiras transações de NFT ocorreu, em março, quando Jack Dorsey, CEO do Twitter, vendeu uma imagem do primeiro tweet por 2,9 milhões de dólares através do site Valuables. Dizia apenas: “Just setting up my twttr” (a configurar o meu tweet), e tinham passado 15 anos desde que lançara a rede social, em 22 de março de 2006.
Sina Estavi, um empresário da Malásia, justificou assim a compra deste NFT: “É um pedaço de história humana na forma de um ativo digital. Quem sabe qual será o preço do primeiro tweet da história da Humanidade daqui a 50 anos?”
Os valores associados a esta e muitas outras vendas estão a chamar a atenção. Será uma nova forma de fazer e adquirir arte, ou mais uma “cripto loucura”? Não se sabe.
Como comprar ou vender um NFT
- Primeiro, precisa de ter uma wallet de criptomoedas que lhe permita transacionar Ethereum (a maioria permite).
- Depois, crie uma conta num dos sites especializados onde pretende pôr à venda ou comprar NFT. Existem vários e, com a moda em torno do fenómeno, vão provavelmente surgir muitos mais. Alguns exemplos são o Rarible e o OpenSea (acessível a todos os utilizadores e todos os tipos de NFT), o Nifty Gateway e o SuperRare (mais vocacionados para arte propriamente dita), e uma variedade de sites dedicados a nichos, como o Cryptopunks (vende pequenas imagens de punks geradas por algoritmos) ou o SoRare (cromos digitais de jogadores de futebol).
- Ligue a sua wallet à conta no site de NFT e carregue-a com o valor em criptomoeda que pretende gastar.
- Está pronto a licitar o NFT desejado.
- Se pretende criar e vender um NFT, precisa de ter o ficheiro de imagem, música ou outro num formato aceite pelo site que está a utilizar (JPEG, GIF, MP3, entre outros).
- Carregue o ficheiro no site, pague as comissões e escolha um preço de licitação.
- Agora é só esperar para ver se surgem interessados na compra.
Blockchain ao serviço da arte digital
O conceito de escassez de um ativo digital é algo que, no princípio, se estranha. Pois se é possível ter quantas cópias quisermos de um ficheiro, porque há de ter este algum valor? Mas será assim tão diferente da arte ou de outros objetos colecionáveis no mundo real? É verdade que o ficheiro original, seja um vídeo, uma música ou um desenho, pode ser copiado infinitamente. Mas, na vida real, também é possível replicar a Mona Lisa, mesmo que de forma imperfeita (pelas tintas usadas, pelo desgaste do tempo). Não serão as semelhanças maiores do que as diferenças?
À medida que a sociedade se torna cada vez mais digital, é natural que a arte se torne cada vez mais virtual e, nesse caso, é necessário um sistema para atestar a autenticidade. Portanto, os NFT, talvez mais do que as criptomoedas, são uma utilização da blockchain que vem responder a uma necessidade real.
A utilidade do NFT para os artistas para os detentores de conteúdos em geral, é evidente. Podem monetizar, isto é, fazer render o seu trabalho, de forma mais direta, pois evitam intermediários e têm mais controlo.
Os NFT permitem, por exemplo, programar que o criador receberá uma percentagem das vendas. O mundo da arte já está a prestar atenção.
A venda mais cara de NFT de que há registo, a imagem First 5000 Days, do artista Beeple, que foi vendida por mais de 69 milhões de dólares, teve a chancela da prestigiada leiloeira Christie’s. Na música, o conhecido DJ Steve Aoki vendeu por quase 900 000 dólares uma das suas músicas, associada a um vídeo no site Nifty Gateway.
Mas não é só o mundo da arte que pode beneficiar dos NTF. A liga de basquetebol norte-americana, NBA, em parceria com a Dapper Labs, criou uma plataforma em blockchain chamada Top Shot Moments, destinada à negociação de colecionáveis digitais. Na prática, transaciona “cromos” virtuais, isto é, imagens animadas de jogadas fantásticas de jogadores famosos. Os mais raros estão a ser vendidos por centenas de milhares de dólares, como o top shot de LeBron James, que rendeu 387 600 dólares. Em fevereiro, esta plataforma chegou a faturar quase 38 milhões de dólares em apenas 24 horas.
Até o “nosso” Cristiano Ronaldo já entrou para a história dos NFT. O site SoRare criou uma liga de futebol virtual em que são vendidos “cromos” de jogadores de futebol, tendo já licenças oficiais de clubes famosos, como o Real Madrid, o Bayern de Munique e os três grandes nacionais. Um cromo de Cristiano Ronaldo bateu recordes, ao ser comprado por quase 300 000 dólares.
NFT desafia leis de direitos de autor
A perfeição matemática da criptografia e da blockchain, por vezes, entra em conflito com as imperfeições do mundo real. A questão da propriedade intelectual é um desses pontos. A compra de um NFT não pressupõe, por si só, que se estejam a adquirir direitos de propriedade sobre a obra original. O detentor pode continuar a dispor dela como entender. Mas qualquer pessoa pode pegar num desenho, vídeo, etc., de um terceiro, criar um NFT e lucrar, mesmo que o trabalho esteja protegido por direitos de autor.
Para fazer valer os seus direitos, o autor terá de recorrer aos tribunais, com todos os custos que isso acarreta, e, na ausência de regulação, o desfecho a seu favor não está assegurado. À medida que o mercado amadurece, é um ponto que terá de ser resolvido. Em preparação, na União Europeia, está o Regulamento de Mercados de Criptoativos (MiCA), que poderá abranger ativos digitais não-fungíveis.
Mas, se a utilização dos NFT continuar a crescer, os juristas especializados em propriedade intelectual e áreas conexas vão ter muito trabalho nos próximos anos.
NFT (para já) sobrevalorizados
É possível, e até provável, que, na maioria dos casos, os valores pagos pelos NFT estejam inflacionados, algo que não irá resistir ao longo do tempo. A nossa perceção é que muitos negócios ocorrem mais pela novidade do NFT e a associação às criptomoedas, que têm valorizado de forma consistente desde o final do ano passado, do que pela arte a que eles conferem a autenticidade.
Nos casos reportados nos média, os compradores devem parte da sua riqueza às criptomoedas. Ao contrário de quem compra uma obra de arte, quem adquire um NFT não obtém qualquer direito de propriedade. Não pode pôr um vídeo ou música no YouTube e ganhar dinheiro com os anúncios, sob pena de infringir a propriedade intelectual.
Acreditamos, por isso, que esta moda dos NFT pode mudar, à medida que o mercado amadurecer e a legislação recuperar o atraso. Não significa que, até lá, não se possa ganhar dinheiro. Aliás, é nessa febre especulativa que muitas aquisições estão a ser feitas.
Por outro lado, quem nos garante que os NTF não vieram para ficar? Se para muitos é incompreensível como uma tela pintada de azul, com apenas uma linha branca no meio (obra do artista Barnett Newman), foi vendida por 34 milhões de euros, porque um gif de um gato pixelizado não pode valer milhões?
Um aspeto a ter em conta é a comunidade em torno dos NFT. Nos casos em que estão associados a sites ou plataformas específicas (por exemplo, os Cryptopunks), há o risco de esse suporte perder popularidade e, assim, arrastar o valor de todos os NFT por aí transacionados.
Com o mercado dos NFT ao rubro, quem parece estar numa posição privilegiada são os vendedores. Na maioria dos casos, não há qualquer transferência de propriedade intelectual, e até pode existir a possibilidade de receber parte das vendas, pelo que não têm nada a perder.
Se possui algum conteúdo artístico ou que possa despertar a curiosidade alheia, explore a possibilidade de o transformar em NFT. Quem sabe pode estar a criar valor (quase) do nada.
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