Análise

EUA: rumo ao "default"?

Publicado em:  18 maio 2023
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Autor:  Jorge  Duarte

Autor:  Análise da equipa internacional de analistas da Euroconsumers

No passado, o teto da dívida do governo dos EUA foi aumentado cerca de 90 vezes. Um procedimento cada vez mais difícil de implementar. Há motivos para recear o pior?

Em Washington DC, o fosso entre democratas e republicanos tornou-se abissal. De um lado, o presidente Biden gasta generosamente.

Estímulos fiscais de todos os tipos, um “plano de redução da inflação” que é, na prática, um upgrade dos EUA na transição energética, e gerou um défice orçamental médio em 2021/2022 de 9% do PIB.

Representando 121% do PIB, em 2022, a dívida pública dos EUA já preocupa e o problema terá de ser abordado mais cedo ou mais tarde.

Mas, para os republicanos, o objetivo não é apenas controlar as contas públicas no imediato. Cortar gastos e investimentos do Estado para reduzir o tamanho do governo é a prioridade.

Para aceitarem aumentar o teto da dívida, os republicanos querem forçar a Casa Branca a seguir também esse rumo. O plano para acordo que apresentam imporia uma redução da despesa pública (não-militar) de 47% numa década.

Essa imposição é suficiente para destruir o programa de Biden durante o atual mandato e especialmente o próximo ao qual é candidato.

Ao mesmo tempo, os republicanos sabem que a responsabilidade por uma falta de acordo e pelo incumprimento cairá sobretudo na Casa Branca.

Dada a polarização entre os dois maiores partidos norte-americanos e o clima de pré-campanha eleitoral, qualquer acordo é muito difícil.

Implicações para o sistema financeiro

As consequências do não levantamento do teto da dívida dependerão da forma como o Tesouro e a Reserva Federal gerem o dinheiro disponível e a dívida, respetivamente.

Durante as discussões da administração Obama, em 2011, a prioridade do Tesouro seria continuar a pagar a dívida, preferindo atrasar os vários pagamentos sociais e das agências estatais.

A razão é simples: a dívida dos EUA é uma das pedras angulares do sistema financeiro global e representa a maior parte das reservas cambiais de muitos países.

Uma falta de pagamento faria descarrilar a máquina financeira global e colocaria em questão o papel das obrigações soberanas dos EUA como um porto seguro.

E, neste momento, seria uma notícia ainda menos bem-vinda. Em primeiro lugar, dada a dimensão da dívida norte-americana e a retirada gradual da Reserva Federal dos mercados, os Estados Unidos estão mais dependentes dos investidores estrangeiros para se financiarem.

Uma maior diversificação das reservas cambiais globais e a procura menos sustentada de dívida dos EUA resultaria, por conseguinte, em juros mais elevados para financiar o Tesouro americano.

O crédito mais caro impactaria a dívida pública, mas repercutir-se-ia também por todo o financiamento da economia americana.

Em segundo lugar, porque ao minar a confiança na dívida dos EUA, equivaleria a corroer o estatuto do dólar e a dar novos argumentos aos países que estão contra a hegemonia da nota verde.

Não é novidade que a China, entre outros, procuram contornar a dependência do dólar e arranjar possíveis alternativas.

Dívida: fonte e solução do problema?

Considerando o que está em jogo, é uma aposta segura que qualquer incumprimento será de curta duração e que Washington se apressará para chegar a acordo.

Tanto mais que ninguém nega a capacidade e a vontade das autoridades americanas de continuarem a honrar a dívida. Mas mesmo que o incumprimento seja de curta duração, os investidores não podem ficar tranquilos.

Por conseguinte, é provável que os ativos de maior risco, como os mercados acionistas e, em especial, os setores altamente endividados, sejam afetados.

E resta a grande questão se, perante um incumprimento, a dívida dos EUA continuaria a desempenhar o seu papel de porto seguro.

No imediato, não seria impensável uma situação em que a dívida de longo prazo dos EUA saísse a ganhar de uma crise causada pelo seu próprio incumprimento no curto prazo.

Tanto mais que a Fed poderia intervir para comprar obrigações e suportar o mercado.

Conclusão

O bom desempenho do mercado de trabalho, com os salários a subir e a inflação a diminuir lentamente, está a sustentar a economia dos EUA.

O abrandamento previsto ainda não se vislumbra, o que comprova a resiliência da maior economia do mundo e parece convencer os investidores de que uma recessão é evitável.

Mas é verdade que o debate sobre o teto da dívida coloca um novo desafio e receios de um cenário menos favorável.

No limite, há razões para confiar na capacidade das instituições de defenderem os interesses dos EUA e do sistema financeiro global.

O Tesouro e a Reserva Federal irão adiar o mais possível um impacto sobre os mercados norte-americano e mundial em caso de incumprimento.

Portanto, continuamos a investir nos Estados Unidos, em ações e obrigações, e consideramos que não há motivos para alterar a sua estratégia de investimento, desde que já esteja bastante diversificada geograficamente e com exposição a diferentes moedas.

 

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