"Acreditamos que, genericamente, as refeições escolares têm qualidade"
À beira de um novo ano letivo, e indiferente às críticas, o responsável pela pasta da Educação traça um cenário essencialmente otimista em várias matérias, desde o avanço na desmaterialização dos manuais até à colocação dos professores, passando pela qualidade das refeições escolares e a abordagem do bullying e do cyberbullying.
- Editor
- Deonilde Lourenço

O ministro da Educação, Tiago Brandão Rodrigues, respondeu por escrito às perguntas que lhe enviámos e que abordam alguns dos temas com que trabalhamos há anos, ora através de estudos sobre a qualidade das ementas e das refeições servidas nas escolas, ora de investigações sobre, por exemplo, os malefícios do uso das mochilas com peso excessivo. No cargo desde 2019, e indiferente às críticas, descreve um regresso às aulas com um reforço do digital, dos instrumentos de combate ao bullying e à passagem das cantinas para a alçada dos municípios.
Para aliviar a carga das mochilas, a desmaterialização dos livros é essencial. Após a experiência com manuais digitais em dez escolas, quais as principais conclusões?
O projeto-piloto dos manuais digitais tem gerado dados muito interessantes. Na generalidade das escolas, professores, alunos e famílias manifestam que os manuais digitais trazem ganhos, não apenas nos recursos que potenciam, mas também na motivação dos alunos. A generalização destes instrumentos acompanhará a digitalização das escolas. Por agora, prepara-se o segundo ano do projeto-piloto. Além deste piloto, as escolas têm vindo a utilizar, cada vez mais, novas tecnologias e suportes digitais. De resto, o Ministério da Educação também passou a disponibilizar aos alunos o acesso a licenças digitais dos manuais, no âmbito do programa de gratuitidade de manuais escolares. Paralelamente, é de referir a existência de cacifos na grande maioria das escolas, bem como a campanha de prevenção e sensibilização “Mochila Leve”, que lançámos em 2019. No site MEGA encontrarão dezenas de recomendações para o alívio do peso das mochilas.
A adaptação dos conteúdos programáticos em temas como economia circular, mobilidade sustentável, literacia digital, financeira e energética e fake news é uma prioridade?
Os referidos temas, entre outros que marcam os desafios da vida nas sociedades atuais, já constam das orientações curriculares e têm vindo a ser trabalhados, com cada vez mais intensidade e qualidade, nas nossas escolas. Em 2017, com base num amplo trabalho de auscultação e reflexão coordenado por um grupo de peritos, foi publicado o Perfil dos Alunos à Saída da Escolaridade Obrigatória, que dotou as orientações curriculares de uma nova ambição e intencionalidade, consentânea com as mudanças globais que hoje enfrentamos e as novas oportunidades e desafios que criam à nossa vida individual e coletiva. Desde então, temos vindo gradualmente a enriquecer e a renovar as orientações curriculares, de acordo com essa visão, em estreita colaboração com as associações de professores, e valorizando a autonomia das escolas. Em 2018, foi introduzida a área curricular de Cidadania e Desenvolvimento, na qual esses temas podem ser trabalhados de forma mais estruturada, através de projetos, em articulação permanente com os conteúdos das diferentes disciplinas. Reconhecendo igualmente que o Governo anterior havia imposto programas demasiado extensos, foi realizado um trabalho alargado com as associações de professores e as escolas para identificar quais as aprendizagens essenciais e, precisamente, criar condições para que estas sejam trabalhadas com maior rigor e profundidade, de acordo com as mudanças que estão a ocorrer na sociedade e que implicam trabalhadores e cidadãos atentos, críticos, reflexivos, criativos e solidários.

Quais os planos para lidar com o bullying e o cyberbullying? Qual o ponto da situação do “Plano de Prevenção e Combate ao Bullying e ao Ciberbullying”? Que resultados foram alcançados?
Temos vindo a reforçar os instrumentos para lidar com estes fenómenos de forma pedagógica, trabalhando com as escolas para ter alunos mais informados, conscientes e responsáveis. Aliás, o referido Perfil e melhorias que temos vindo a introduzir no currículo pretendem criar essa escola de cariz mais humanista, na qual crianças e jovens se sintam bem e aprendam a respeitar-se e aos adultos, pois são essas as condições em que se aprende melhor e se formam cidadãos. O Plano de Prevenção e Combate ao Bullying e ao Ciberbullying teve uma excelente receção em muitíssimas escolas e tem vindo a contribuir para esse desígnio.
Quantas escolas foram distinguidas pelas boas práticas?
Temos apostado no reconhecimento do bom trabalho realizado e na partilha de boas práticas, pois são muito importantes, mas não se pretende fazer qualquer ranking nesta matéria. Cada comunidade educativa é única, pelo que a nossa abordagem passa por apoiar cada escola a encontrar a melhor estratégia para construir e preservar uma comunidade educativa forte, mobilizada e assente em valores positivos como a inclusão, a entreajuda, a colaboração e a ética.
Há queixas sobre a qualidade das ementas das cantinas e, em particular, sobre a diferença entre as do 1.º ciclo e do 2.º e 3.º ciclos e secundário. Terá que ver com o facto de as primeiras estarem sob a tutela das câmaras municipais e as segundas sob a do Ministério da Educação?
A avaliar pelo número residual de queixas que têm chegado ao Ministério da Educação, acreditamos que, genericamente, as refeições escolares têm qualidade. Há, aliás, vários estudos científicos que demonstram que as crianças e os jovens que fazem refeições nas escolas apresentam uma ingestão alimentar diária de elevada qualidade.
Efetivamente, com a transição paulatina de competências para os municípios, também no âmbito do processo de descentralização de competências, a confeção, a verificação da qualidade e a composição das refeições estão já a cargo das autarquias na educação pré-escolar e no 1.º ciclo. Quanto ao 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ao ensino secundário, estas competências já se encontram, nalguns casos, nas autarquias, sendo da responsabilidade dos serviços do Ministério da Educação, nos restantes casos. A partir da primavera de 2022, a grande maioria destas competências estará nas mãos dos municípios.
Como está pensado resolver-se a falta de nutricionistas?
As ementas são, nalguns casos, elaboradas com o apoio de nutricionistas (seja dos centros de saúde, que integram as equipas de saúde escolar, das autarquias ou do Ministério da Educação) e há técnicos que acompanham e monitorizam as refeições escolares, nomeadamente a qualidade e o cumprimento das capitações, estando ainda prevista a colaboração de outras entidades.
Há alterações previstas devido à covid-19?
No atual quadro de pandemia, a organização das escolas – incluindo o espaço das cantinas e o tempo de refeições – tem seguido as orientações definidas pelas autoridades de saúde.
A lentidão e a burocracia na substituição de professores e a falta de docentes nalgumas disciplinas é recorrente. Há também queixas de falta de pessoal auxiliar. Que soluções estão a ser estudadas?
Num sistema com mais de cem mil professores, distribuídos por diversas áreas de especialidade e por milhares de escolas, em todos os municípios do País, é inevitável surgirem questões pontuais ao longo do ano. Ainda assim, desde 2016, conseguimos iniciar todos os anos letivos de forma totalmente tranquila, o que não era habitual em períodos anteriores. Reduzimos os tempos de substituição de docentes, através da bolsa centralizada que semanalmente distribui professores pelas escolas. E, nos casos em que não o consegue fazer, foi dada autorização às escolas para imediatamente realizarem um processo de contratação local ou de pagamento de horas extraordinárias a docentes que já lecionam nessa escola. Além disso, têm sido atribuídas muitos milhares de horas extra às escolas para professores que desenvolvam programas de promoção do sucesso escolar. Estas várias medidas têm reflexo nas estatísticas mais recentes, as quais evidenciam, efetivamente, um acréscimo de 7000 docentes nas escolas públicas do Continente, no período de 2016 a 2020, apesar de a demografia impor menos crianças e jovens do que em gerações anteriores. Isto significa um investimento público significativo e que permite aos nossos alunos disporem hoje de um melhor acompanhamento por parte dos professores do que no passado recente.
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