Tal como num dominó, em que as peças se encaixam umas nas outras, o valor das pensões de reforma depende de uma série de fatores. Em grande parte, da evolução da população. Nos últimos sessenta anos, a esperança média de vida à nascença passou, segundo os últimos dados do INE, de 63,5 anos, para 81,1. Ou seja, passámos a viver cerca de 18 anos mais, fruto da melhoria das condições de vida e dos avanços da medicina. Quase tanto quanto viviam, em média, os romanos, na Roma Antiga (25 anos).
Viver mais anos é uma boa notícia, mas este aumento significa que, nas últimas décadas, o País envelheceu. Por um lado, o número de idosos cresceu - em menos de uma década, os centenários mais do que duplicaram - e, por outro lado, baixou drasticamente a natalidade, provocando um desequilíbrio entre o número de reformados e o número de pessoas ativas.
Para as contas do Estado, este é o maior problema. Quem vai pagar as pensões de velhice se, como indicam as projeções, houver cada vez menos pessoas ativas a contribuir para um número cada vez maior de aposentados? Há quem defenda que as empresas que usam robôs deviam pagar uma contribuição como se de pessoas se tratasse. Por enquanto, isso não acontece.
O problema do envelhecimento não afeta, contudo, apenas, o nosso país. Segundo a ONU, “o envelhecimento populacional está prestes a tornar-se numa das transformações sociais mais significativas do século XXI”. É inegável que a proporção da população com 60 e mais anos é cada vez maior, não só em Portugal, mas na maioria dos países. Por sua vez, a taxa de fertilidade mundial, que em meados do século XX rondava os 5%, situa-se atualmente em metade. Qual o impacto destas alterações demográficas no valor da pensão que irá receber quando se reformar?
Como irá evoluir a população
Este é um ponto crucial para saber o que nos espera em termos de pensões de velhice. Quando surgiu há algumas décadas nos países europeus, o sistema de pensões foi feito com base numa pirâmide demográfica que já não existe. Na altura, havia sete ou oito pessoas ativas por cada pensionista. Neste momento, em Portugal, temos três pessoas e prevê-se que, daqui a algumas décadas, tenhamos 1,4. Por isso, há quem argumente que as contribuições para a segurança social não deveriam incidir apenas sobre os trabalhadores mas também sobre o capital das empresas.
De acordo com as últimas projeções demográficas realizadas pelo Eurostat, o rácio de dependência de idosos atingirá, em 2070, em Portugal, um dos valores mais elevados da UE. Passará de cerca de 37 reformados por cada 100 pessoas ativas, com idade entre os 20-64 anos a fazer contribuições para a Segurança Social, para cerca de 67 pessoas com mais de 65 anos. Estima-se que, em 2070, tenhamos 3,3 milhões de pensionistas.
Embora isso signifique, à partida, mais despesa para o Estado, as projeções apontam noutro sentido, como se verá adiante.
De acordo com o Ageing Report da Comissão Europeia, que, a cada três anos, avalia o impacto das mudanças demográficas e macroeconómicas na sustentabilidade dos sistemas de pensões da União Europeia, a população portuguesa, entre 2019 e 2070, deverá diminuir quase um quinto, apesar dos fluxos migratórios. A redução é mais acentuada na população em idade ativa, entre os 20 e os 64 anos (passa de 59% para 49,2%). Acima dos 64 anos, aumenta de 22% para 33,1%, e a população com mais de 80 anos duplica.
Por sua vez, o índice de fecundidade, que tem vindo a decrescer desde a segunda metade da década de 1960, agravou-se com a pandemia. Nunca nasceram tão poucas crianças. Em Portugal, houve menos 2283 nascimentos em 2020 do que no ano anterior.
Um efeito inevitável: a idade da reforma irá aumentar nos próximos anos, para atenuar estes efeitos demográficos, embora a pandemia possa obrigar a refazer contas. Devido à covid-19, a esperança média de vida recuou, no ano passado, 0,8 anos, revelam os últimos dados do Eurostat.
Reformas a partir de 2030 e 2040
Até 2007, para o cálculo das pensões contabilizavam-se apenas os 10 melhores dos últimos 15 anos de trabalho. Desde então, toda a carreira contributiva é tida em conta.
Em 2019, o valor médio das pensões de velhice rondava 74% do último salário. Na década de 2030, as projeções de substituição do rendimento apontam para uma percentagem em torno dos 81%, o que significa uma melhoria. Esta é a boa notícia. A má notícia é que, a partir daí, a queda é abissal. Em 2040, o valor médio das pensões de velhice deverá descer para 54,5%, ou seja, pouco mais de metade do último ordenado que receber. E em 2050 irá mesmo baixar para 43,5 por cento. A conclusão consta do Ageing Report 2021.
Despesa com pensões vai diminuir
Com o objetivo de avaliar a sustentabilidade das finanças públicas, o Ecofin mandatou o Comité de Política Económica para a produção de uma nova projeção para a despesa pública com o envelhecimento. Os resultados também estão expressos no relatório de Bruxelas.
De acordo com este relatório, a despesa com pensões representava, 12,7% do PIB, em 2019. Espera-se que em 2035 atinja o pico de 14,6 por cento. Mas, a partir dessa data, sofrerá uma redução até 2070 (9,5% do PIB). De facto, a despesa pública portuguesa relacionada com o envelhecimento deverá, ao contrário da restante União Europeia, registar a maior queda.
Pensões perdem valor
De todos os países da União Europeia, Portugal é o que regista também a maior desvalorização do valor das pensões face à evolução dos salários, revela o último relatório de adequação de pensões da Comissão Europeia, publicado em julho. Em apenas dez anos de aposentação, um reformado perde o equivalente a quase um quinto dos rendimentos de trabalho.
Ao contrário dos restantes países da UE, Portugal, a par com a Grécia, usa a evolução da taxa de inflação e o crescimento da economia para atualizar o valor das pensões. Ora, o valor da inflação não tem acompanhado a evolução média dos salários.
As soluções para o Estado pagar as reformas
É comum ouvir-se dizer que não haverá dinheiro para pagar as pensões no futuro. Uma ideia refutada pelo Ageing Report. Apesar de a população idosa estar a aumentar e ser expectável a subida da despesa com pensões de velhice, o País conseguirá controlar e, até, reduzir os gastos graças aos mecanismos de ajuste do sistema, que fazem depender o valor das reformas da expectativa de vida e de fatores de sustentabilidade.
Será inevitável aumentar a idade da reforma e, provavelmente, alterar a tributação. O mais provável é ter, a partir de 2040, um cálculo de reforma menos generoso. Possivelmente, será introduzido um teto às pensões máximas. Razão pela qual se aconselha a preparar a reforma o mais cedo possível.
Texto de Myriam Gaspar.
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