
Os meses de novembro e dezembro são marcados por um grande aumento na compra de diferentes equipamentos. As razões são várias: é uma época de promoções, como a Black Friday, há o desejo de presentear alguém ou, ao receber o subsídio de Natal, surge a oportunidade para comprar algo que faz falta. Mas o que acontece aos equipamentos que são substituídos? Quando ainda funcionam, há quem os dê ou guarde. Caso contrário, o destino é, em regra, o centro de reciclagem.
Se é daqueles consumidores que guardam o que ainda funciona, é provável que tenha vários aparelhos em casa, que não usa e que só estão a ocupar espaço. Um exemplo muito comum é o telemóvel: quantos tem arrumados numa gaveta?
Se chegou a altura de dar um destino aos equipamentos que ainda funcionam, saiba que há um local onde os pode entregar: o Banco de Equipamentos. Ligado ao Banco Alimentar contra a Fome, e a funcionar apenas em Lisboa, recolhe todo o tipo de aparelhos, mesmo os que já não funcionam.
Com a ajuda de estagiários e voluntários, procura recuperar o que for possível, para entregar a Instituições Particulares de Solidariedade Social (IPSS) que deles necessitem. Para saber mais sobre este espaço, a DECO PROTeste entrevistou Afonso Pinheiro, seu coordenador-geral.
Porquê um banco de equipamentos?
Primeiro, surgiu a necessidade de abrir um banco de bens doados, para lutar contra o desperdício, aproveitando materiais excedentes das empresas, e até de alguns particulares, para distribuir por IPSS. Contudo, percebemos, desde logo, que, quando eram feitas entregas de bens, havia muitos equipamentos elétricos e eletrónicos. Estes, pela sua especificidade e pelo seu trato, precisavam de um cuidado especial, não só pelo tipo de pessoas que os podem manusear, para reparar ou com vista à sua utilização, como pelo check-up que é necessário. Neste sentido, era preciso uma cadeia logística diferente da do banco de bens doados. Por outro lado, verificámos que tudo o que são equipamentos elétricos e eletrónicos é extremamente necessário para as instituições e tem, também, um valor muito elevado. Por fim, constatámos que havia um enorme desperdício de equipamentos elétricos e eletrónicos, devido à evolução rápida da tecnologia, que leva à existência de um fast consuming: todos os anos, saem modelos novos, que levam a um maior consumismo por parte dos cidadãos. Por esta razão, há um enorme desperdício daquele tipo de equipamentos. Por exemplo, as empresas trocam o parque informático a cada três ou quatro anos. E, muitas vezes, os aparelhos são guardados em arrecadações ou enviados para o lixo.
Criámos o Banco de Equipamentos em 2008, para não só permitir a reutilização dos mesmos por parte das instituições, como também para ajudar a tornar a reciclagem eficiente. Afinal, é muito diferente enviarmos um ecrã inteiro para um parceiro, como resíduo elétrico ou eletrónico, ou fazermos a separação por componentes. Contudo, a nossa prioridade é reutilizar. Caso não seja possível, então, fazemos a reciclagem. Daí a ideia do Banco de Equipamentos, que, neste momento, é o nosso filho pródigo.
Como é feito o tratamento dos equipamentos doados?
Assim que recebemos os produtos, quer de particulares, quer de empresas, um responsável avalia cada peça como um todo, ou seja, se funciona ou não, se é passível de reparação ou se ainda é possível dar-lhe uso. O que significa? Se for uma televisão daquelas muito antigas, mas que ainda funciona, tentamos analisar se é passível de reutilização ou não. Provavelmente, já não se aproveita, porque, entretanto, com a TDT, muitas não têm as entradas necessárias. Apesar de até funcionarem, não estão aptas para o mercado atual. Daí a importância da triagem.
O responsável, depois, encaminha os aparelhos para os nossos estagiários. Há um responsável, e trabalhamos com uma bancada de formação, onde se incluem diversos estagiários, que darão o seguimento às peças, seja a separação, seja a testagem.
Os estagiários são pessoas em formação?
Sim, pessoas de cursos de formação profissional, mas não só. Posso afirmar que, aqui, recuperamos produtos, mas também recuperamos pessoas, pois ajudamos na sua reinserção no mercado de trabalho. E, quando se trata de reinserção, diz respeito não só a pessoas com problemas socioeconómicos, ou seja, pessoas pobres, como também com problemas de drogas ou de alcoolismo, ou mesmo ex-presidiários. No fundo, trata-se de pessoas que têm problemas e que precisam de ajuda para se reinserirem na sociedade. Assim, temos duas componentes: os estagiários, que vêm de escolas de formação, e as pessoas que têm problemas sociais, acima de tudo, e que precisam de ajuda, e nós alocamo-las ao Banco de Equipamentos.
Aqui, ajudamos com as regras relacionadas com o mercado de trabalho – pequenos aspetos, como o horário de entrada e de saída. Mas o facto de trabalharmos com produtos doados dá-nos uma certa liberdade. Se os estagiários estragarem alguma coisa, não há tanto problema, porque não é um computador de um cliente: é um aparelho que foi doado e no qual podemos substituir a peça danificada. Esta liberdade permite-nos receber qualquer tipo de pessoa, de forma a dar-lhe formação e uma oportunidade de se reinserir na sociedade.
Os equipamentos reparados são depois doados a várias instituições, certo?
Exatamente. Trabalhamos com um vasto universo de instituições. No fundo, a quase a totalidade das instituições inscritas e com estatutos para receber este tipo de apoio. Em 2022, foram entregues 431 computadores, 649 monitores e 225 outros aparelhos a 311 instituições nacionais. Apesar de estarmos em Lisboa, distribuímos equipamentos para todo o País. O que fazemos é muito simples.
Recebemos os artigos, que são testados e triados. Se forem passíveis de reparação e de reutilização, é colocado um código de barras, que permite saber de onde vieram e para onde vão. Para os nossos parceiros, esta ação é fundamental por uma questão de transparência, mas também é importante para nós, porque conseguimos perceber onde há mais necessidade.
Como podem as pessoas doar os seus equipamentos?
Se for um particular, basta aparecer no Banco de Equipamentos [Av. de Ceuta, Bairro da Quinta do Cabrinha, Armazém, em Lisboa] e colocar os aparelhos nas boxes de recolha que existem. É possível, por exemplo, doar telemóveis ou outros aparelhos que avariaram ou que funcionam, mas que simplesmente já não são usados. Nós tratamos do encaminhamento.
E se for alguém que não viva em Lisboa? Onde pode dirigir-se?
Para particulares, só temos este ponto de recolha específico. Contudo, muitas vezes, há empresas em todo o País que, no âmbito de recolha de resíduos elétricos e eletrónicos, colocam boxes onde se pode deixar os equipamentos. Estas boxes podem ser pedidas, por exemplo, a entidades públicas, para que seja feita a recolha localmente, e, depois, são elas que asseguram o transporte até Lisboa. O Banco de Equipamentos associa-se, com frequência, a estas iniciativas em todo o País. Embora seja uma logística mais difícil, é uma forma de alargarmos um pouco o nosso leque de atuação.
Que equipamentos são mais doados?
Dos particulares, os produtos mais doados são os óbvios, como impressoras e telemóveis, sobretudo. Também são entregues portáteis e computadores de secretária, embora menos, porque acho que ainda há muito o hábito de se guardar, quando se troca de computador, porque ainda pode vir a fazer falta. Mas, no fundo, nunca chega a fazer falta e, entretanto, o equipamento fica anos guardado e, quando cá chega, nem sempre pode ser reutilizado. Acima de tudo, o que as pessoas mais doam são telemóveis, impressoras e televisores antigos, porque também é aquilo que mais compram.
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