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Greve dos professores: que motivos e como justificar faltas ao trabalho?

Os professores continuam em greve, prevendo-se que algumas escolas voltem a funcionar a meio gás ou possam encerrar. Explicamos o que reivindicam os professores, mas também os direitos dos encarregados de educação, obrigados a faltar ao trabalho por causa da greve, apesar dos serviços mínimos.

06 fevereiro 2023
professor com livros na mão em frente a quadro de ardósia numa sala de aula

iStock

O segundo período escolar do ano letivo 2022-2023 arrancou com um conjunto de greves nas primeiras semanas do ano. Depois da greve convocada pelo Sindicato de Todos os Professores (STOP) entre os dias 4 e 14 de janeiro, foi a vez dos sindicatos de professores ASPL, FENPROF, PRÓ-ORDEM, SEPLEU, SINAPE, SINDEP, SIPE e SPLIU marcarem greves, por ora, até 8 de fevereiro.

Professores pedem fim da precariedade

As organizações sindicais pedem que o Governo abandone a intenção de rever o regime de concursos de professores, apresentado pelo Executivo em setembro do ano passado. Em causa dizem estar “os problemas de carreiraprecariedadeenvelhecimento da classecondições de trabalho e proteção a docentes com doenças incapacitantes”, de acordo com um comunicado publicado no site da FENPROF. As negociações entre os sindicatos e o Governo têm estado a decorrer. No entanto, até chegarem a um entendimento, as organizações que representam os professores mantêm a greve.

Greve do pessoal não educativo pode encerrar as escolas

A greve limita o cumprimento dos deveres dos professores que a ela adiram ao máximo de 35 horas semanais de horário letivo. Como os professores têm uma carga horária semanal que ultrapassa, em regra, as 35 horas, as escolas podem não conseguir assegurar a continuidade de serviço e o apoio aos alunos. O objetivo dos professores é recusar o trabalho que vá além do que o professor está obrigado em termos de horário letivo, o que deixa de fora muitas funções que estes profissionais desempenham nas escolas, tais como reuniões de avaliação, reuniões gerais de docentes ou de conselho pedagógico, aulas de substituição de docentes ausentes ou qualquer atividade que coincida com os períodos dos intervalos.

Além disso, esta greve estende-se ao pessoal não educativo, o que implica, em caso de elevada adesão, o encerramento das escolas.

Com as escolas fechadas, muitos encarregados de educação têm de faltar ao trabalho para poderem acompanhar os filhos.

Serviços mínimos e direito à greve

A greve é um direito constitucional. A lei da greve prevê que, numa empresa ou estabelecimento destinados à satisfação de necessidades sociais indispensáveis, o pré-aviso de greve deve conter a previsão de serviços mínimos que assegurem essas necessidades. É o caso de correios e comunicações; serviços médicos, hospitalares ou medicamentosos; abastecimento de água; bombeiros; transportes; entre outros. Nos pré-avisos de greve entregues pelos sindicatos de professores não consta a previsão de serviços mínimos.

Os serviços mínimos devem obedecer a critérios de necessidade, adequação e proporcionalidade. A definição do que devem ser estes serviços pode obter-se de várias formas:

  • por instrumento de regulamentação coletiva (Convenção Coletiva de Trabalho ou outro);
  • por acordo (antes do pré-aviso) entre a entidade empregadora e o sindicato que convoca a greve;
  • por acordo entre as partes, celebrado no âmbito de negociação promovida pela Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT);
  • por despacho conjunto do ministro responsável pela área laboral e pelo ministro que tutela a área ou setor de atividade no caso de empresa do setor privado (por exemplo, no caso de greve dos Correios);
  • por decisão do tribunal arbitral, caso a empresa integre o setor empresarial do Estado (por exemplo, a CP).

Na greve dos professores, por não se ter chegado a acordo, o tribunal arbitral fixou serviços mínimos, a vigorarem a partir de 1 de fevereiro, para a greve convocada pelo Sindicato de Todos os Profissionais da Educação (STOP). Não podem ser determinados serviços mínimos que venham a pôr em causa uma greve decretada, por isso, os meios disponíveis serão os estritamente necessários para cumprir esses serviços e deverão ser adequados em função da dimensão da escola e do número de alunos.

Em comunicado, o Ministério da Educação indica a distribuição dos serviços mínimos por especialidades.

Docentes e técnicos superiores

Para cumprir os serviços mínimos, o tribunal arbitral decretou que deve existir um docente ou técnico superior por apoio, de acordo com a especialidade, para alunos com necessidades educativas especiais. Também devem ser garantidos os apoios terapêuticos prestados nas escolas e nos centros de recursos para a inclusão, assim como o acolhimento nas unidades integradas nos Centros de Apoio à Aprendizagem.

Terá de haver, ainda, um docente ou superior técnico no apoio a crianças e alunos em risco ou perigo que tenham sido sinalizados pelas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens. O mesmo se aplica a alunos em situações mais vulneráveis, em especial perigo de abandono escolar. E deve ser garantida a continuidade das medidas existentes nos programas para apoiar o bem-estar social e emocional dos alunos.

Pessoal não docente

No caso do pessoal não docente, o tribunal arbitral decretou o mínimo de um trabalhador para a portaria ou acesso e acolhimento dos alunos, para vigiar o refeitório e o espaço escolar. Para assegurar as refeições nos refeitórios não concessionados, os serviços mínimos incluem dois trabalhadores, de acordo com o número de refeições servidas.

Cabe à direção das escolas ou agrupamentos de escolas garantir a concretização dos serviços mínimos decretados. Se os trabalhadores selecionados para prestarem os serviços mínimos se recusarem a fazê-lo, poderão ser alvo de um processo disciplinar,  uma vez que estarão a dar faltas injustificadas.

Posso justificar a falta ao trabalho por motivo de greve dos professores?

A legislação não prevê, em concreto, esta justificação, mas a DECO PROTESTE considera que a resposta deve ser dada de acordo com a idade da criança e respetivo enquadramento familiar.

O Código do Trabalho prevê que, em caso de acidente ou doença, os pais possam faltar até 30 dias por ano para prestar assistência inadiável e imprescindível a filho menor de 12 anos, ou sem limite de idade para filhos com doença crónica ou deficiência. Para os filhos maiores de 12 anos, está previsto um limite de faltas até 15 dias por ano.

Além das situações de acidente e doença, a legislação prevê também que o trabalhador possa faltar justificadamente por motivos que não lhe sejam imputáveis para o cumprimento de uma obrigação legal. Ora, os progenitores têm a obrigação legal de prestar assistência a filhos. Aliás, caso não o cumpram, podem ser alvo de procedimentos judiciais (como a intervenção da CPCJ ou do Tribunal de Família).

Por estas razões, a DECO PROTESTE defende que a falta deve ser justificada sempre que o trabalhador não tenha outra forma de assegurar a assistência a filho menor de 12 anos (ou sem limite de idade para filhos com doença crónica ou deficiência), seja porque se enquadra numa família monoparental, seja porque o outro progenitor está impossibilitado de prestar essa assistência. 

Apesar de não existir uma óbvia obrigatoriedade das entidades patronais aceitarem estas justificações, devem ser procuradas soluções alternativas — como o teletrabalho, por exemplo — para que os trabalhadores não sejam prejudicados num período de constrangimentos do normal funcionamento das escolas.

Se chegar atrasado ao trabalho por causa da greve dos professores, o patrão pode marcar-me falta?

Por regra, a lei prevê que o empregador possa recusar a prestação de trabalho durante o resto do dia se o atraso for superior a uma hora, marcando o dia de falta. Se o atraso for superior a 30 minutos, o empregador pode recusar a prestação de trabalho durante a parte do dia em que ocorreu (manhã ou tarde). No entanto, e tendo em consideração a posição que a DECO PROTESTE defende, a falta pode ser justificada.

Devo apresentar algum documento para que a falta seja justificada pela minha entidade patronal?

Além da prova das condições e circunstâncias familiares (família monoparental, por exemplo), deve obter um comprovativo do encerramento do estabelecimento de ensino e de que o filho menor aí está matriculado.

Se a escola está fechada, onde peço o comprovativo?

Se não for possível obter o comprovativo por encerramento do estabelecimento de ensino, essa justificação pode ser entregue logo que o progenitor consiga obter a declaração da escola ou do respetivo agrupamento de escolas, ou seja, o que a lei designa por prazo razoável.

O que devo fazer se o meu patrão não aceitar a justificação da falta?

Se a justificação da falta for recusada pela entidade empregadora, poderá recorrer à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e ainda ao Tribunal do Trabalho, apresentando os seus argumentos.

A entidade patronal pode obrigar-me a gozar férias nos dias de greve em que preciso de ficar com os meus filhos?

Não. Contudo, caso a falta seja considerada injustificada, o trabalhador pode substituir a falta por perda de dias de férias que não excedam os 20 dias úteis. Ou seja, se o trabalhador tiver direito a 22 dias de férias, pode renunciar a até dois dias.

Se o teletrabalho for possível, a entidade patronal tem de o aceitar nestas situações?

Sim, no caso de se tratar de um encarregado de educação com filho até três anos, ou até aos oito anos, no caso de ambos os progenitores reunirem condições para o exercício da sua atividade em teletrabalho. Também deve ser aceite no caso de famílias monoparentais ou em situações em que apenas um dos progenitores, comprovadamente, reúna condições para o exercício da atividade em teletrabalho.

Se não tiver alternativa, posso deixar o meu filho dentro dos portões da escola, mesmo sem aulas?

Sim, desde que a escola garanta a segurança e assistência do menor, por exemplo, em atividades extracurriculares vigiadas, fornecendo refeições, etc. Se assim não for, não o pode fazer.

A empresa pode instaurar processo disciplinar se faltar muitas vezes por causa da greve?

Pode, em duas situações: caso as faltas, independentemente do número, causem prejuízo ou risco grave para a empresa, ou se o número de faltas atingir, em cada ano civil, cinco seguidas ou dez interpoladas, independentemente do prejuízo ou risco.

 

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