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André
Gouveia, CFA
Analista financeiro independente, certificado pelo CFA Institute e registado na CMVM.
Mestre em Finanças pelo ISEG.
Assembleia de obrigacionistas TAP
Há 2 anos - 20 de agosto de 2020
André
Gouveia, CFA
Analista financeiro independente, certificado pelo CFA Institute e registado na CMVM.
Mestre em Finanças pelo ISEG.

avião tap
A TAP- Transportes Aéreos Portugueses está a convocar os seus obrigacionistas para uma Assembleia, a realizar à distância, no dia 14 de setembro. Caso não exista quórum, a Assembleia voltará a reunir-se no dia 30 de setembro.
A reunião terá 2 pontos em discussão. Primeiro, a nomeação de um representante comum dos obrigacionistas. Segundo, “deliberar sobre a renúncia pontual ao dever de manutenção da relação de grupo por domínio total entre a TAP – Transportes Aéreos Portugueses, SGPS e a Transportes Aéreos Portugueses, em resultado da potencial detenção, diretamente pelo Estado Português, de ações representativas do capital social da Transportes Aéreos Portugueses”.
Para contexto, o prospeto de emissão das obrigações previa, no seu ponto (viii) da secção 6.9.5, que uma das situações em que os detentores das obrigações poderiam pedir o reembolso antecipado do seu investimento era se “cessar a relação de grupo por domínio total existente entre o Emitente e o Acionista Único”. Domínio total, como definido no Código das Sociedades Comerciais, é uma situação em que entidade dominante detém a totalidade do capital social da sociedade dominada.
Recordamos que estamos perante duas entidades diferentes: a TAP SGPS é uma sociedade gestora de participações sociais que é o Acionista único da TAP, a transportadora aérea propiamente dita e que emitiu as obrigações.
Em resumo, a TAP SGPS detém a totalidade do capital social da transportadora aérea, de momento. Se parte do empréstimo do Estado à TAP for convertido em capital da transportadora aérea, a TAP SGPS deixa de ter 100% do capital daquela, verificando-se uma das condições que permite aos obrigacionistas exigir o reembolso antecipado. Foi convocada uma assembleia para escolher um representante dos obrigacionistas e pedir-lhes que abdiquem deste direito a exigir o reembolso antecipado das obrigações, aparentemente sem contrapartida.
Situação temporária?
Numa primeira análise, poderíamos considerar que os obrigacionistas não têm motivos para aceitar prescindir de um direito que lhes assiste, sem receber qualquer compensação por isso. É no entanto interessante que a proposta, ainda que vaga, mencione uma renúncia pontual a este direito. A nossa interpretação da situação é a seguinte:
- A conversão do empréstimo estatal em capital é praticamente dado adquirido. Como o empréstimo foi à TAP e não à SGPS, uma entidade ligada ao Estado Português vai ficar com parte do capital da TAP, cessando a relação de domínio total da SGPS;
- Mas a situação será apenas temporária, com o Estado a trocar essa participação por uma participação na TAP SGPS. Já foi convocada uma Assembleia Extraordinária de acionistas, para 3 de setembro, com vista a autorizar um aumento de capital na TAP SGPS, até ao valor do empréstimo do Estado. A TAP SGPS voltará a ter uma relação de domínio total com a TAP, e será por isso que a renúncia ao dever de manter esta relação é apenas pontual.
Sublinhe-se que, do ponto de vista prático, pouco muda: o Estado, por via da Parpública, já é o acionista maioritário da TAP SGPS. É uma questão sobretudo formal. Ainda assim, a verdade é que, mesmo sendo temporária, a operação parece permitir aos obrigacionistas pedir o reembolso antecipado do investimento, daí a convocação da Assembleia.
De um ponto de vista estritamente financeiro, recomendamos aos obrigacionistas que exerçam esse direito. Aquando da análise à emissão das obrigações, referimos que o rendimento subestimava o risco das mesmas, e os acontecimentos vieram a dar-nos razão.
A última cotação disponível na Euronext das obrigações da TAP era de 89,5%. Portanto, o reembolso ao par (100% do valor nominal das obrigações) permitiria aos investidores que foram à operação de subscrição recuperar a totalidade do valor investido. No entanto, exercer este direito, poderá não ser fácil.
Obrigacionistas ficam vinculados às decisões da Assembleia
Pela nossa experiência, neste tipo de situação, costumam acontecer duas coisas. Primeiro, os investidores institucionais, que acompanham profissionalmente os mercados, tendem a estar muito mais representados nas Assembleias que os pequenos investidores. Segundo, os investidores institucionais tendem a estar mais alinhados com as propostas das empresas nesta matéria, particularmente quando têm um governo por trás.
Os resultados da colocação das obrigações, de acordo com o comunicado da TAP, indicam a participação de 6905 investidores. Mas pouco menos de metade, 95 milhões de euros, terão sido colocados junto de 35 investidores institucionais, quase metade estrangeiros. Os restantes 105 milhões terão sido colocados junto de milhares de investidores do retalho.
Se os pressupostos anteriores se verificarem, basta que a maioria dos institucionais e uma minoria dos investidores do retalho votem a favor para que a proposta seja aprovada. Consideramos existir boas probabilidade de isto acontecer.
É um risco que temos apontado, no caso do investimento em obrigações: se a proposta for aprovada, aplicar-se-á a todos os obrigacionistas, mesmo os que não participaram ou tenham votado contra na Assembleia.
Mesmo que a proposta não seja aprovada, não é certo que a questão fique arrumada. Dada a situação financeira da TAP, o Governo não verá certamente com bons olhos ter que injetar capital adicional para que a empresa possa reembolsar os obrigacionistas. E sem apoio financeiro adicional, a TAP dificilmente terá condições para reembolsar, no limite, 200 milhões de euros.
Em resumo, consideramos que o reembolso antecipado seria o melhor desfecho para os pequenos obrigacionistas. Para isso teriam que votar contra a proposta e, concretizando-se a transformação do empréstimo em capital, exercer a sua opção de reembolso antecipado. Contudo, alertamos que há boas probabilidades de a proposta colocada a votação seja aprovada e fiquem assim impedidos de exercer esse direito.
O reembolso antecipado representaria um esforço financeiro difícil de suportar pela TAP nas circunstâncias atuais e, é preciso dizê-lo, uma nova injeção de capital público motivada pela necessidade de reembolsar investidores teria certamente custos “políticos”. Pelo que é provável que a empresa e o Estado tudo façam para evitar esse desfecho.
Se já tem esta obrigação e caso não seja aprovada a alteração em AG, solicite o reembolso antecipado. Se essa alteração for aprovada procure vender em bolsa por um valor acima de 90% e mais próximo do valor nominal. Há ainda outra situação em que poderá pedir reembolso antecipado: se houver incumprimento do rácio de Dívida Líquida Ajustada / EBITDAR Ajustado de 7 de acordo com os relatórios e contas anuais relevantes pelo Emitente (referentes a 2020, a publicar em 2021). Se não tem esta obrigação, não invista: mantenha-se afastado do título.
Regras para exercer a opção de reembolso antecipado
Os obrigacionistas têm 30 dias (corridos), após o evento em que se considera ter ocorrido o evento que o justifica, para exigir o reembolso antecipado. O exercício do direito não necessita de aprovação em Assembleia de obrigacionistas (mas, como referimos, ficará suspenso se a proposta for aprovada na Assembleia convocada).
Os obrigacionistas deverão comunicar a sua intenção, através de carta registada dirigida ao Conselho de Administração do Emitente e endereçada à sua sede social, devendo o Emitente proceder ao reembolso das obrigações no prazo de 10 dias úteis após o final do prazo de exercício do direito de reembolso antecipado (os 30 dias atrás referidos).
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