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“Bolsas ao rubro, redobre a prudência”

joao sousa

A inteligência artificial manteve-se a força motriz dos mercados bolsistas

Publicado em: 16 dezembro 2025
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joao sousa

A inteligência artificial manteve-se a força motriz dos mercados bolsistas

Em entrevista a Myriam Gaspar, João Sousa, coordenador da DECO PROteste Investe, alerta que, embora não se perspetive uma bolha nos mercados, convém reduzir o peso excessivo das ações com mais risco e reforçar nos setores mais defensivos.

Como descreve o desempenho dos mercados acionistas em 2025?

Foi o terceiro ano consecutivo de ganhos significativos nas bolsas. Os principais mercados bateram máximos históricos. O índice americano S&P 500 subiu 16,4% em moeda local, desde o início do ano, enquanto o mais tecnológico Nasdaq ganhou 21,9%.

Na Europa, o Stoxx Europe 600 ganhou 13,9%. A bolsa de Frankfurt recuperou 20,8% e Lisboa 28,6%. As incertezas económicas e as baixas avaliações estão a levar os investidores a recorrer a ações mais defensivas, como os serviços públicos (+24,3) ou as telecomunicações (+11,7%). O setor bancário europeu (+56,8%) e a defesa (+79,1%) estão nos primeiros lugares do pódio no velho continente.

Com procura pouco dinâmica e dificuldades em gerir a transição para a motorização elétrica, o setor automóvel europeu ganhou apenas 6,5%. A nível global, o índice valorizou 18,8% medido em dólares (5,8%em euros). Em grande destaque esteve também o setor da mineração do ouro (96,1%) que beneficiou da valorização do ouro em 59,4% em dólares (42% em euros).

Apesar das tensões comerciais com os EUA, a economia chinesa conseguiu crescer 4,8%, próximo do objetivo de 5%. A recuperação tecnológica permitiu ao índice da bolsa da China ganhar 19,9% desde o início do ano.

Talvez o que mais surpreendeu foi, desde logo, a forte resiliência da economia global num contexto de ameaças ao comércio mundial com as tarifas decretadas por Trump, e os seus sucessivos avanços e recuos. Também surpreendente, no mercado cambial, foi a perda muito acentuada de valor do dólar (-11% face ao euro).

Quais foram os principais motores de valorização ou de volatilidade ao longo do ano?

A inteligência artificial manteve-se a força motriz dos mercados bolsistas. O setor tecnológico dos EUA registou um ganho de 15,9%, enquanto o setor dos semicondutores valorizou 30,7%. O aumento vertiginoso do investimento em IA favoreceu grandes nomes como a Nvidia, a Alphabet e a Intel.

Pelo lado negativo, as ameaças de guerras comerciais dos Estados Unidos anunciadas pelo Presidente Trump, no dia 8 de abril, aumentaram a volatilidade.

Houve inúmeras análises sobre o seu impacto no crescimento económico global, na inflação, e sobre o risco de haver uma recessão nos EUA. Felizmente, não se confirmaram. A economia americana deverá apenas abrandar, e o cenário de uma aterragem suave é favorável para o mercado acionista norte-americano.

Por sua vez, a Europa continua a sofrer de um crescimento fraco, apesar de a Alemanha ter aprovado um novo plano que permite o aumento da despesa com o investimento em infraestruturas e em defesa. A surpresa positiva vem dos países emergentes, que regressaram à linha da frente.

Quais são as suas principais previsões para os mercados financeiros em 2026?

A resiliência da economia global que se registou em 2025 foi crucial, e consideramos como mais provável para o próximo ano um cenário de estabilidade. Depois de o PIB mundial ter crescido 3,3% em 2024, em termos reais, este ano deverá registar um crescimento de 3,2%, segundo o FMI. Para 2026 e 2027, estima 3,1% e 3,2%, respetivamente.

Desde que a inflação se mantenha estável, a Reserva Federal poderá cortar novamente as taxas de juro em 2026, o que é positivo para as ações.

A IA continuará a ser um tema que vai abalar e estimular os mercados. Após a forte valorização do setor das empresas tecnológicas no último ano, acreditamos que o ritmo de crescimento dos ganhos poderá abrandar. Nada que ponha em causa o potencial e as promessas desta tecnologia, mas é crucial ser seletivo na escolha das empresas que mais podem beneficiar do boom da IA.

Importa também evitar uma eventual sobre-exposição ao setor das tecnológicas, pois deve ter em conta que este já representa cerca de 36% do principal índice de ações norte-americano, o S&P 500.

Além disso, os investidores podem passar a ser mais cautelosos e tentados a realizar mais-valias dos títulos que mais valorizaram e se tornaram caros, pelo que o setor pode vir a sofrer uma correção significativa.

Os investidores podem usar qualquer pretexto (IA, tensões entre a China e os Estados Unidos, inflação, etc.) para vender ações que já subiram bastante. Continuamos atentos à valorização deste setor e recomendamos que deve evitar os efeitos da moda que podem mudar rapidamente. Quando se trata de investir, assumir riscos (muito) grandes é frequentemente catastrófico.

O cenário macroeconómico é mais conservador para a Europa, que nos parece não ter trunfos suficientes para merecer ser incluído na nossa carteira de fundos, com exceção da Polónia, pela dinâmica do seu mercado interno.

A valorização média do PER, que é mais baixa na Europa do que nos EUA (14 vezes os lucros versus 22 vezes), reflete, na nossa opinião, o menor potencial de crescimento dos lucros do que nos Estados Unidos, embora esperemos uma melhoria em 2026.

Se a Europa repetir 2025 e tiver um ano positivo no mercado bolsista, será não pelo fraco desempenho da sua economia, mas pelo maior dinamismo de alguns dos seus setores de atividade (defesa, bancos, etc.), ou pelo facto de os investidores procurarem alternativas às ações norte-americanas.

As bolsas estão sobrevalorizadas?

É certo que alguns mercados valorizaram muito e estão um pouco esticados, com um rácio cotação/lucro esperado acima da média dos últimos 30 anos, como é o caso dos EUA, mas o impacto da inovação e das empresas de tecnologia e IA de elevado crescimento podem justificar múltiplos mais elevados.

Por outro lado, até agora, os resultados das empresas, em geral, não têm desapontado. Portanto, de uma forma geral, a valorização média atual não parece (ainda) alienada dos fundamentais económico-financeiros.

Por último, a economia global está bem, embora permaneçam ameaças não resolvidas, como as tarifas, a economia dos EUA mantém-se sólida. Em suma, consideramos que ainda não estamos numa fase de bolha global do mercado, que poderia rebentar a curto prazo com quedas abruptas, rápidas e muito acentuadas.

Contudo, devido à forte valorização das principais bolsas, há quem se interrogue se estaremos à beira de uma correção significativa dos mercados. Mas a questão não é se haverá uma correção, mas sim quando é que ocorrerá. É impossível determinar o momento exato. Por isso, sair do mercado e vender prematuramente não é a solução, pois pode passar ao lado de um período de ganhos.

Quais os setores mais promissores para investir?

Destacamos o setor dos cuidados de saúde, que beneficia do crescimento da população mundial e do aumento da longevidade, com a prevalência de doenças crónicas e o combate à obesidade, e o setor das utilities – bens essenciais, como água, eletricidade ou gás.

Estas atividades, desenvolvidas em mercados maduros e fortemente regulamentados, distinguem-se por uma estabilidade significativa das margens com lucros mais estáveis. Além disso, este setor das utilities tende a beneficiar da atual conjuntura de taxas de juro mais baixas.

Além destes dois setores mais defensivos, deve permanecer atento às empresas de semicondutores, cujo potencial é enorme. Beneficiam do boom IA e constituem a infraestrutura essencial para a transformação digital.

Outro setor a que deve estar exposto é a defesa, dado que, na última cimeira da NATO, foi decidido que os membros europeus da organização devem dedicar 5% do seu produto interno bruto (PIB) à defesa comum. No final de 2024, a média europeia era de apenas 1,9% do PIB.

Para identificar as melhores ações para investir, deve avaliar as perspetivas de crescimento e de resultados da empresa, utilizando indicadores que comparam o preço do título com o seu desempenho económico-financeiro.

Toda essa informação (e muito mais) está disponível no comparador de ações da DECO PROteste Investe. Esta ferramenta tem informação essencial para ajudá-lo a fazer boas escolhas e construir uma boa carteira de investimento. A DECO PROteste Investe acompanha diariamente quase 150 ações nacionais e internacionais.

Perante um cenário de incerteza combinada de tarifas, política monetária e avanços tecnológicos, que conselhos dá aos investidores?

Tendo em conta que os mercados estão ao rubro, próximos dos máximos atingidos recentemente, o investidor deve redobrar a prudência. O momento é propício para fazer o balanço do ano e verificar a carteira. Se tiver uma exposição excessiva a ações de maior risco, como as tecnológicas que mais subiram, pode aproveitar para vender parte dessas ações e investir em setores mais defensivos, como os cuidados de saúde e as utilities, como já referi.

De qualquer forma, deve diversificar e não colocar todo o dinheiro em ações, aplicando apenas o capital que tem a certeza de que não irá precisar durante um prazo de, pelo menos, cinco anos. Este é o horizonte temporal mínimo aceitável para que o risco das ações não seja demasiado elevado e seja compensado pelo maior rendimento. Por fim, deve investir com a razão e não se deixar levar pela emoção.

No caso de haver uma correção de mercado, nunca é boa solução vender tudo em pânico após as quedas. Pelo contrário, se depois da correção mantiver a estratégia de investimento de longo prazo, isso irá permitir beneficiar da retoma do mercado.

Esteja atento aos mercados e às notícias sobre as empresas em que investe, e aceda primeiro às nossas análises e conselhos na App e aqui na nossa página online.

 

Entrevista de Myriam Gaspar 

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