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Trabalhar até mais tarde para pagar a reforma
Há 2 anos - 3 de novembro de 2020
Pedro Mota Soares, ex-ministro da Solidariedade, Emprego e Segurança Social, foi um dos oradores das conferências.
A sustentabilidade do sistema e o financiamento da segurança social foram o pretexto para juntar, nos dias 28 e 29 de outubro, um painel de ilustres no seminário online que a PROTESTE INVESTE dedicou ao tema em parceria com o jornal ECO. A conclusão foi unânime: é inevitável reformar o sistema, ainda que não haja vontade política para tal, e a idade da reforma terá de aumentar.
O aumento da esperança de vida a isso obriga, bem como a diminuição da população ativa. Segundo João Peixoto, professor catedrático no Instituto Superior de Economia e Gestão (ISEG), o número de pessoas adultas, que trabalha e desconta por cada idoso, passará, no futuro, de três para menos de dois. Após o 25 de abril, este rácio era de seis para um.
Citando projeções do INE, o especialista em demografia acrescenta ainda que o índice de envelhecimento, isto é, a relação entre o número de idosos e jovens, quase duplicará até 2080. “O desafio é gigantesco para a Segurança Social”, reconhece. Embora não seja suficiente para resolver o problema, é importante aumentar a fecundidade, controlar as saídas para fora do País e aumentar o número de migrantes, sob pena de Portugal ficar reduzido a muito menos de 10 milhões de habitantes daqui a algumas décadas.
Álvaro Santos Pereira não tem dúvidas de que o envelhecimento da população é um problema grave. De acordo com o diretor da OCDE, só a Coreia, a Espanha e o Japão terão, em 2050, rácios de dependência maiores do que Portugal. À exceção da Letónia, a força de trabalho no nosso País é a que diminuirá mais na OCDE, o que terá implicações económicas e irá refletir-se nas contas públicas e na sustentabilidade da Segurança Social. “Estima-se que dívida pública portuguesa aumentará em 2030 por causa dos custos do envelhecimento da população. Se não tivermos prudência fiscal, tornar-se-á ainda mais explosiva.”
O ex-ministro da Economia assegura que vamos ter de trabalhar até mais tarde e criar mecanismos que flexibilizem a legislação do trabalho. “Não é sustentável manter as pessoas sem trabalhar durante 30 anos à espera que o Estado pague. Quem quiser trabalhar até mais tarde, deve poder fazê-lo.”
Opinião partilhada pelo professor de Finanças do ISEG, Paulo Trigo Pereira. “A idade da reforma não devia ser mandatória. Há quem chegue à reforma exaurido, mas também há quem gostaria de continuar a trabalhar depois dos 70 anos. Temos de arranjar modelos de funcionamento muito mais criativos no desenho de soluções, que não seja uma solução igual para todos, one size fits all” Para a economista Susana Peralta, professora na Nova SBE, a solução passa por desenhar esquemas em função das capacidades das pessoas e do tipo de trabalho.
Financiamento da Segurança Social
A forma como a Segurança Social é hoje financiada é destacada por Susana Peralta: “É um beco sem saída se o sistema continuar a depender apenas dos rendimentos do trabalho. É preciso avançar com outras fontes de financiamento”, desafia a professora de Economia na Nova SBE. Paulo Trigo Pereira acrescenta, contudo, que o problema não se resolve “com remendos, nem com uma alteração substancial do modelo atual, porque não há condições para tal.” Para este professor de Finanças, a sustentabilidade da Segurança Social passa por políticas de médio e longo prazo ao nível da natalidade, migração, crescimento, produtividade e competitividade. Por exemplo, “os inquéritos sobre natalidade mostram que as mulheres portuguesas gostariam de ter mais filhos, mas para tal seria preciso adequar as políticas de forma a que parentalidade desejada fosse retomada.
O modelo atual de financiamento da Segurança Social assenta em três pilares, contributivo e não contributivo. O segundo pilar associado às empresas e aos ramos de atividade está muito pouco desenvolvido em Portugal. “À semelhança do modelo alemão, este segundo pilar podia complementar o primeiro, que é o do Estado”, defende Paulo Trigo Pereira. O terceiro pilar, de aplicações como PPR e fundos, também tem duas componentes, uma pública e uma privada das quais ninguém fala, mas a poupança não resolve. “Os produtos de aforro são comprados pela classe média elevada. Os jovens não têm como poupar. Preocupa-me a ausência de debate público sobre esta questão.” Também Álvaro Santos Pereira recomenda reflexão urgente sobre o tema: “Nos países nórdicos, os parceiros sociais preocupam-se com este problema, quer seja sobre a questão da robotização, do envelhecimento ou do endividamento.”
À semelhança dos restantes intervenientes, João César da Neves concorda que o sistema precisa de ser mudado, mas “não se consegue por questões políticas.” Este não é, contudo, um problema que preocupe este economista. Pelo contrário. “Em termos financeiros, não é um problema grave.” O economista está mais preocupado com os jovens. “Temos um sistema que favorece os mais velhos e prejudica os mais novos.” Paulo Trigo Pereira concorda que o problema centra-se nas gerações mais novas. “Não só têm empregos mais precários, como terão uma vida contributiva altamente irregular.” Susana Peralta insiste que é preciso ir buscar outras formas de financiamento. Criar impostos sobre o capital, que igualizem a distribuição de rendimentos. Mas como, se, como diz João César das Neves, há uma descapitalização da economia portuguesa? “É dramático. Não temos capital, sequer! Não há investimentos, não há crescimento. O crédito está todo virado para o imobiliário e para o consumo, e não há crédito para as empresas. São estes sinais doentios que assustam. A Segurança Social é apenas uma parte do problema.”
“Temos de ser inovadores”, desafia Francesco Franco: “A estrutura demográfica vai mexer com o financiamento do sistema, porque a receita de imposto sobre o rendimento vai baixar. É preciso pensar como se atinge o equilíbrio orçamental e incentiva a poupança”, conclui o professor da Nova School of Business and Economics.
Que alternativas têm os portugueses para acautelar a reforma?
“A média de pensões é muito baixa, não chega aos 500 euros, e a taxa de poupança dos portugueses é também muito baixa”, observa Pedro Mota Soares. É certo que aumentou agora, durante a pandemia, mas não é suficiente. Comparado com o resto da Europa, poupamos metade. Perante este cenário, o ex-ministro da Solidariedade, Trabalho e Segurança Social reforça a necessidade de se darem alguns passos no sentido de as pessoas terem mais capacidade de aforro. “É preciso criar alguns mecanismos de poupança para a reforma, ainda que voluntários, dado que as pensões serão, no futuro, significativamente mais baixas do que as atuais.”
Valdemar Duarte, da Comissão Consultora dos Fundos de Pensões, assegura, contudo, que há uma oferta ampla de produtos de aforro à disposição, com qualidade. “Segundo a Associação Europeia de Seguradoras, constatou-se que Portugal é dos países que está mais sensibilizado para poupar e, do conjunto da população europeia, é o que mais manifesta intenções de o fazer”. É caso para perguntar: porque não poupamos, então, em instrumentos de longo prazo? “Porque os produtos que existem não são atrativos do ponto de vista da perda de liquidez. Ou seja, se eu tiver de imobilizar o dinheiro que aplico, gosto de ter algo em troca. Se não tiver, deixo o dinheiro à disposição para o utilizar quando precisar dele”, justifica.
Mais importante do que criar estímulos, nota Valdemar Duarte, “é a mensagem que é transmitida à população: a Segurança Social pode sobreviver sozinha e os portugueses podem contar exclusivamente com o Estado. Isto é, podem poupar para a reforma, mas apenas numa perspetiva de acrescentar mais algum rendimento a algo de bom e certo que irão receber. O Estado apresenta-se como omnipotente e omnipresente. Ora, a mensagem que devia passar é que as pessoas devem acautelar o futuro, e até o presente. Temos PPR, fundos de pensões, novas soluções de rendimento... Não temos piores produtos que qualquer país da Europa, onde a poupança para a reforma é significativa.”
Os portugueses têm tendência para escolher produtos sem risco, preferencialmente depósitos a prazos, que têm taxas de juros quase negativas. No entanto, prevê-se que as taxas fiquem próximas do zero nos próximos dez anos, avisa Francesco Franco. Valdemar Duarte deixa um alerta: “Viver com risco zero ou muito baixo pode ser interessante para aplicar poupanças no curto prazo, mas é extremamente penalizador e perigoso para aplicar no longo prazo.”
Além dos depósitos a prazo, o produto favorito dos portugueses são os PPR. “Mais de 80% dos PPR são sob a forma de seguro, com capital garantido. Como tal, têm uma rentabilidade mais baixa”, observa Joaquim Rodrigues da Silva. “Isso faz sentido aos 56 anos, mas, se começar a poupança aos 30, optar por produtos com mais risco pode ser interessante.” Mudar mentalidades é, por isso, necessário, defende o diretor do Centro de Competências Jurídico e Financeiro da Deco Proteste. “Começar a poupar para reforma aos 40 já não é suficiente. Deve ser tão cedo quanto possível”, desafia. O fator de capitalização, neste caso, é importante. E dá um exemplo: “Se uma pessoa com 30 anos começar a poupar 100 euros e o aplicar no plano de poupança reforma sob a forma de fundo que recomendamos, quando chegar à reforma, pressupondo que a rentabilidade se mantenha, terá cerca de 250 mil euros.”
A tendência para colocar as poupanças num determinado produto e deixá-lo estar sossegado, sem olhar para lá com a regularidade que seria desejável é outra questão importante que Joaquim Rodrigues da Silva destaca. “A transferência de produtos para gestoras com rentabilidades mais interessantes pode ser a solução.” Valdemar Duarte acrescenta: “Para ter rendimento é preciso ter risco, e para ter risco é preciso ter informação sobre o risco, é preciso jogar com variáveis como diversificação, dispersão.” Este responsável assegura que o paradigma das taxas garantidas está a mudar e há uma tendência para introduzir cada vez mais produtos expostos ao mercado. “O que é preciso é literacia e informação no sentido de as pessoas perceberem que estes produtos expostos aos mercados estão sujeitos a oscilações. Por exemplo, em março parecia que o mundo ia acabar, mas no mês seguinte os mercados recuperaram. Uma boa gestão de risco, no médio/longo prazo compensa sempre.”
À parte das várias soluções de aforro, Francesco Franco avança com outra opção para precaver o futuro das reformas: “A TSU e os impostos sobre as empresas podiam ser transformados em incentivos de poupança. Ou seja, o trabalhador podia decidir voluntariamente dedicar uma parte do seu salário para um fundo.” É notório, porém, que em Portugal estamos muito aquém do se passa noutros países europeus. Joaquim Rodrigues da Silva, salienta que apenas 3,7% de trabalhadores portugueses estão ao abrigo do segundo pilar, ou seja, são poucas as empresas que têm fundos de pensões que permitem aos trabalhadores beneficiarem de um complemento de reforma. “No caso da Holanda ou da Suécia, por exemplo, chega a 80% da população. Ora, as empresas podiam olhar para os fundos como uma componente remuneratória interessante, quer para os trabalhadores que já têm, quer no recrutamento de novos.”
Como Portugal tem mais de 90% de micro e pequenas empresas, não é, contudo, fácil criar instrumentos como estes, observa Pedro Mota Soares. Exatamente por isso, o ex-ministro defende outros incentivos. “Tenho defendido nos últimos anos que devia ser criado um suplemento à reforma em que qualquer pessoa que entre no mercado de trabalho passe a descontar 1%, com liberdade de escolha entre os produtos de poupança que existem, sejam privados ou públicos, acompanhado por 1% a cargo da empresa, sendo que este devia dar direito a um desconto fiscal.” O objetivo deste modelo não é onerar as empresas. “Mas talvez se devesse discutir com os parceiros sociais, em sede de concertação social, se faz sentido alocar o 1% que é descontado para o Fundo de Garantia de Compensação do Trabalho numa nova forma que permita garantir melhores pensões”.
Valdemar Duarte partilha da solução. “Sou um grande defensor. Faço parte de uma entidade que tem implementado muitos esquemas de contribuições de trabalhadores e empresas e posso afirmar que o nível de adesão dos trabalhadores ronda os 80 por cento. Em Portugal, só falta um empurrão. Seja ele qual for, é bem-vindo. O fiscal é indispensável. Deve haver uma lógica tripartida de contribuição inicial do trabalhador, com o incentivo por parte da empresa e um apoio fiscal do Estado que reduza o custo e torne atrativo uma empresa aderir”, conclui.
O futuro das pensões está em suspenso. “Como diz António Bagão Félix, com alguma graça, não é um sistema pay-as-you-go, mas pray-as-you-go. Ou seja, com alguma fé no futuro sobre se vamos encontrar uma forma de financiar o sistema da Segurança Social. É altura de criar quer estímulos legais, quer estímulos fiscais que obriguem um pouco as pessoas a pensar sobre o que está a acontecer”, aconselha Pedro Mota Soares.
Texto de Myriam Gaspar
Dia 1: O futuro do atual modelo de Segurança Social
Dia 2: Soluções para o presente
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