Enfrentar a perda de uma pessoa querida já é, por si só, um momento delicado. Infelizmente, a par da dor, surgem muitas vezes uma série de deveres burocráticos e fiscais. Um deles é a sucessão hereditária, que envolve também os investimentos do falecido. Com que impactos?
O que é a sucessão hereditária
A sucessão hereditária é o mecanismo legal através do qual são transmitidos os bens, direitos e eventuais dívidas de uma pessoa falecida aos seus herdeiros. Este processo garante a continuidade patrimonial, assegurando que o que pertencia ao falecido seja atribuído aos seus herdeiros ou legatários, de acordo com a lei ou com a sua vontade expressa.
A herança pode incluir bens móveis (ex.: dinheiro, joias, aplicações financeiras), imóveis (ex.: casas, terrenos), participações sociais, créditos, mas também obrigações e dívidas. Os herdeiros não recebem apenas “bens”, mas assumem a totalidade da posição jurídica do falecido: incluindo os investimentos.
Que quota lhe cabe dos investimentos?
Depende de vários fatores. Antes de mais, depende do tipo de sucessão:
Sucessão legítima
Ocorre quando não existe testamento ou quando o mesmo não engloba toda a herança. A lei determina quem são os herdeiros, em que proporção e com que prioridade. Os herdeiros legítimos são o cônjuge, os parentes e o Estado. Estes são chamados à sucessão pela seguinte ordem:
- cônjuge e descendentes (filhos ou netos, se não houver filhos);
- cônjuge e ascendentes (pais ou avós, se não houver pais);
- irmãos e seus descendentes (sobrinhos);
- outros colaterais até ao 4.º grau (primos direitos, tios-avós e sobrinhos-netos);
- se não houver herdeiros, a herança reverte para o Estado.
Sucessão legitimária
Corresponde à proteção legal conferida aos herdeiros legitimários. Mesmo existindo testamento, estes têm sempre direito a uma parte da herança — a chamada legítima ou quota indisponível. Se esta não for respeitada, havendo, por exemplo, testamento, as cláusulas que ultrapassem a quota são consideradas inválidas.
Sucessão testamentária
Ocorre quando o falecido deixou um testamento válido. A quota que lhe caberá pode ser diferente da que lhe caberia numa sucessão legítima, dependendo da vontade expressa no testamento. No entanto, deve ser obrigatoriamente reservada a legitima (ou quota indisponível) dos herdeiros legitimários (cônjuge, descendentes e, na falta destes, ascendentes).
Que passos deve seguir para entrar na posse dos investimentos do falecido?
Em Portugal, o procedimento sucessório inicia-se através de:
- Declaração de óbito (obrigatória, pode ser declarado online ou em qualquer conservatória do registo civil, no prazo de 48 horas após a morte);
- Habilitação de herdeiros (documento que identifica oficialmente os herdeiros do falecido sem o qual não é possível, por exemplo, movimentar uma conta bancária ou partilhar os bens), a qual pode ser feita no cartório notarial ou através do Balcão de Heranças;
- Declaração de imposto do selo (deve ser feito pelo cabeça-de-casal a quem compete a administração do património até à partilha dos bens).
No plano fiscal, a herança está sujeita a Imposto do Selo, à taxa de 10%, mas os herdeiros legitimários (cônjuge, unido de facto, descendentes e ascendentes) estão isentos.
Já outros herdeiros (irmãos, sobrinhos, entre outros) estão sujeitos ao imposto salvo se os bens estiverem isentos (créditos provenientes de seguros de vida e valores aplicados em fundos de poupança-reforma, por exemplo).
É sempre necessário recorrer a um notário?
Não é sempre obrigatório recorrer a um notário. Muitos atos podem ser tratados no Balcão de Heranças (habilitação de herdeiros, por exemplo), ou, dependendo da complexidade das matérias pode ser aconselhável recorrer a um advogado.
Contudo, a intervenção de notário é necessária em caso de processo de inventário nomeadamente quando:
- não há acordo entre os interessados;
- existem dúvidas sobre os bens que constituem a herança;
- se opta pela aceitação da herança com benefício de inventário.
O processo decorre obrigatoriamente em tribunal em determinados casos: por exemplo, quando é necessário assegurar a defesa dos interesses de menores ou maiores acompanhados.
Texto de Sofia Lima.