Outrora uma potência, a Argentina está em declínio há décadas. Na origem de queda está a vontade dos sucessivos governos em gastar cada vez mais, apesar da falta de meios financeiros.
Várias vezes vítimas dos excessos de Buenos Aires e dos incumprimentos da Argentina, os investidores estão relutantes em financiá-lo e o acesso aos mercados de dívida é limitado.
Em seis décadas, a Argentina teve de acordar por mais de 20 vezes linhas de crédito junto do Fundo Monetário Internacional. É, de longe, o maior “cliente” do FMI.
A incapacidade de gerir as finanças públicas tem sido devastadora para a economia. Em 1992, a Argentina experimentou um novo rumo, fixando o valor do peso ao do dólar americano.
Manteve esta paridade até 2002, mas apenas à custa de artifícios como o corralito (limitação dos levantamentos bancários) e o corralón (conversão forçada de contas bancárias em dólares americanos para pesos, a uma taxa desfavorável ao aforrador).
Desde então, o valor do peso colapsou. Hoje, o câmbio oficial é de 1 dólar para 350 pesos. O “dólar azul”, uma taxa de câmbio não oficial, mais próxima do valor real está em cerca de 1 dólar para 1060 pesos!
Um fenómeno que faz disparar a inflação (excede 140%!), destrói o poder de compra das famílias e torna extremamente difícil investir (a taxa diretora é de 133%!).
No segundo trimestre, o PIB da Argentina caiu 4,9% em termos homólogos.
Reformas na ordem do dia
Javier Milei pretende romper com o passado. Por exemplo, quer cortar a despesa pública em 15%, reduzindo as transferências do governo federal para as províncias, reorientar os subsídios diretos às famílias, privatizar as obras e as empresas públicas (media, transportes aéreos, energia, etc.).
Trata-se de um programa ambicioso, mas cuja execução não será fácil. O Congresso argentino permanece, em grande parte, hostil a Milei.
O novo presidente está condenado a uma coabitação que promete ser difícil. Além do seu programa não ser consensual, o seu estilo ainda é menos e será complexo encontrar as maiorias necessárias para levar a cabo as reformas.
Num país onde 40% da população vive abaixo do limiar da pobreza, a redução das transferências para as províncias e o redirecionamento dos subsídios estatais é muito delicado.
Milei terá pouco tempo.
‘Dolarização’: uma panaceia?
A dolarização resolverá magicamente os problemas da Argentina? Ao optar pelo dólar, o país ganha um risco cambial reduzido e crédito muito mais barato.
A indústria, parte da qual está paralisada devido à falta de divisas para importar componentes, sai beneficiada.
Mais importante, a dolarização impedirá o banco central da Argentina de imprimir dinheiro para que o Estado gaste excessivamente como no passado.
Em suma, promete maior credibilidade e é um travão contra os excessos do passado. Porém, há sérias questões. Em primeiro lugar, seriam necessários cerca de nove mil milhões de dólares para fazer esta transição.
A Argentina, cuja maior parte das reservas cambiais é constituída por empréstimos da China e do Qatar (para reembolsar o FMI) terá dificuldade em encontrar esse dinheiro.
E qual será a taxa de câmbio da transição? À taxa oficial, o peso está claramente sobrevalorizado em relação ao dólar, o que penalizaria a economia nos próximos anos.
Acima de tudo, a Argentina vai abolir o seu banco central e “entregar" a política monetária à Reserva Federal dos EUA, privando-se de um instrumento de ajuste.
Entre 1992 e 2002, quando vigorou a paridade entre o peso e o dólar, a moeda Argentina valorizou-se em relação às dos vizinhos e parceiros comerciais, o que resultou numa forte perda de competitividade do setor industrial.
Com a dolarização, a Argentina corre novamente esse risco.
Conclusão
Exasperados por uma situação económica crítica há décadas, os argentinos sentiram que tinham pouco a perder e optaram pela mudança.
Tendo em conta o programa radical, a Argentina será alvo das atenções. Um sucesso para Javier Milei encorajaria outros países na América Latina e não só.
Um fracasso, lançaria a Argentina numa crise ainda mais profunda e a um descrédito do ultra-liberalismo económico. O risco é colossal. Fique afastado!