Os atrasos nos recebimentos são como um pequeno furo num barco de borracha. Se não for resolvido a tempo, pode fazer com que o seu negócio se afunde de vez.
Este problema é talvez o que causa mais dores de cabeça aos pequenos empresários nacionais. Um estudo da Dun&Bradstreet revela, por exemplo, que apenas 20,1% das empresas nacionais faz pagamentos dentro dos prazos. E 58,6% continua a pagar com 30 dias de atraso. A percentagem que cumpre entre 30 e 90 dias ronda os 9,6%. A 90 dias são cerca de 11,7%.
Se nada for escrito entre as partes, o prazo de pagamento é de no máximo sessenta dias. Prazo mais reduzido está estipulado para as entidades públicas, ou seja 30 dias, excepto as que prestam cuidados de saúde, aí o prazo pode ser alargado a 60 dias. Muitos gestores ao lerem estes dados vão decerto esboçar um sorriso amarelo, afinal o Estado português é o rei dos maus pagadores. A média do executivo ronda os 76 dias. Os clientes empresariais demoram 68 dias a pagar.
Há leis, faça valer os seus direitos!
Muitos pequenos empresários não sabem mas quando chega à data de pagamento e não recebem têm direitos. Por exemplo, têm direito a juros de mora de 8% (taxa revista semestralmente) acrescidos de uma indemnização pelos danos causados, cujo montante mínimo são 40 euros.
Para salvaguarda dos empresários está convencionado que não são admitidas quaisquer cláusulas contratuais que excluam aqueles direitos e que representem condições abusivas, como por exemplo prazos excessivos de pagamento.
Calcule o custo de crédito
Depois há mecanismos adicionais que permitem gerir melhor os recebimentos, embora os custos possam ser elevados. Antes de recorrer a esses mecanismos, compare-os com o custo de crédito e veja se compensam.
Para ter uma ideia mais concreta podemos desenhar o seguinte cenário: se os seus clientes tiverem uma média de pagamentos de 60 dias, as vendas anuais da sua empresa forem de 300 mil euros e a taxa de juro se mantiver nos 8%, o custo do seu crédito será 3945.20 euros. Note que este valor tende a ser superior, uma vez que há clientes que ultrapassam o prazo médio e cuja cobrança das dívidas implica um custo adicional. Veja se compensa!
Factoring como boia de salvação
Para fugir ao mar de dividas há boias de salvação. Uma delas é o factoring; a sua empresa pode vender um conjunto de créditos de curto prazo dos seus clientes a uma empresa de factoring.
Ao fazê-lo recebe os valores em dívida mas é importante referir que apenas o factoring sem recurso assume todos os riscos. Isto é, caso os devedores não paguem a fatura a sua empresa não será lesada. Se optar pelo factoring com recurso aí a empresa de factoring fará apenas adiantamento do pagamento e prestará o serviço de cobrança. Se o devedor não pagar, a sua empresa terá de devolver o dinheiro.
Julien Letartre, um dos sócios das padarias Eric Kayser, diz que utiliza este instrumento. “É um bom sistema, uma vez que adianta o dinheiro. E exemplifica, um pequeno negócio que fature 100 mil euros e tenha uma fatura de 20 mil euros em cobrança, se fizer um contrato de factoring pode ser uma mais-valia porque fica de imediato com o dinheiro em caixa”.
Além disso, são dadas informações mais detalhadas sobre os clientes resolvendo grande parte dos problemas de tesouraria. Mas nada é de graça. Este serviço tem um custo que é mais elevado no factoring sem recurso. Implica o pagamento de juros correspondentes aos financiamentos concedidos, bem como é cobrada comissão pelo serviço e ainda imposto de selo.
Casa arrombada? Trancas à porta!
Pegando neste dito popular há empresários que optam pelos seguros de crédito, que servem para cobrir o risco de um não pagamento. Há uma avaliação da sua carteira de clientes e os que apresentam maior risco de incumprimento são excluídos de imediato.
Excluídas à partida ficam também as entidades públicas. Após ser atribuído um limite de garantia para cada um dos clientes é feita uma apólice. Com o contrato em vigor terá de pagar um prémio cuja periodicidade pode variar de mensal, semestral ou anual. Este engloba custos de avaliação, despesas de contencioso e custos do prejuízo a indemnizar.
Mónica Morais, Chief Governement Office da Systell, empresa de engenharia na área da produção animal, explica que já utilizou esta forma de contornar os atrasos nos pagamentos mas que não lhe serviu, uma vez que teve de manter os clientes que apresentavam maior risco para fechar negócios, logo os que estavam seguros eram os que à partida não lhe causariam problemas.
Garantias para quem exporta
Desengane-se quem pensa que este é um problema só português. Lá fora também há bons e maus pagadores. As PME nacionais exportam essencialmente para Espanha, França e Alemanha mas quem está no quadro de honra face a pagamentos são a Dinamarca, que ocupa o top com 87%, seguida da Alemanha e Hungria.
As empresas que vendem para fora podem proteger-se com o crédito documentário, um compromisso entre o banco emitente, que atua sob as instruções de um importador, que fica obrigado a efetuar o pagamento – à vista ou a prazo – ao exportador contra a apresentação de documentos, em conformidade com a carta de crédito. É uma espécie de garantia do pagamento a favor do exportador.
Mónica Morais explica que o problema surge nas “discrepâncias” entre as partes. A experiência ensinou-lhe que mais vale simplificar. A primeira carta de crédito que fez no valor de cerca de 8 milhões de euros, estava a empresa ainda no início do negócio, para um grande projeto na Arábia Saudita originou oito discrepâncias. Resultado? Se o cliente quisesse não teria pago. A empresária diz que basta faltar um original, ou algo semelhante, para colocar em causa tudo. E mais uma vez proteger o crédito tem custos. Neste caso a empresa pagou 70 mil euros.