Como testamos

Cerveja: como testamos

Cerveja - como testamos

A espuma e a cor mantêm-se estáveis? Quantas calorias estou a ingerir por garrafa? Levamos estas e outras questões para o laboratório, onde testamos cervejas clássicas e artesanais.

As características físico-químicas e a degustação estiveram no centro do nosso estudo a cerveja. Álcool, sulfitos, calorias, acidez (pH) e características visuais: estabilidade da espuma e da cor e estabilidade coloidal (turvação da cerveja). Analisamos ainda o poder redutor (capacidade de oxidação). Ou seja, o nosso teste avaliou a capacidade das cervejas para se manterem estáveis ao longo do tempo. Baseámos as nossas análises nos métodos da Analytica EBC (Convenção Europeia do Fabrico de Cerveja). Para a avaliação sensorial, usamos a metodologia BJCP (Beer Judge Cerification Program).

Quais as melhores cervejas clássicas e artesanais?

Muito ou pouco álcool?

O teor em álcool é uma das informações mais importantes a constar no rótulo. O grau de fermentação da cerveja é um dos fatores a influenciarem o seu teor. Para a maior parte das cervejas Pilsner, que integram o nosso teste, o teor varia entre 4,5 e 6% vol. O valor mencionado na garrafa deve corresponder o mais possível ao medido. Em laboratório, medimos o teor real de álcool, de modo a compará-lo com o rotulado.

Acidez ideal

Idealmente, a acidez (pH) deve situar-se entre 4 e 4,5. Um desvio destes padrões mostra um processo mal controlado (como instabilidade microbiológica). O pH irá influenciar igualmente um eventual crescimento microbiano, a cor e sabor das cervejas. Valores superiores podem indicar citólise, ou seja, destruição da célula de levedura, ao fim da fermentação. Isto leva ao aumento do pH e pode resultar num off-flavour, ou seja, num aroma menos desejável. Valores inferiores a 4 podem indicar contaminação microbiana, nomeadamente por lactobacillus, por bactérias acéticas ou uma acidificação excessiva do mosto. Embora não sejam sempre ideais, é normal encontrar valores de pH entre 4 e 4,7, razão pela qual aceitamos cervejas com teores desta ordem.

Estabilidade da cor

A cor de uma cerveja é uma das propriedades visuais essenciais. A cor é da escolha do cervejeiro, mas a sua estabilidade mostra um controlo correto do processo de produção. Medimos a estabilidade da cor em laboratório. A cor aumentará se o produto for submetido a variações de temperatura. Para avaliar o envelhecimento, recorremos a um teste de força de seis dias, a 60°C, 24 horas a 3°C, e a uma agitação lenta por 12 horas, a 20°C. Quanto maior a diferença de cor medida, antes e após o teste de envelhecimento, mais o produto será considerado instável.

Estabilidade coloidal

A estabilidade coloidal da cerveja, ou estabilidade físico-química, revela-se sobretudo pela turvação da cerveja com o tempo. A estabilidade coloidal está relacionada com a evolução do tamanho das partículas. A possível polimerização de proteínas e de polifenóis leva a uma turvação na cerveja. Turvação essa que aumentará se o produto for submetido a variações de temperatura. Com o passar do tempo, é possível que se crie esta “turvação/nuvem”, que pode sedimentar no fundo da garrafa.

O procedimento, em laboratório, segue a linha traçada para a estabilidade da cor. Realizámos testes de envelhecimento, que consistiram num  teste de força de 6 dias, a 60°C, 24 horas a 3°C, e uma agitação lenta por 12 horas, a 20°C. Quanto maior a diferença na turvação medida, antes e após o teste, mais o produto é considerado instável.

Para garantir a qualidade ao longo do prazo de validade, um dos processos é arrefecer a cerveja e remover os compostos com filtros ou por centrifugação ou decantação. A pasteurização, usada sobretudo nas clássicas, é um auxílio.

Espuma

A espuma é outro parâmetro importante na caracterização da cerveja. A espuma protege a cerveja e é uma das características que o consumidor aprecia para uma degustação correta. Fundamental para a cerveja não oxidar (o que poderá afetar o seu sabor), a espuma é também importante na própria degustação e na preservação da temperatura.

Uma cerveja que produza demasiada espuma, ou que não a produza, pode sinalizar problemas de carbonatação ou de contaminação, por exemplo.

Sulfitos

Os sulfitos são derivados de enxofre usados como aditivos devido ao seu papel conservante (antioxidante) e/ou propriedades antifúngicas. Os sulfitos estão naturalmente presentes no produto acabado como metabolito resultante da fermentação. Algumas cervejarias, para garantir uma melhor preservação do produto, adicionam sulfitos antes da linha de engarrafamento. De acordo com a legislação comunitária, o teor máximo de sulfitos permitidos numa cerveja é de 20 ppm.

Poder redutor da cerveja

A oxidação é um fator que influencia a aceleração da turvação numa cerveja.  Um bom poder de redução de oxidação trará maior estabilidade organolética e uma oxidação mais lenta. 

Avaliação sensorial 

As características de uma boa cerveja resultam da sua formulação, do tipo e da qualidade dos ingredientes escolhidos, do processo de produção, tecnologia e equipamento, das condições de acondicionamento e do armazenamento. 

O sabor da cerveja não é estático, estando continuamente em mudança. Além disso, as cervejas não apresentam todas o mesmo prazo de consumo preferencial.

O ponto onde acaba a maturação e começa a deterioração é sem dúvida diferente de cerveja para cerveja.  As alterações podem traduzir-se em:

  • diminuição do sabor amargo;
  • aumento da intensidade do sabor doce;
  • aumento do sabor de cartão; 
  • o amargo torna-se mais duro e mais adstringente na boca;
  • desenvolvimento de sabores vínicos; 
  • decréscimo de atributos positivos da cerveja. 

O envelhecimento poderá também manifestar-se no aumento da turvação da cerveja e depende de fatores intrínsecos (composição, oxigénio, catalisadores e pH) e extrínsecos (temperatura, luz e agitação). A exposição à luz (sobretudo nas garrafas verdes) é responsável pelo aparecimento de um composto sulfurado desagradável (light-struck).

Estas alterações, devidas ao envelhecimento, são maioritariamente defeitos. Existem vários graus de envelhecimento (ligeiro a extremo), que correspondem a diferentes penalizações. Existem outros defeitos possíveis e a sua perceção nas cervejas diminui a qualidade.

Na avaliação, usamos a metodologia BJCP (Beer Judge Certification Program). A preparação das amostras é feita numa sala contígua à sala de provas. A prova é efetuada sem conhecimento das marcas (prova cega). As cervejas foram armazenadas numa câmara frigorífica ao abrigo da luz, a 4ºC, e servimos de forma que a temperatura, no momento da avaliação, fosse aproximadamente de 10ºC. 

Considerámos os seguintes parâmetros: 
aparência (brilho, cor, espuma);
aroma (malte, lúpulo, fermentação, aromas indesejados); 
sensação na boca (corpo, gás, calor, cremosidade, adstringência, picante);
sabor (malte, lúpulo, fermentação, equilíbrio, final de boca, sabores indesejados);
prazer em beber.

Enumeramos alguns termos utilizados pelo painel BJCP, que se baseiam na Roda de Sabores de Meilgaard:

  • alcoólico – aroma, sabor e efeito de aquecimento do etanol e álcoois superiores (hot);
  • adstringente – enrugamento, secura no final de boca (sensação equivalente à de um dióspiro verde);
  • diacetilo – aroma a manteiga;
  • DMS – aroma e sabor a milho cozido em lata;
  • metálico – sabor a cobre, ferro, sangue;
  • oxidado – qualquer combinação de envelhecido, vínico, cartão, papel;
  • fenólico – especiarias (cravinho, pimenta), fumo, plástico, medicinal;
  • sulfurados – aroma a ovos podres ou fósforos queimados;
  • vegetal – aroma e sabor a vegetais cozidos, enlatados, podres (couve, cebola, aipo, espargos);
  • sabores básicos – ácido, doce, amargo, salgado, umami.

Rótulos

Verificamos os rótulos à luz do exigido por lei, como denominação de venda, listas de ingredientes, quantidade líquida, data de durabilidade mínima, teor alcoólico e contacto do fabricante. Avaliámos dados extra, como advertências (não indicado a menores de 18, grávidas, por exemplo), conselhos de conservação e valor nutricional e detalhes do produtor ou fabricante, como o site ou o e-mail.

Tratando-se de uma bebida alcoólica, todos os cuidados de consumo devem vir mencionados. Tal inclui avisos de moderação, o não-consumo ou cuidado em caso de gravidez, indicação da idade a partir do qual se pode consumir e ainda o facto de não dever conduzir sobre o efeito de álcool. Os avisos relativos a grávidas, idade e condução aparecem na forma de pictograma.  

Preços

O preço médio das cervejas nacionais testadas ronda os 1,55 euros por litro. Já as estrangeiras atingem quase o dobro e apresentam um preço por litro de 2,86 euros. Porém, as mais caras são as artesanais: uma garrafa de 33 centilitros varia entre 2,19 e 3,75 euros, resultando numa média aproximada de 8 euros por litro.

 

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