Compras nos sites PT Electrónica e Gtech geram centenas de reclamações

Centenas de reclamações chegaram à DECO PROTESTE nos últimos meses denunciando alegadas práticas duvidosas dos sites PT Electrónica, Gtech, TV Market e ElectroSales.

Em todas as queixas reportadas, a descrição dos acontecimentos assume o mesmo padrão: os consumidores dizem ter comprado produtos eletrónicos, como telemóveis ou televisores, nestes sites que ofereciam produtos a preços bastante competitivos. Mas, depois de encomendarem, terão aguardado várias semanas pela chegada dos artigos, que acabaram por nunca chegar. Cansados de tanto esperar, os consumidores cancelaram as encomendas, mas o reembolso do valor já pago também nunca foi feito.

Só na plataforma Reclamar da DECO PROTESTE, foram recebidas, entre janeiro de 2022 e fevereiro de 2023, 893 reclamações relacionadas com compras na PT Electrónica, 130 das quais apenas nos primeiros dois meses deste ano. Já da Gtech foram reportadas à DECO PROTESTE 399 queixas no mesmo período.

Ao que a DECO PROTESTE apurou, pelo menos 43 clientes da Gtech e 25 da PT Electrónica terão já recorrido a centros de arbitragem de conflitos de consumo, para verem reconhecido o seu direito ao reembolso em dobro. Nenhuma das entidades visadas terá comparecido às sessões, e os centros de arbitragem deram razão aos consumidores. No entanto, apesar das sentenças favoráveis, muitos dos consumidores lesados não conseguiram ainda receber qualquer quantia.

O descontentamento dos consumidores tem vindo a subir de tom e está espalhado em várias páginas de internet. O número de clientes que se dizem “enganados” pela Gtech é tão elevado que já motivou a abertura de uma petição pública assinada por mais de 200 signatários. Os lesados pedem ao Ministério Público que investigue a plataforma por alegado “cibercrime”.

O mesmo empresário por trás da venda de produtos eletrónicos em "dropshipping"

PT Electrónica e Gtech são sites que vendem produtos eletrónicos, mas não correspondem a lojas que tenham tais produtos nos seus armazéns. Ambos os sites atuam no mercado de "dropshipping", funcionando apenas como intermediários de vendas, que encaminham as encomendas a outros fornecedores do produtos. Ou seja, na prática, só quando alguém compra um televisor no site da PT Electrónica é que a empresa que mantém este site faz a encomenda de tal produto ao seu fornecedor. De acordo com o relato dos consumidores, a resposta mais comum era a de que o produto já não estava disponível para entrega e seria preciso esperar.   

O site PT Electrónica é propriedade da Compatible Serenity, empresa criada em 2019 por André Filipe Santos da Silva, que era também, na época, o único gerente da empresa. Esta empresa detém também o site CSProservice, que vende produtos eletrónicos para o mercado empresarial.

Menos de um ano depois de ter criado a Compatible Serenity, o empresário André Filipe Santos da Silva fundou a Gracious Transparency, que detém os sites Gtech, TV Market e ElectroSales, todos dedicados à comercialização online de produtos eletrónicos. E de todos eles a DECO PROTESTE tem registo de queixas sobre produtos não recebidos e encomendas canceladas que não foram devidamente reembolsadas.

Em fevereiro de 2022, a gerência da Compatible Serenity passa para as mãos de Sara Maria Santos da Silva. 

Entretanto, a DECO PROTESTE continua a receber queixas de todos estes sites, com especial incidência nos sites PT Electrónica e Gtech. No início de março, todos estes sites de venda de produtos eletrónicos continuavam a funcionar e a aceitar encomendas.

PT Electrónica diz que reembolsos são pagos

A DECO PROTESTE conseguiu contactar telefonicamente a PT Electrónica. Do outro lado da linha, veio a indicação de que apenas seriam respondidas questões por escrito. E chegaram, de facto, algumas semanas depois, através de Sara Santos Silva, gerente da Compatible Serenity. Confrontada com o elevado número de reclamações do site PT Electrónica, Sara Santos Silva explica que a empresa “efetua centenas de vendas por mês” e que, por esse motivo, “existe sempre um número de incidentes que, embora represente uma percentagem pequena das operações, pode parecer elevado em número absoluto”.

Questionada sobre as razões pelas quais as encomendas não terão sido entregues aos clientes, a gerente da Compatible Serenity aponta várias justificações: falta de produto disponível no fornecedor; problemas logísticos, como o facto de a transportadora aguardar que “o número de produtos para uma dada cidade seja maior” para, então, fazer a entrega; produtos danificados no transporte que obrigam a uma nova aquisição; ou ainda o cliente não estar em casa quando a transportadora lá passa para entregar os artigos.

Perante o elevado número de cancelamentos de encomendas e consequentes pedidos de reembolsos que não terão sido pagos, Sara Santos Silva garante que “os reembolsos são sempre pagos”, acrescentando que “muitas vezes os clientes não cumprem o procedimento de reembolso que está bem explícito no site, limitando-se a mandar um e-mail, não fazendo o pedido formal”.

“Outras vezes não indicam o IBAN para a devolução”, alega a responsável da Compatible Serenity. “O que podemos afirmar é que os clientes são sempre reembolsados, a não ser que não deem as informações necessárias para o efeito ou já tenham sido reembolsados por um terceiro, por exemplo o banco ou a plataforma de pagamento”, explica Sara Santos Silva.

A DECO PROTESTE questionou ainda a Compatible Serenity sobre eventuais relações comerciais com a Gracious Transparency, do mesmo proprietário, e que opera em Portugal com sites similares e que gera reclamações de igual teor. Mas Sara Santos nega, por escrito, a existência de ligações entre as duas empresas.

A DECO PROTESTE tentou também contactar a Gracious Transparency, através do número de telefone disponibilizado no site da Gtech, para obter esclarecimentos, mas sem sucesso. Entretanto, o número de telefone deixou de chamar.

Atrasos superiores a 30 dias dão direito a reembolso

Além de alertar os consumidores para os elevados riscos que correm ao comprarem produtos em sites que geram tanto descontentamento dos clientes, a DECO PROTESTE lembra que quem compra produtos em lojas online está salvaguardado pela legislação que regula as compras à distância.

Se quiser anular a compra depois de o produto lhe chegar às mãos, tem 14 dias seguidos para comunicar a sua desistência, sem custos ou necessidade de indicar o motivo.

As lojas online devem indicar algumas informações obrigatórias: identidade do vendedor; características do produto ou serviço anunciado; preço com imposto, taxas, encargos suplementares de transporte, despesas postais ou de entrega ou outros encargos; meios de pagamento disponíveis; prazo de garantia; entre outros.

A encomenda deve ser enviada no prazo máximo de 30 dias, a contar do dia seguinte à realização de encomenda. Se este prazo for ultrapassado, o vendedor deve devolver o valor pago, no prazo de 15 dias úteis.

Se for estabelecida nova data prevista para a entrega da encomenda, o consumidor pode aceitá-la ou cancelar a encomenda e receber o dinheiro de volta. Neste caso, o vendedor tem 30 dias para efetuar o reembolso. Ultrapassado este prazo, o consumidor tem direito à devolução, em dobro, da quantia paga.

Confirme se o site é seguro

Antes de fazer uma compra numa plataforma eletrónica, analise a credibilidade do site, assim como dos preços dos artigos anunciados. Preços muito competitivos devem levantar suspeitas.

Se tem dúvidas quanto à veracidade de um site, use a plataforma “Este site é seguro?”. Criada para ajudar a evitar que os consumidores sejam vítimas de burlas e fraudes na internet, esta ferramenta da DECO PROTESTE permite determinar se um site ou link que recebeu, por exemplo, através de SMS ou e-mail é seguro. PT Electrónica e Gtech, bem como os restantes sites da Compatible Serenity e da Gracious Transparency, já constam da lista de empresas que a ferramenta "Este site é seguro?" identifica como não confiáveis. 

Pode, ainda, pesquisar no portal Reclamar eventuais queixas de outros consumidores sobre uma empresa. Já se fez uma compra online e tem motivos para reclamação, como encomendas não entregues ou reembolsos não efetuados, saiba que o que fazer.