O Presidente Trump avançou com tarifas às importações para os Estados Unidos, tal como havia prometido. Contudo, as taxas anunciadas não foram recíprocas, mas definidas pela dimensão do défice comercial entre os EUA e o país visado.
Logo, a Casa Branca não pretende que os parceiros reduzam os entraves ao comércio, mas que eliminem o excedente registado com os EUA. Além disso, Trump quer captar o investimento de empresas para reindustrializar a América e voltar aos seus tempos gloriosos, que segundo ele foram vividos nos finais de século XIX e início do século XX. Ambos os objetivos são totalmente irrealistas.
Já não é a indústria tradicional que faz dos EUA uma potência mundial. A força dos EUA reside na sua capacidade de inovação e nos seus gigantes da tecnologia. Agora, ao optar pela autarcia na produção de bens, abandonaram também a esperança de serem competitivos nas indústrias tradicionais. É uma perda para os Estados Unidos, que acabará por pesar na sua capacidade de inovação e também na qualidade de vida. As famílias americanas terão de contentar-se com alternativas mais fracas e/ou mais caras.
Como reagiram os mercados?
No imediato, o resultado do anúncio de elevadas tarifas é a destruição das cadeias de produção estabelecidas nas últimas décadas, sobretudo da Ásia para os EUA.
Naturalmente, os mercados entraram em colapso e as bolsas ainda não pararam de cair desde o anúncio de Trump. Os próximos tempos permanecerão difíceis porque ninguém sabe o que se segue, nem… a Casa Branca. Mesmo que Trump mostre alguma flexibilidade, a incerteza está instalada. Os investidores vão ter de manter a cabeça fria e a disciplina.
Quais foram a tarifas aplicadas?
10 % foi o valor mínimo das tarifas anunciadas por Donald Trump. A justificação é taxar os países em cerca de metade do que estes cobram sobre as importações dos EUA. Contudo, a fórmula utilizada pela Casa Branca assenta sobre o valor dos excedentes comerciais que os diversos países gozam face aos EUA e não no nível das tarifas ou outros entraves ao comércio.
Todos os parceiros comerciais dos EUA serão “convidados” a pagar significativamente mais de 10%. Portanto, a Casa Branca quer reequilibrar o comércio externo e não atuar para baixar o nível das tarifas no resto do mundo. A realidade é que, simplesmente, os americanos compram demasiado e o resto do mundo tem uma procura mais fraca. Para resolver este fenómeno e reduzir o vasto défice comercial, as tarifas de Trump não são solução.
A Ásia será a região mais afetada pelos direitos aduaneiros. Há, naturalmente, a China, o “inimigo” dos Estados Unidos. A nova taxa de 34 % acrescerá aos 20 % já em vigor e a China terá de lidar com um total de 54%.
Porém, a abordagem em relação à China não surpreendeu e a bolsa chinesa reagiu inicialmente melhor do que a maioria dos outros mercados asiáticos. Contudo, a situação na bolsa também se deteriorou quando Pequim anunciou que ia retaliar na mesma moeda, ou seja, com 34% sobre a importação de produtos americanos.
Face a outros países da região, as tarifas foram ainda mais devastadoras. As taxas de 46% e 49% contra o Vietname e o Camboja, respetivamente, anulam as estratégias de diversificação de muitas empresas que procuravam uma alternativa à China.
Com tarifas de 20 %, a União Europeia sai-se “melhor” do que os países asiáticos desenvolvidos (Japão 24%, Coreia do Sul 25%) e outros mercados europeus (Suíça 31%). Porém, o consolo é pouco, face à fraca procura na Europa, as empresas do Velho Continente, contam com o mercado americano para impulsionar o volume de negócios.
Um raciocínio que também se aplica às empresas japonesas e sul-coreanas. Para piorar a situação, todos estes países terão de enfrentar uma “enxurrada” de produção chinesa que já não encontrará compradores nos EUA.
As tarifas podem ser negociadas?
Apesar de as tarifas já terem sido divulgadas, os próximos meses serão de enorme incerteza. Ninguém sabe até que ponto a Casa Branca será restritiva na aplicação das tarifas. Haverá exceções? Há margem para negociar? Ou ainda haverá novas taxas, por exemplo, para os semicondutores e para os produtos farmacêuticos?
Se Trump quiser efetivamente transformar a economia norte-americana, não irá dar concessões significativas. Aliás, como as tarifas dos EUA foram baseadas no défice, os países-alvo só poderiam contentar Trump com o compromisso de comprarem mais aos EUA. A China fê-lo no primeiro mandato de Trump, mas não funcionou e é um compromisso difícil de assegurar mesmo que haja vontade política. A maioria dos Estados não controla a economia.
As empresas também não sabem com o que contar nos próximos meses. Será que os gigantes tecnológicos americanos poderão usufruir de regimes de exceção?
E as empresas no resto do mundo? Mudar a produção para os EUA é um processo moroso e muito dispendioso e, nalguns casos, irrealista.
Os EUA não têm a mão-de-obra adequada e aos mesmos custos, por exemplo, da Ásia. O processo de criar fábricas de semicondutores em território americano para beneficiar do Chips Act aprovado pela administração Biden já tinha esbarrado nessa realidade.
O que fazer aos investimentos? Manter a disciplina!
As quedas fazem parte do ciclo dos mercados, embora a euforia dos últimos dois anos possa ter apagado algumas memórias desses momentos. Também não significa que se espere uma rápida inversão do atual pessimismo. As quedas poderão até se acentuar nos próximos tempos dado o rude golpe das tarifas na economia global e a possibilidade de uma recessão.
Tentar adivinhar os melhores momentos para comprar e vender raramente resulta. O ideal é investir de forma disciplinada e regular porque o tempo (longo prazo) é mais importante do que tentar prever os momentos “ideais”.
Aplique um valor fixo regularmente para reduzir o impacto da volatilidade em vez de reagir a cada oscilação.
ETF e fundos: reduza o risco
A volatilidade dos mercados manter-se-á elevada, mas se já tem uma carteira bem diversificada pode manter o rumo da sua estratégia de investimento para o longo prazo.
Se, mesmo assim, pretende reduzir o risco, poderá reforçar a exposição às obrigações. Para evitar os riscos crescentes e adotar uma abordagem mais defensiva, os ETF de dívida pública norte-americana e da zona euro constituem, nesta fase, um complemento mais interessante para a carteira do que os fundos e ETF de ações.
Ações: fique atento
Dada a incerteza, é cedo para avaliar o impacto concreto das tarifas nos resultados de muitas empresas. Contudo, há setores que estão naturalmente mais expostos.
Para já, não venda ações de forma precipitada, nem caia na tentação de ir aos “saldos”. Pode haver oportunidades de compra, mas os riscos são elevados. Qualquer ajuste à sua carteira de ações deve ser ponderado e sempre focado no longo prazo.
Fique atento às nossas análises de ações.
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